07/03/2023 às 08h02min - Atualizada em 07/03/2023 às 08h02min

Dez anos após a morte de Hugo Chávez, Maduro persiste na liderança da Venezuela

Ideologia do ex-presidente permanece na Venezuela, que passa por crises políticas, econômicas e sociais. Mais descolado da figura do mentor, Nicolás Maduro ganha força com o desgaste da oposição

​(crédito: AFP)

"Às 16h25, morreu o presidente comandante Hugo Chávez. Pedimos a todos os venezuelanos que sejam vigilantes pela paz, pelo respeito, pela tranquilidade desta pátria." Foi assim, pela voz do então vice-presidente Nicolás Maduro, que a Venezuela acompanhou, em cadeia de rádio e televisão nacional, o anúncio da morte do polêmico líder latino, em 5 de março de 2013. Mergulhado em uma crise política, econômica e social, com 7,1 milhões de cidadãos refugiados pela América Latina e o Caribe, o país completa a primeira década pós-Chávez marcado por conflitos, sanções internacionais e um governo paralelo opositor falido.

Ao comentar os 10 anos da morte de seu padrinho político, vítima de um câncer, Maduro classificou o período como uma década de "batalha, lealdade e vitória". "O imperialismo nos subestimou, a oligarquia interna nos subestimou, subestimaram o povo, subestimaram a liderança da revolução, me subestimaram como ser humano, como líder, como chefe político", disse, em um ato com trabalhadores transmitido pela televisão estatal na sexta-feira. "E, 10 anos depois, podemos dizer que aqui estamos inteiros, de pé e vitoriosos, e prontos para seguir a batalha no que resta do século 21."

Como vice-presidente, Maduro assumiu o poder três dias depois do anúncio da morte de Chávez. Em 14 de abril do mesmo ano, foi eleito, e já anunciou que pretende concorrer à reeleição em 2024 para um novo mandato de seis anos. O atual governante enfrentará uma oposição fraturada, que tentou promover, sem sucesso, um governo paralelo com apoio de Washington e que agora busca escolher um candidato único em um processo de primárias (leia mais nesta página).

Flexibilização
Os 10 anos de Maduro no poder estão marcados por uma grave e profunda crise econômica, com sete anos de recessão e quatro de hiperinflação, o que provocou uma profunda escassez e acabou com o poder aquisitivo dos venezuelanos. O cenário obrigou uma flexibilização de controles e a permissão de uma dolarização informal, que deu lugar a uma tímida recuperação.

Dentro do chavismo, Nicolás Maduro é alvo de críticas de alguns setores, que o acusam de se distanciar do padrinho político para se manter no poder a qualquer preço. "O socialismo é o caminho", diz reiteradamente o governante que, no entanto, flexibilizou os estritos controles econômicos instaurados por Chávez.

Segundo o analista Luís Vicente León, diretor do instituto de pesquisas Datanálisis, Maduro optou por desenhar sua própria identidade, em vez de se apegar à ideia de uma "imitação ruim". Apesar de nunca ter tido os altos índices de popularidade, que hoje se situam em 22%, muito longe dos 70% de Chávez, o governante teria acertado ao sair da sombra do antecessor. "Ele percebeu que, ao lado de Chávez, enfraquece", disse, em entrevista à agência France Presse.

Embora tente interagir com o público como fazia Chávez, Maduro mudou sua oratória e, parcialmente, o discurso. "Cada vez mais, Chávez é mais um símbolo e menos um poder; e cada vez mais, Maduro é mais um poder e menos um símbolo", comenta o doutor em Ciência Política Daniel Varnagy, da Universidade Simón Bolívar, na Venezuela.

Tática
Hoje, a produção de petróleo venezuelana está estagnada em cerca de 700 mil barris por dia, após sofrer uma queda vertiginosa que especialistas vinculam à corrupção e ao desinvestimento de uma indústria que chegou a render ao país 90% de sua receita. O presidente defende o desenvolvimento de um modelo que não dependa do petróleo. Maduro também se distanciou de políticas de estatização — promovendo a venda de ações de empresas públicas — e reduziu ao mínimo um subsídio histórico à gasolina. "Foram mudanças táticas para se manter no poder", afirma Varnagy.

Apesar das dissidências, o chavismo, sob o governo de Maduro, ainda é um bloco unido e forte, avaliam especialistas. Ao mesmo tempo, o líder tem tirado proveito de divisões da oposição, que começou a perder força em 2017, com prisões e inabilitações de líderes, e acabou por rachar em janeiro passado, quando pôs fim ao "governo interino" de Juan Guaidó, a última estratégia impulsionada para tirar o presidente do poder.

As manifestações de 2017, fortemente reprimidas, levaram o governo Maduro a ser alvo de uma investigação no Tribunal Penal Internacional (TPI) por supostos crimes de lesa-humanidade. O processo inclui denúncias de torturas, mortes sob custódia do Estado e execuções extrajudiciais em operações contra a criminalidade. "A repressão durante o governo Maduro tem sido brutal e contínua, sistemática", assegura a organização não-governamental Fórum Penal. "A violação dos direitos humanos tem sido mais frequente do que com Chávez", diz a ONG em uma nota. A estimativa é que 250 pessoas estejam presas por motivos políticos.


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