24/06/2017 às 11h18min - Atualizada em 24/06/2017 às 11h18min

Em áudio, ex-assessor diz ter carta branca de Fraga para negociar propina no DF

Conversa foi gravada em 2009, quando ele era secretário da gestão Arruda, e obtida pela TV Globo com exclusividade. Deputado foi denunciado pelo MP e aguarda julgamento; defesa nega

TV Globo

Gravações obtidas pela Justiça em um inquérito contra o deputado federal Alberto Fraga (DEM-DF) mostram ex-assessores do político cobrando propina de uma cooperativa de micro-ônibus no Distrito Federal. Os interlocutores dizem, nos áudios, que estavam agindo a mando de Fraga, que foi secretário de Transporte do governo José Roberto Arruda. A defesa do parlamentar nega (veja o que diz o advogado ao final da reportagem).


Alberto Fraga falou pela primeira vez, nesta sexta-feira (23) sobre os áudios. O deputado negou que tenha recebido propina e disse que ele próprio fez algumas das gravações quando soube da existência do suposto esquema. Quando perguntado por que não denunciou o caso às autoridades, ele respondeu:


"Se eu cometi o crime foi de prevaricação e não de propina, como o MP tá dizendo."

As gravações
As conversas ocorreram ao vivo, e foram captadas por um gravador ambiental. O primeiro encontro, segundo a denúncia do Ministério Público, ocorreu em um hotel no Setor Hoteleiro Sul. O bate-papo envolve o ex-secretário-adjunto de Fraga, Júlio Urnau, o ex-presidente da cooperativa Coopatag Josenildo dos Santos – responsável pela gravação – e o ex-tesoureiro da entidade Aécio Fábio.


Segundo o MP, o ex-assessor de Fraga José Geraldo de Oliveira Mello foi apresentado ao grupo como "o assessor de assuntos sujos do governo Arruda". Logo no começo do diálogo, José Geraldo explica que é responsável por conduzir o processo da Coopatag no governo.

 

"Tá centralizado em mim o poder de negociar. A competência pra negociar com você, [somos] eu e o Júlio", afirma.


José Geraldo orienta os representantes da cooperativa a passar uma ideia de desconhecimento sobre a tramitação do processo citado. Enquanto isso, eles teriam a garantia de informações privilegiadas na pasta.


"Se alguém te perguntar: 'como é que tá teu processo na secretaria?'. 'Ah, não sei, tá meio confuso e tal', tá? Vai acertar comigo. E o que que acontece? eu vou te passando, vou te municiando as informações", explica o ex-assessor de Fraga.


Em seguida, o então secretário-adjunto Júlio Arnau afirma que estava ali, naquela conversa, com "carta branca" de Alberto Fraga. Pouco tempo depois, anuncia-se o esquema de propina: a Coopatag teria de pagar R$ 600 mil para assumir um lote de 50 micro-ônibus.


Júlio Urnau: Eu vim aqui com uma carta branca. Porque o Fraga me autorizou a fazer isso, senão eu também não vinha.


Josenildo dos Santos: Hum hum. Tá.


José Geraldo: Cê num viu que o homem ligou pra ele, ainda?


Josenildo: Ah, entendi, entendi, entendi.


Júlio: Entendeu, então, que quando ele me ligou agora à tarde: "E aí, alguma novidade?"


[...]


Júlio: O Fraga é isso mesmo, 'seiscentos pau'. É aquilo que eu te falei.


Josenildo: Hum hum.


Júlio: Tá? Duzentos, duzentos e duzentos.


Segundo o Ministério Público, o valor chegou a ser pago em três parcelas, como citado no áudio. Os repasses foram feitos no Aeroporto JK, no Zoológico e no Núcleo Bandeirante. Em gravações divulgadas nesta quinta (22) pela TV Globo, Fraga questiona os interlocutores sobre o valor dos repasses.

 

A denúncia
A operação Régin foi deflagrada pelo Ministério Público e pela Polícia Civil do DF em 2011. Citados no inquérito, Fraga, Urnau e o ex-assessor José Geraldo de Oliveira Melo são acusados por organização criminosa e concussão – quando um agente público exige vantagem própria para realizar uma contratação.


Segundo o inquérito, o grupo chegou a receber mais de R$ 800 mil de uma única cooperativa, a Coopatag. Na época, a entidade conseguiu uma decisão judicial para retornar à licitação, depois de ser considerada "inabilitada" para o contrato. Mesmo com a sentença em mãos, a Coopatag teve de pagar propina para voltar a concorrer, diz o MP.


De acordo com as investigações, a Coopatag só voltou para a disputa da licitação quando a primeira parte do valor já tinha sido paga.


A denúncia contra Fraga foi apresentada ao Tribunal de Justiça do DF em 2011. Em 2014, quando ele foi eleito deputado federal e ganhou foro privilegiado, o processo "subiu" para o Supremo Tribunal Federal. A ação penal está nas mãos do ministro Alexandre de Moraes, mas ainda não foi julgada.


Fraga já prestou depoimento ao STF sobre o caso. Questionado sobre as providências que tomou ao saber do suposto esquema de propina, ele respondeu que exonerou Júlio Urnau e José Geraldo, e ironizou as informações do MP sobre a divisão do dinheiro.


"Essa é até motivo de piada, que eu, além de corrupto, então sou burro. Se eu sou o secretário, peço R$ 800 mil, eu até achava que eram R$ 600 mil, aí pra mim era R$ 150 mil e pros dois extorquidores era o resto do dinheiro? Quer dizer que nem partilha eu sei fazer?"


O que dizem os advogados de defesa
O advogado de Fraga no processo, Everardo Alves Ribeiro, afirma que as gravações não tratam de propina. Segundo ele, os áudios mostram o atual deputado federal indignado com as suspeitas de que o secretário-adjunto Urnau estivesse recebendo dinheiro das cooperativas.

 

"Ele, indignado e ao mesmo tempo em tom jocoso, chega a fazer essa afirmação. Mas não para denotar que estaria participanto de vantagem ilícita, e sim por indignação. [No sentido] De 'como eu, secretário, entraria num esquema de corrupção para um subordinado ganhar mais que eu?'. É absurda a ilação, até por isso", declarou à TV Globo.
A defesa de Júlio Urnau negou o envolvimento dele em cobrança de propina.


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