06/05/2017 às 11h59min - Atualizada em 06/05/2017 às 11h59min

Lula sabia e comandava esquema de propinas

ABr

 

Renato Duque foi reinterrogado após permanecer em silêncio na audiência do dia 17 de abril. Marcelo Camargo/Arquivo/Agência Brasil
 
O ex-diretor da Petrobras, Renato Duque, disse que o réu Luiz Inácio Lula da Silva o procurou para saber se havia alguma conta na Suíça em que tivesse recebido propinas pelo esquema de corrupção investigado na Operação Lava Jato. De acordo com ele, devido ao nível de informações sobre as operações negociadas entre a estatal e outras empresas, ficou “claro” que Lula “tinha pleno conhecimento” e “detinha o comando de tudo”.
 
Em depoimento prestado nessa sexta-feira (5) ao juiz federal Sérgio Moro, Duque contou que se reuniu três vezes com Lula após deixar a Diretoria de Serviços da empresa, em 2012, e que durante as conversas o ex-presidente o questionou sobre o andamento dos contratos da Petrobras com estaleiros para a construção de navios-sonda. A preocupação de Lula, segundo ele, era com os pagamentos feitos ao PT e com o possível rastro financeiro em contas fora do país que poderia ser detectado pelas investigações.
Réu em um dos processos da Lava Jato em Curitiba, Renato Duque foi reinterrogado hoje após permanecer em silêncio na audiência do dia 17 de abril. Ele próprio pediu para ser ouvido novamente. Além de Duque, os ex-ministros Antonio Palocci, o ex-presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, e o marqueteiro João Santana são réus na mesma ação penal.
“No último encontro, em 2014, já com a Lava Jato em andamento, ele [Lula] me chama em São Paulo, no hangar da TAM do Aeroporto de Congonhas, e me pergunta se eu tinha uma conta na Suíça com recebimentos da SBM [empresa holandesa acusada de pagar propina a funcionários da Petrobras] dizendo que a então presidente Dilma [Rousseff] tinha recebido informação de que um ex-diretor da Petrobras teria recebido dinheiro em uma conta na Suíça. Eu falei: ‘Não tenho, nunca recebi dinheiro da SBM’. Aí ele vira pra mim e fala: ‘E das sondas, tem alguma coisa?’ E eu tinha, né? Mas eu falei: ‘Não, também não tem’. Ele falou: ‘Olha, presta atenção no que eu vou te dizer. Se tiver alguma coisa, não pode ter, entendeu? Não pode ter nada no teu nome, entendeu?’ Eu entendi, mas o que eu ia fazer? Não tinha mais o que fazer”, disse.
As informações referentes aos encontros com Lula foram detalhadas em resposta à própria defesa de Duque, depois que Sérgio Moro fez seus questionamentos. Segundo o ex-diretor, a primeira das três reuniões ocorreu a pedido dele próprio, para “agradecer pelo período” que passou na Petrobras. No depoimento, Renato Duque conta que, embora funcionário de carreira, chegou à Diretoria de Serviços da estatal, em janeiro de 2003, após negociações que envolveram o então ministro da Casa Civil, José Dirceu, que também foi condenado em processos da Lava Jato.
Institucionalizado
Segundo o ex-diretor, o esquema de corrupção era “institucionalizado” e vinha de gestões anteriores. Devido a isso, explicou, os partidos faziam solicitações às empresas que fechavam contratos com a Petrobras e elas repassavam os valores já como uma “consequência”. “Isso não era uma obrigação”, disse.
Em diferentes trechos do depoimento, ele diz que deseja esclarecer o que estiver a seu alcance e que quer pagar pelo que fez. Renato Duque, que está em preso há mais de dois anos após mandados expedidos por Sérgio Moro, relatou também ter três contas no exterior cujo dinheiro, segundo ele, poderia ser repatriado pelos investigadores para retornar a “quem de direito”. De acordo com ele, pelo menos 20 milhões de euros (cerca de R$ 69,84 milhões) ainda estão em sua posse no exterior.
Na Petrobras, Duque era o responsável por repassar as vantagens indevidas ao PT. A partir de 2007, as negociações passaram a ser feitas com João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do partido, segundo o ex-diretor, cumprindo determinação do próprio Lula. “Fui chamado a Brasília pelo então ministro Paulo Bernardo, essa pessoa falou: ‘Você vai conhecer uma pessoa indicada pelo… e fazia um movimento [com as mãos, na barba e no queixo]. O Lula era chamado como Chefe, Grande Chefe, Nine ou esse movimento com a mão. A pessoa que está sendo indicada, ela que vai ser agora quem vai atuar junto a empresas que trabalham com a Petrobras. Foi quando conheci o Vaccari em 2007”, disse.
Durante o depoimento, que durou mais de uma hora, o ex-diretor de Serviços da Estatal detalha que, no caso específico dos contratos envolvendo a Sete Brasil, foi acordado o repasse de 0,9% de propina dos valores pagos pelos cinco estaleiros contratados para construir os navios-sonda. A vantagem ilegal seria dividida igualmente entre o PT e os funcionários da Petrobras. A Sete Brasil foi criada pela estatal para explorar o petróleo na camada pré-sal.
Outro lado
Em nota à imprensa, a assessoria de Luiz Inácio Lula da Silva acusa os procuradores da Lava Jato de fabricar “depoimentos mentirosos” na tentativa de produzir provas para as “denúncias levianas” contra ele, após “dois anos de investigações. De acordo com a defesa do ex-presidente, veículos da imprensa já “vinham antecipando estranhamente o suposto teor” do depoimento, “sempre com o sentido de comprometer Lula”.
“O desespero dos procuradores aumentou com a aproximação da audiência em que Lula vai, finalmente, apresentar ao juízo a verdade dos fatos. A audiência de Lula foi adiada em uma semana sob o falso pretexto de garantir a segurança pública. Na verdade, como vinha alertando a defesa de Lula, o adiamento serviu unicamente para encaixar nos autos depoimentos fabricados de ex-diretores da OAS [Leo Pinheiro e Agenor Medeiros] e, agora, o de Renato Duque”, diz a defesa do ex-presidente.
Ainda no comunicado, a assessoria diz que os depoentes são condenados a mais de 20 anos de prisão, nunca haviam mencionado o ex-presidente ao longo do processo e teriam sido “coagidas a negociar benefícios penais”. “O que assistimos nos últimos dias foi mais uma etapa dessa desesperada gincana, nos tribunais e na mídia, em busca de uma prova contra Lula, prova que não existe na realidade e muito menos nos autos”, diz a defesa.
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