14/03/2022 às 07h33min - Atualizada em 14/03/2022 às 07h33min

Vítima vendeu apartamento e transferiu R$ 300 mil para pastor

À polícia, a vítima afirmou que entregou o dinheiro sem nem olhar ou procurar saber se havia um contrato válido sobre o título "bilionário"

Carlos Carone e Mirelle Pinheiro
MATRÓPOLES
Uma mulher que cruzou o caminho de Osório José Lopes Júnior, pastor evangélico goiano investigado por dar supostos golpes em milhares de pessoas Brasil afora, sofreu um grave baque financeiro ao cair na lábia do religioso. Também pastora, a vítima vendeu um apartamento no Distrito Federal e transferiu R$ 300 mil direto para a conta dele. Em junho do ano passado, ela registrou ocorrência policial em São Paulo, onde mora atualmente, e contou detalhes de como Osório age.

 
De acordo com o termo de declaração colhido na cidade de Barueri (SP), a filha da vítima mantinha um relacionamento amoroso com o pastor cego. Eles tiveram um filho, fruto do relacionamento. Em virtude da proximidade familiar, a pastora resolveu fazer uma investimento com Osório no valor de R$ 15 mil. Ela contou ter sido convencida a fazer a aplicação em uma espécie de título apresentado por ele como Letra do Tesouro Mundial, supostamente lastreado em ouro e com valor “bilionário”.
 
Na ocorrência, a pastora afirma que entregou o dinheiro sem sequer procurar saber se havia um contrato ou informações verídicas sobre o suposto título. Aos policiais, a vítima relatou que nos contratos não constam datas ou qualquer menção ao pagamento relacionado ao resgate dos papéis. A coluna revelou, neste domingo (13/3), os golpes aplicados pelo religioso, que fez diversas vítimas.
 
Apartamento vendido
Em depoimento à polícia, a ex-sogra do pastor revelou que vendeu um apartamento no DF e transferiu R$ 300 mil para a conta de Osório, para que o valor fosse aportado como investimentos no resgate do suposto título bilionário. A mulher contou que recebeu uma cópia do “termo de acordo e participação financeira e confidencialidade”, mas que não recebeu qualquer garantia sobre como os valores aportados seriam operados.
 
A vítima ainda relatou que o pastor detalhou como conseguiu os supostos títulos bilionários. Segundo ela, os papéis teriam sido entregues como presente, após o pastor  fazer uma série de orações para uma pessoa.
 
O pastor dizia que os títulos já contariam com autorização do governo federal, por meio do ministro da Economia, Paulo Guedes, para ser pagos. Uma afirmação claramente falsa, uma vez que o ministro nada tem a ver com os golpes aplicados pelo religioso. Na tentativa de garantir credibilidade, o pastor usa, além no nome dos ministérios, logomarca de entidades financeiras, como Banco Mundial e o Banco do Brasil, em uma plataforma de investimento conduzida pelo grupo.
 
Abuso da fé
Carismático, com oratória afiada e abusando de passagens bíblicas para reforçar um discurso de fé, o pastor ganhou fama e dinheiro nos últimos anos. De acordo com vítimas que viram suas economias descerem ralo abaixo após falsas promessas de rentabilidade, o pastor moraria em uma confortável casa num dos condomínios fechados de Alphaville, em São Paulo.
 
A coluna conversou com outra vítima que caiu no conto de Osório. Morador de um estado do Nordeste, um homem, de 38 anos, contou que conheceu o negócio oferecido pelo religioso por meio de um amigo. “Ele botou R$ 80 mil acreditando que receberia entre R$ 500 mil e R$ 1 milhão. Eu investi pouco, cerca de R$ 1 mil. A transferência foi por Pix direto para a conta do pastor”, disse.
 
A vítima relatou que todos os investidores assinavam um “termo de acordo e participação financeira e confidencialidade”. Para transparecer uma falsa sensação de segurança, o religioso repete, de forma insistente, todos seus dados pessoais durante os vídeos postados nas redes sociais. “Ele fala a todo instante o CPF e o número de identidade para dizer que não tem nada a esconder. No entanto, as promessas de pagamento são vazias e nunca ocorrem”, afirmou.
 
Banco Efraim
Segundo o investidor, que há três anos tenta receber os valores prometidos, o pastor criou um banco de dados hospedado em uma plataforma em que os clientes podem acompanhar as supostas operações financeiras feitas pela equipe do religioso. Chamado de Banco Efraim, o dispositivo costuma ser lembrado por Osório José durante a gravação dos vídeos diários.
 
Cerca de 70 mil pessoas teriam fornecido dados pessoais e transferido dinheiro para as contas do pastor. “Osório começou a barganhar e a vender parte dos títulos dizendo que o governo dos Estados Unidos iriam pagar pelos supostos papéis internacionais. Algumas pessoas compraram esses títulos por valores que variavam entre R$ 100 mil e R$ 500 mil”, ressaltou.
 
Para faturar dos fiéis que não possuíam grande poder aquisitivo, Osório teria começado a vender pequenas frações dos supostos títulos de Letra do Tesouro Mundial. “Dessa forma, ele acreditava que alcançaria muito mais pessoas por um valor menor, mas ganharia no volume de clientes captados, e assim ocorreu”, analisou a vítima.
Em vídeo o pastor chama vítimas de “zé ruela”:
 
Pastor preso
Acusado por outras pessoas que caíram no mesmo golpe, o pastor Osório foi preso após ser alvo de uma operação deflagrada pela Polícia Civil goiana, em maio de 2018. Na ocasião, o religioso teve prisão preventiva decretada sob a acusação de obter R$ 15 milhões aplicando golpes em fiéis de Goianésia, região central de Goiás. Além de Osório, outro líder religioso e um seguidor deles foram detidos na mesma ação policial.
 
Segundo a Polícia Civil, a dupla de pastores alegava que havia ganhado um título de R$ 1 bilhão, mas precisava reunir fundos para conseguir recebê-lo. De acordo com as investigações, para tirar o dinheiro das vítimas, os dois prometiam a quem colaborasse lucros de até 10 vezes do valor aplicado. Vítimas chegaram a vender a própria casa para ajudar os líderes religiosos e fazer o investimento.
 
A investigação apontou que os dois pastores ostentavam dinheiro e poder em Goianésia. Osório morava em uma casa de luxo e chegava a alugar helicóptero para viajar da cidade para outras regiões. A PCGO identificou, por meio da quebra de sigilo bancário, que os religiosos movimentaram R$ 20 milhões no banco.
 
A coluna tentou contato por meio dos três números de telefones celulares que pertenceriam ao pastor, mas nenhuma das ligações foi atendida. O espaço permanece aberto para futuras manifestações.


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