08/01/2022 às 05h15min - Atualizada em 08/01/2022 às 05h15min

Goiás: viúva de dono de cartório admite à polícia que encomendou crime

Em novo interrogatório, suspeita de ser a mandante do crime confirmou que encomendou morte do marido por R$ 100 mil em Rubiataba (GO)

Goiânia – Relatos de fúria, traição com gays e violência doméstica marcaram o novo interrogatório da viúva do dono de cartório assassinado, há 10 dias, com 17 tiros e mãos algemadas para trás, em Goiás. Ele foi morto em um canavial de Rubiataba, no centro do estado, a 210 km de Goiânia. Presa, ela admitiu ser mandante do crime, encomendado por R$ 100 mil. “Mais ódio dele”, disse.
 
No novo interrogatório, o mais recente desdobramento do inquérito, que está sob sigilo, a polícia colheu as informações da escrevente de cartório substituta Alyssa Martins de Carvalho, de 32 anos, na terça-feira (4/1), uma semana depois do crime. Ela e outros quatro suspeitos já foram presos.
 
“Vontade de matar”
A viúva disse que, há três anos, passou a ter vontade de matar Luiz Fernando Alves Chaves, de 40, com quem teve um casal de gêmeos, de 5, e uma menina, de 3 – as crianças ficaram com os avós paternos após o crime. Ela afirmou que, na época, estava grávida da caçula e descobriu supostas traições dele com gays.
 
 “A vontade de matar Luiz Fernando se iniciou em decorrência de que descobriu os relacionamentos homoafetivos de Luiz Fernando”, diz um trecho do inquérito. A viúva afirmou que, depois de descobrir as traições, passou a ser ameaçada de morte por querer acabar com o casamento, que completaria nove anos no próximo mês de julho.
 
Inicialmente, a polícia suspeitou que ela estaria interessada no dinheiro do seguro de vida de Luiz Fernando, cujo valor não foi divulgado, mas o caso ganhou novos capítulos após a mulher expor a vida conjugal do casal, durante o segundo interrogatório.
 
“Arma na cabeça”
Alyssa contou, também, que Luiz Fernando chegou a agredi-la, fisicamente, uma vez, além de ameaçá-la de morte e dizer que ela não ficaria mais com os filhos, se eles terminassem o casamento. Ela disse que não denunciou o esposo porque tinha receio de prejudicá-lo, o que também poderia refletir nas finanças do casal.
 
No ano seguinte, de acordo com o interrogatório, o casal viajou para os Estados Unidos. Ela disse que, na ocasião, ele propôs que ambos passassem a ter relacionamento aberto, motivo pelo qual, desde então, conforme acrescentou, os dois fizeram acordo para se envolver tanto com homens quanto com mulheres.
 
Segundo o inquérito, Alyssa contou que, em julho de 2021, passou a se relacionar com a comerciante Ana Claudia da Silva Rosa, de 33, que também foi presa, inicialmente apenas como amizade. “Por volta de outubro, as duas começaram a se relacionar sexualmente”, afirma outro trecho do interrogatório.
 
Confidências
Com o passar dos dias, as duas se aproximaram mais ainda uma da outra, e Alyssa sentiu confiança em Ana Claudia para “confidenciar as agressões físicas e psicológicas cometidas por Luiz Fernando”. Inicialmente, de acordo com a viúva, a amante dela “tentou fazer com que ela mudasse de ideia”, referindo-se ao plano de se vingar do cartorário.
 
Contudo, segundo os relatos, Alyssa contou para Ana Claudia que não via outra alternativa. “Chegou a dizer que ‘seria ela – suicídio – ou ele”, relata o inquérito. Depois, a escrevente tentou separação, de novo, e mudar de residência, mas, Luiz Fernando a impediu e a ameaçou, “dizendo que ela só sairia morta de casa”.
 
Segundo o inquérito, Alyssa afirmou que, no dia 4 de dezembro de 2021, durante uma cavalgada, “teve uma brincadeira mal interpretada por parte de Luiz Fernando”. Ela disse que deu um tapa no rosto dele, mas alegou não se lembrar do episódio pois estava bêbada. No dia seguinte, ele apertou o braço dela e disse ter ficado envergonhado.
 
Crime planejado
Com o suposto aumento da tensão no casamento, de acordo com os relatos de Alyssa, Ana Claudia, então, recuou e decidiu planejar a morte do dono do cartório, como forma de apoiar a esposa dele.
 
“Ana Claudia disse que iria organizar tudo e que a interroganda [Alyssa] não saberia de nada. Entre o dia 5 de dezembro e o dia 10 de dezembro, tal intento foi arquitetado pela Ana Claudia”, relata outro trecho do interrogatório.
 
Nos dias seguintes, conforme o inquérito, as duas se encontraram com Luzimar Francisco Neves, que é citado pela investigação como “Chefe” e investigado por supostamente iniciar a rede de contatos da associação criminosa, a mando da viúva, com intermediação da amante dela. Ele está foragido.
 
O encontro dos três ocorreu no Jardim Paulista, no município de Nova Glória, a 29 km de Rubiataba. Na ocasião, segundo Alyssa, Luzimar estava em um carro popular, de cor preta, e se aproximou de um Jeep, da mesma cor, dirigido por Ana Claudia e no qual a esposa do dono do cartório estava como passageiro.
 
R$ 100 mil pelo assassinato
Alyssa também contou que, momentos depois, Ana Claudia e o “Chefe” se afastaram dela e foram para o outro lado da rua, motivo pelo qual, conforme alegou, não sabe mais dar detalhes daquele momento.
 
Em seguida, de acordo com o interrogatório, Ana Claudia voltou para o carro e contou a Alyssa que o “Chefe” seria contratado para matar Luiz Fernando e que ele cobraria a quantia de R$ 100 mil pelo serviço.
 
A viúva contou à polícia que, na época, tinha R$ 50 mil guardados em casa, “na gaveta de calcinha e em uma caixinha azul que ficava dentro do guarda-roupa. Ela também disse que tentou fazer empréstimo para conseguir o restante do valor, mas sem êxito. “Os outros R$ 50 mil a Ana Claudia se encarregou de arrumar”, acrescenta o interrogatório.
 
Alyssa disse que entregou a metade do valor do serviço à amante, e, conforme relatou, o pagamento do restante seria realizado após a execução do crime. De acordo com o interrogatório, Ana Claudia disse que venderia uma camionete SW-4 dela para completar o dinheiro.
 
“Ainda com mais ódio”
Ao longo dos dias seguintes, de acordo com o interrogatório, o relacionamento de Alyssa com Luiz Fernando “só piorou”. Ela disse que, no dia 26 de dezembro, o dono do cartório empurrou a filha gêmea com uma das mãos, o que a deixou “ainda com mais ódio dele”. A viúva também disse que ele dava tapas nas cabeças das crianças para forçá-las a comer.
 
A escrevente disse que a situação ficou ainda mais insustentável e “não aguentava mais a presença dele”. Por isso, conforme acrescentou, no dia 27 de dezembro, encontrou-se com Ana Claudia, a quem entregou dois controles do portão e a chave da porta da sala da residência.
 
No dia seguinte, perto do horário combinado para o crime, Alyssa foi para a igreja com os três filhos. Na ocasião, dois criminosos invadiram a residência, algemaram Luiz Fernando com as mãos para trás e roubaram a camionete dele. Ele foi levado para um canavial, em Rubiataba, onde foi morto a tiros.
 
A polícia encontrou o corpo do dono do cartório, na madrugada do dia 29 de dezembro. A camionete dele, uma Toyota SW-4 branca, foi recuperada pelos investigadores, em seguida.
Presos
 
Veja as pessoas presas pelo crime:
•          Alyssa Martins: viúva do dono do cartório, é investigada por ser a mandante do crime. Tem três filhos com Luiz Fernando, com quem se casou em 22 de julho de 2013. Ela trabalhava no cartório como escrevente substituta. A família vivia em Rubiataba.
•          Ana Claudia Silva: comerciante e apontada como amante de Alyssa, com quem teria planejado o crime.
•          André Luiz Silva, de 30 anos: dono de garagens de veículos em Anápolis e Campo Limpo de Goiás, onde mora há sete meses. É agiota e investigado por recrutar comparsas para roubar a SW-4 do dono do cartório e matá-lo.
•          Edvan Batista Pereira, de 23 anos: ligado a criminosos do PCC em Goiás, é investigado por ser autor dos 17 disparos contra o cartorário. Ele, que mora em Pirenópolis (GO), disse à polícia que conheceu André no presídio de Anápolis e que aceitou a proposta dele para quitar uma dívida de R$ 2,5 mil, além de receber mais R$ 2,5 mil. Outros R$ 5 mil deveriam ser repassados a outro comparsa.
•          Laurindo Lucas Gouveia dos Santos, de 21 anos: também é morador de Pirenópolis (GO) e disse à polícia que se envolveu no crime após receber mensagens por WhatsApp e ligação de Edvan para levá-lo de carro até Rubiataba e deixá-lo na cidade. No entanto, afirmou que, no percurso foi surpreendido pela informação de que teria de participar do roubo e do assassinato.
 
“Ameaças”
O advogado Roberto Rodrigues, que representa Ana Claudia, disse que deve pedir ao Judiciário a revogação da prisão de sua cliente, presa em Goiânia. Segundo ele, depois do crime, ela havia ido para a capital goiana por sofrer supostas ameaças.
 
“Ela estava morando em Rubiataba, cidade pequena, e se sentiu pressionada, porque houve ameaças”, afirmou Rodrigues.
 
A advogada Fabiana dos Santos Alves Castro, que representa a viúva, disse que pediu a revogação da prisão de sua cliente, o que foi indeferido pelo Judiciário. Alyssa e Ana Claudia estão no presídio de Barro Alto de Goiás.


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