O leitor já deve ter visto essas fotos. Creio que elas devem ser uma montagem em alusão os desmandos por quais o Brasil passa.
Curioso, pesquisei para saber se realmente a Bete Cuscuz existi e qual era sua real atividade, bem como ao que ela se dedica nos dias atuais.
Pois bem, Dona Bete Cuscuz não é invenção da Imprensa. Pelo contrário; ela é real. Vamos conhecer Bete e sua história.
Por onde anda Beth Cuscuz?! Você sabia que ela hoje é dona de restaurante?!
Permita-me, caro leitor, escrever esta reportagem em primeira pessoa. Sou, digamos, um ‘forasteiro’ no Piauí. Nascido em São Luís, capital do Maranhão, sempre ouvi falar de muitas causos icônicos do vizinhos estado.
Entre eles o calor chamado por essas bandas de B R O Bró, a lenda de que um menino matou a mãe e até a existência de uma tal Beth Cuscuz como a boate mais famosa do Brasil. Depois que vim morar em Teresina, entendi o que era essa quentura característica e passei a me apaixonar pela lenda do Cabeça de Cuia
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Mas faltava entender o que diabos era (e como funcionava) essa Beth Cuscuz. Pois eis que me deparo, como repórter, com uma pauta sobre a tão falada boate. Aliás, sobre a tão falada personagem. Ela existe mesmo? E ela continua administrando o estabelecimento? É realmente uma boate / casa de shows para prostituição?
FAMA NACIONAL Antes de apresentar a Beth Cuscuz a vocês, há uma semana o jornalista José Simão, um dos mais conhecidos do Brasil, em sua participação na Band News, apresentou erradamente uma foto da professora Lourdes Melo como se fosse Beth Cuscuz. Era uma ironia com uma suposta afirmação dela, com uma faixa presidencial no corpo: “Vou assumir o Brasil, pois de cabaré eu entendo”. Essa explicação é importante para sabermos até onde vai a fama de Elizabeth Oliveira Nunes.
QUEM É A BETH CUSCUZ Pois é. Este é o nome dela: Elizabeth de Oliveira Nunes, 64 anos. Conhecida como uma das cafetinas mais bem sucedidas do País, tendo contato com modelos que, segundo contam, eram misses, ex-BBBs e artistas de TV que cobravam valores que hoje ultrapassariam a casa dos R$ 10 mil. Mas o nome de Beth Cuscuz, para muita gente da sociedade piauiense, causa uma espécie de “repulsa”. É claro que não havia uma aprovação, sequer aceitação. As pessoas diziam que a Polícia fazia “vista grossa” para o ‘empreendimento’.
AGORA É DONA DE RESTAURANTE
Acompanhado do fotojornalista João Brito Jr e do motorista Ricardo Morais, busquei durante uma semana me aproximar de Elizabeth, ou de “Dona Elizabeth”, como agora é chamada por seus funcionárias a ex-Beth Cuscuz. Sim. Ela abandonou o ramo dos “negócios da noite”, como costuma falar, e agora é dona de restaurante. O novo empreendimento dela é bem localizado: fica na esquina das ruas 1º de Maio e Álvaro Mendes, Centro de Teresina, numa área conhecida como ‘Pólo de Saúde’. Chama-se ‘Restaurante e Lanchonete Super Suco’.
“NÃO TRABALHO MAIS COM A NOITE” Talvez por considerar-se ainda alvo de críticas por parte da sociedade, Dona Elizabeth não quis dar entrevista. Tentamos questionar algumas curiosidades a respeito da agora empresária no ramo alimentício. Mas não quis falar. Foi até um pouco ríspida ao receber nossa equipe de reportagem praticamente expulsou a gente de seu estabelecimento. Limitou-se apenas a dizer o seguinte, quase gritando: “Eu não quero falar nada. Não trabalho mais com a noite e agora eu gerencio isso daqui”. Saímos após qualquer possibilidade de sermos atendidos.
DE REGENERAÇÃO E EVANGÉLICA
Há dois registros de entrevistas concedidas por Dona Elizabeth. Nas duas vezes ela ainda atendia pelo nome de Beth Cuscuz. Foi em 2008, ao hoje editor executivo do
OitoMeia, Allisson Paixão, que na época era editor-chefe do portal 180graus. E em 2012, à repórter da revista Cidade Verde Caroline Oliveira. Do pouco conteúdo existente sobre ela, já havia falado que a origem de seu nome se deve a um apelido dado pela antiga patroa, também dona de um bordel no Centro da cidade. Natural da cidade de Regeneração, é evangélica e mãe de duas filhas. Antes de criar a Boate Beth Cuscuz era professora e formou-se em contabilidade na antiga Escola Técnica (ex-CEFET-PI e atual IFPI). Essas informações constam na entrevista concedida a Allisson Paixão.
PRESA EM 2012, POLÊMICA NO CORSO Já na entrevista concedida a Caroline Oliveira ela chora ao relembrar do que considera o pior momento de sua vida. Ela foi presa em agosto de 2012 acusada, na Operação Aspásia, deflagrada pela Polícia Civil do Piauí. Entre as acusações: favorecimento à prostituição, rufianismo (agenciamento), tráfico interno de pessoas e formação de quadrilha, além de manutenção de casa de prostituição. Pouco depois ela foi solta e anuncia que iria abandonar o negócio. O que ocorreu em meados dos anos de 2013. Foi justamente quando se envolveu em outra polêmica: ela arrancou de um caminhão que iria desfilar no tradicional Corso de Teresina um cartaz que estava escrito “Cabaré Flocos de Milho – Sob nova Direção”. Os donos ficaram desesperados porque consideravam uma “brincadeira de Carnaval”. Ela dizia que não aceitaria quem debochasse
DE AVENTAL, SELF SERVICE POR R$ 10 Desde então pouco se soube do que fez. Por alguns dias, nossa equipe de reportagem ficou acompanhando o trabalho de Dona Elizabeth. Percebemos ela vestida de branco, usando avental, marcas de comida… o que pode se constatar que ela gerencia e também atende no restaurante. O prédio e a comida são modestos, mas o movimento é intenso. Poucos funcionários trabalham no estabelecimento, todos uniformizados de laranja. A dona, com observações a distância da reportagem, aparecia constantemente à porta do restaurante para recepcionar os clientes. Recepção bastante elogiada, diga-se de passagem. “Vem comer por R$ 10 mulher”, dizia Dona Elizabeth a uma possível cliente que passava em frente.
MUITOS CLIENTES NEM SABEM QUEM É Ela aparenta ser uma patroa que supervisiona os funcionários com a mão na massa. Isso reflete na opinião de alguns frequentadores. Nós abordamos alguns deles, e ainda há quem não saiba que Dona Elizabeth é a Beth Cuscuz. “Olha, eu trabalho por aqui perto. Esta é a primeira vez que como aqui, mas estou sabendo por você [olhando para mim] que a dona daqui é a Beth Cuscuz. De qualquer forma, isso não vai me fazer parar de frequentar o local. É simples, mas bem acolhedor. Ela trata todo mundo bem, é educada, trabalhadora e quer mudar de vida. Não fazendo mal a ninguém, qual o problema de ser quem é?”, refletiu uma cliente, conhecida como Teresa Cristina.
“IMPOSSÍVEL PERDER ESSA IMAGEM” Mas há quem não aprove e não consiga retirar a imagem de Beth Cuscuz de Dona Elizabeth. Um grupo de trabalhadores da construção civil, três no total, próximos ao restaurante dela não pouparam críticas ao serem abordados pela nossa reportagem. Para eles, a personagem é sinônimo de “sem-vergonhice”, “vadiagem”, “algo ruim para o Piauí”, “putaria” e outros palavrões que é melhor nem descrevermos nesta reportagem. Para eles, a vida da ex-cafetina é definida como “um cabaré” e, por mais que ela tenha saído do ramo de agenciamento de mulheres à prostituição, os pedreiros mantêm-se desacreditados em uma Beth que mudou de vida. “Impossível ela perder essa imagem. Acho que ela não deveria se expor assim [trabalhando em um restaurante]”, disse um deles, cuja identidade não quis revelar, bem como os demais. Eles disseram que o fato de ter sido dona de um “prostíbulo” faz com que algumas pessoas pensem que as garçonetes de seu restaurante seriam prostitutas. Preconceito?! Opinião?! Tire você, leitor, suas conclusões.
E A CASA DE SHOWS ‘BETH CUSCUZ’?! Ah, e você pode estar se perguntando: e a boate / casa de shows com o nome ‘Beth Cuscuz’?! Ainda existe?! Ela ganha algo com isso?! Também fomos até o estabelecimento entender um pouco dessa situação. Fomos recepcionados por um homem que se identificou como Roberth Mitz Van der Pool. Pois é, foi esse o nome que ele deu. Passava do meio dia da terça-feira passada, dia 1º de agosto. Robert disse que todos os funcionários estavam dormindo e que a nova “dona” da casa de shows, identificada como Thamara Amâncio, estaria viajando. Aguardamos um pouco mais de tempo para saber se alguém, um gerente, um representante legal poderia falar. Mas ninguém atendeu. Um vizinho do local foi quem nos ajudou, como fonte de informações. Morador há 42 anos da rua Elias Martins, bairro Cristo Rei, o endereço da Boate Casa de Shows Beth Cuscuz (que um dia já teve um cartaz com o nome BC Drinks). Sua casa fica ao lado do estabelecimento.
“BETH CUSCUZ SEMPRE AJUDOU TODO MUNDO” Ele preferiu não revelar seu nome e nem permitiu que fizéssemos imagens dele. Mas informou que era importante ter Beth Cuscuz, a própria, como dona da boate. “Essa boate é muito boa para nós aqui da rua. Ela existe há 23 anos, fazendo com que todos os moradores se beneficiem disso. É que há sempre movimento, há sempre seguranças por perto. E somos a favor de que se mantenha funcionando. Ninguém quer que a boate saia daqui. Nós ganhamos dinheiro, por exemplo, vigiando os carros dos que vão lá para dentro. A gente vende quentinhas, comidas, e bebidas… Todo mundo ganha com essa casa de shows”, disse o rapaz, que se diz “autônomo”. Particularmente sobre a empresária, ele ressalta que “ela é uma pessoa muito boa a ajudava todo mundo que precisasse”. Segundo ele, até fazia doações de cestas básicas”.
NOVA DONA DO PEDAÇO: THAMARA AMÂNCIO Numa segunda tentativa de falar com a atual administração da casa de show da Beth Cuscuz, conseguimos falar com o esposo da atual dona Thamara Amâncio. Ele se chama Bruno de Sousa Jacob e é filho da Cláudia Pires, ex-dona do estabelecimento e antiga sócia da Elizabeth de Oliveira. Foi justamente Cláudia Pires quem sucedeu Beth Cuscuz. Pelo que se vê o negócio virou algo “de família”. Ele informou que a família é goiana e mora no Piauí já há sete anos. Ainda segundo ele, há exatamente um ano a boate foi vendida para a nora. Thamara não encontrava-se no estabelecimento. Em uma breve pesquisa na Internet, é possível encontrar fotos dela como ex-Miss Bumbum Paraná. É uma loirinha, muito bonita, que se relacionou com o filho de Cláudia Pires no Piauí e hoje os dois tocam a casa de shows Beth Cuscuz juntos.
Cláudia Pires passou a função de dona para a nora Thamara Amâncio (Foto: Reprodução)
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DEFENSIVA E SEM LEMBRANÇAS DE BETH
Bruno foi questionado sobre as polêmicas envolvendo a boate, inclusive as investigações da Polícia que acabaram por prender a ex-proprietária. Ele prefere ficar na defensiva e rebate as denúncias. “O problema é que outras boates faziam aquelas acusações e tudo isso acabou respingando em nós, por sermos a mais conhecida”, explicou, informando que não tem informações de como está o processo na Polícia. Bruno demonstra saber da delicadeza do assunto, ainda mais tendo a mãe como uma das suspeitas, que inclusive chegou a ser presa na mesma época que Beth Cuscuz, como sua sócia. Sobre a própria Beth, ou melhor, Dona Elizabeth, ele diz ter lembranças boas. “Quando a conheci, vi que ela trabalha bastante, mesmo sendo bem velhinha. Ela tem bastante energia, tanto que montou até um negocinho depois que saiu daqui. Ela gosta mesmo de fazer as coisas”, descreve.
NÃO HÁ AGENCIAMENTO E PROSTITUIÇÃO”
Questionado sobre os serviços oferecidos atualmente na Beth Cuscuz, Bruno diz que não existe oferecimento de garotas, nem agenciamento e nem prostituição no local. Segundo ele a administração atual ”não trabalha mais com prostituição”. Ele diz que a casa vive hoje de shows de striptease de mulheres famosas e cita alguns dos nomes que já fizeram apresentações por lá, como Rita Cadilac, Mulher Melancia, Andressa Urach e Fani Pacheco. “Além da venda de bebidas”, informa. Sobre a informação de que há meninas que dormem no local, ele disse que não tinha como responder a essa pergunta. Polêmicas a parte, a Beth Cuscuz funciona de segunda a sábado, das 17h às 3h da madrugada. O funcionamento aos domingos só ocorre se algum cliente pagar para ter um dia na casa.
PARA FINALIZAR, UM POUCO DE REFLEXÃO
Entrevistamos José Ricardo Fortes Sampaio, estudioso na área de Gênero e Turismo Sexual, mestrando em Antropologia na Universidade Federal do Piauí (Ufpi) para uma reflexão. Em seus estudos, ele considera que alguns estereótipos a respeito de uma “mulher prostituta” deveriam ser desconstruídos. Segundo ele muitas vezes, associam-na a imagens negativas. Há uma história por trás de quem vende o prazer sexual, há um trabalho, há uma necessidade. “Em Teresina, pude verificar que a prostituição está dissolvida em casas de shows, ruas e Internet, seja em sites especializados ou redes de sociabilidades como bate-papos e aplicativos. Muitas prostitutas começam a seguir esse caminho logo quando precisam custear os estudos na capital, vendo que a prostituição ainda rende altos níveis lucrativos, comparado à situação de mercado atual, elas se mantêm nesse segmento”, diz o especialista. Seria uma opção trilhar pelo caminho da prostituição? Ele responde: “Há vários outros papéis sociais desempenhados por essas mulheres. Elas são mães, esposas, estudantes, têm outros ramos profissionais. Muitas delas optam pela prostituição no interior do estado, sazonalmente, justamente por conta de um sistema machista que oprime as liberdades das mulheres”.