02/11/2022 às 07h25min - Atualizada em 02/11/2022 às 07h25min

PT organiza transição e negocia para ter maioria no Congresso em 2023

Petistas tentam não ampliar polêmicas com Bolsonaro, mas preveem dois meses de instabilidade até posse de Lula

Membros da campanha vencedora na disputa pela Presidência da República querem fugir do clima bélico com o presidente Jair Bolsonaro (PL) para não dificultar ainda mais uma transição que promete ser complicada. A ordem no PT e em partidos aliados é esquecer um pouco as polêmicas de Bolsonaro e focar no futuro: a montagem do novo governo Lula e a construção de uma maioria no Congresso que vai assumir em 2023.

Apesar de planejarem uma suavização do discurso, os petistas estão se preparando para dois meses de instabilidade política e resistência dos bolsonaristas mais radicais em aceitar o resultado das urnas, sobretudo após o presidente evitar desmobilizar a militância no primeiro pronunciamento que fez após a eleição, nessa terça (1°/11).

A transição entre os governos começa oficialmente na quinta-feira (03/11), após o feriado. O escolhido pela chapa vencedora para coordenar o processo será o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), que deverá trabalhar em conjunto com a presidente nacional do PT, deputada federal reeleita Gleisi Hoffmann, e o ex-ministro Alozio Mercadante.

A ideia é começar a transição focando no acesso a dados do governo federal e sem pressa para anunciar nomes de ministros, até porque essa articulação passa pela prioridade do governo eleito no momento, que é buscar uma maioria no Congresso no ano que vem.

Gleisi é quem está liderando essa frente. A deputada já está negociando com lideranças que são aliados em potencial, como o presidente do MDB, Baleia Rossi. Apesar de uma ala do partido estar chateada com o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), por ele ter chamado o ex-presidente Michel Temer (MDB) de golpista, há muitos emedebista que apoiam Lula abertamente, incluindo a senadora Simone Tebet, que foi candidata a presidente pela legenda.

A conversa também já está avançada com o PSD, cujo presidente, Gilberto Kassab, já adiantou que deve fazer parte da base aliada no plano federal. Outros partidos que não estão na base de Bolsonaro hoje, como Cidadania, União Brasil e PSDB, também serão chamados pelos petistas para conversar.

As negociações ainda estão começando, mas têm chances altas de sucesso na opinião do especialista Mario Braga, analista de riscos políticos da consultoria internacional Control Risks, para quem os grupos políticos deverão se adaptar ao resultado da eleição presidencial. “Diferente do que foi falado após o resultado do primeiro turno, não acho que exista o risco de Lula começar seu mandato incapacitado de governar por falta de apoio no Congresso.

 “Como sabemos, os políticos do Centrão são pragmáticos em sua maioria e deverão ser receptivos a negociações envolvendo espaço e cargos”, aposta ele, que acha que isso deve ocorrer mesmo em partidos que elegeram bolsonaristas mais ideológicos.

Como consequência da frente ampla que vem montando desde a campanha, Lula também deverá mostrar um perfil mais pragmático do que radical ao começar a governar, avalia Braga.

“Esperamos um pragmatismo principalmente do ponto de vista econômico. Isso não significa que o novo governo vá abandonar promessas. Deverá haver um foco no combate à pobreza, mas imaginamos que o gasto social será conciliado com algum nível de responsabilidade fiscal”, afirma ele, que aposta no cumprimento da promessa de campanha de revogar o Teto de Gastos criado no governo Temer e “driblado” na gestão Bolsonaro.

“Ainda não sabemos que regra o governo Lula vai adotar, mas aposto em uma regra que permita gastos públicos, mas que tenha regras visando estabilizar a dívida pública no longo prazo”, completa o analista de risco, cuja empresa tem entre seus clientes investidores estrangeiros.

Instabilidade no horizonte
Enquanto planejam o futuro, os vencedores da eleição não deixam de olhar com preocupação para movimentações políticas do presente, como a mobilização de bolsonaristas radicalizados que têm feito bloqueios em rodovias desde o domingo da eleição (30/10).

Para o analista de risco Mario Braga, a chance de instabilidade política por causa da insatisfação dos perdedores é uma realidade, mas não a ponto de trazer riscos de ruptura institucional. “Essa mobilização com os caminhoneiros já estava no nosso radar, era uma das opções que Bolsonaro tinha para questionar o resultado. E ainda que não tenha tanto alcance assim, é um problema com capacidade para gerar impacto operacional forte, sobretudo se demorar. Já temos fábricas suspendendo turnos e cidades à beira do desabastecimento de combustível”, afirma ele.

“E, para além dos caminhoneiros, há ainda a chance que o bolsonarismo radical consiga promover episódios de insubordinação nas polícias. Esses dois ingredientes, porém, não são suficientes para trazer riscos institucionais. Faltam elementos que seriam fundamentais para o sucesso, como o apoio de pelo menos parte do Judiciário e do poder político, coisas que Bolsonaro não conseguiu. O Judiciário tem se mantido resiliente e o universo político foi rápido em reconhecer a vitória de Lula, impossibilitando qualquer construção de um discurso de ruptura”, conclui Braga.


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