Um golpe que vem se tornando comum nas redes sociais tem atrapalhado o trabalho dos protetores de animais no Distrito Federal. Em busca de dinheiro fácil, os estelionatários se apropriam de fotos de cães ou gatos machucados e passam a receber doações como se estivessem cuidando dos bichos.
Por causa do golpe, pessoas que costumam cuidar de bichos acabam tendo dificuldade quando prestam apoio a algum animal. Foi o caso de Rangelma Almeida, 40 anos, que passou por uma situação embaraçosa em maio.
Ela resgatou uma gata no Setor de Indústria e Abastecimento (SIA), que tinha um ferimento na cabeça e uma pata quebrada. “Foram cinco dias tentando achá-la até eu ver a situação em que estava. Levei para casa e depois para o veterinário, pois o caso era muito grave”, comenta.
O orçamento inicial para que a perna do bichano fosse amputada ficou em R$ 4 mil, acima daquilo que a protetora conseguiria pagar. Dessa forma, ela tirou algumas fotos do animal e postou nas redes sociais pedindo ajuda. “Pouco tempo depois entraram em contato comigo algumas pessoas perguntando se eu era realmente a tutora, pois eles tinham visto as mesmas imagens sendo postadas por uma moradora de Taguatinga”, explica.
Intrigada com a situação, ela foi atrás do caso e achou um post no Facebook pedindo ajuda e com um suposto cupom fiscal de R$ 700 comprovando os gastos com a gata. “Fui até a clínica veterinária identificada na nota e eles disseram que aquele gasto não tinha relação com o perfil que pedia ajuda. O que aconteceu é que a golpista juntou dois casos distintos e passou a pedir ajudar”, relata.
Ela mandou mensagem para o número de celular disponibilizado como PIX, mas acabou bloqueada. “Decidi então fazer um vídeo com o veterinário que estava cuidando da minha gata para mostrar que eu sou a verdadeira protetora dela e juntar as provas para fazer uma ocorrência”, comenta.
O registro do Boletim de Ocorrência foi feito no dia 11 de junho. Desde então a Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) investiga o caso.
O caso de Rangelma está longe de ser o único a ter ocorrido no DF. A protetora Lucimar Aparecida, 47, diz se lembrar de pelo menos quatro episódios que ocorreram com animais sob os cuidados do Projeto Acalanto. “A gente já se deparou com diversas situações em estágios diferentes do golpe, mas infelizmente isso vem acontecendo demais”, lamenta.
Em uma delas, o golpista ligou para a clínica onde viu que um cachorro estava internado e passou a pedir informações mais detalhadas. “O homem disse que ele estava tomando conta do animal a partir daquele momento e precisava de fotos e vídeos para arrecadar dinheiro. Nossa sorte é que o pessoal é conveniado nosso e já sabe que a parte do dinheiro apenas eu que mexo. Quando o atendente se negou, o homem xingou muito”, lembra.
Outro caso aconteceu com um cão salvo pelo Batalhão de Polícia Militar Ambiental (BPMA). Muito debilitado, o animal precisava de ajuda e houve grande compartilhamento das informações nas redes. “Começaram a ver em outros grupos uma pessoa dizendo as mesmas coisas e pedindo doação para uma conta diferente. Eu liguei para essa pessoa, disse que se quisesse ajudar que colocasse a conta da clínica veterinária, e ela me chamou de tudo quanto é nome”, diz Lucimar.
Maria Araújo, 46, também é protetora e alerta para ações simples a fim de evitar que o doador seja ludibriado. “Entra em contato com clínica, faz a transferência direto para eles. A gente não fica com dinheiro nenhum”, explica.
Outra possibilidade é comprar o que está faltando em vez de dar o dinheiro diretamente. “Doe a ração, o remédio que falta. O importante sempre é conferir se a pessoa realmente está cuidando do cão ou gato”, ressalta.
A advogada especialista em direito criminal Jéssica Marques explica que esse tipo de situação se encaixa no crime de estelionato. “Uma vez que a pessoa leva vantagem monetária com essa mentira, está caracterizado o delito”, destaca.
Apesar disso, ela reconhece que é difícil conseguir provar a materialidade. “O importante é que a vítima reúna todo tipo de prova possível. Pelo lado de quem doa, pode ter prints de conversas e o comprovante de transferência. Caso o lesado seja o dono do animal, é bom tentar identificar uma ou duas vítimas que possam testemunhar”, pontua.
Além do processo criminal, também é possível que o golpista passe pela responsabilização cível e tenha que indenizar as pessoas que foram enganadas por ele.