O ex-ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Ricardo Lewandowski disse que o Judiciário contribui para aumentar a insegurança jurídica no Brasil, em especial na questão tributária. Segundo ele, “há uma oscilação muito grande” da jurisprudência.
“Além de o sistema tributário ser extremamente complexo, o Judiciário não está contribuindo para dar segurança. Entendimentos consolidados por muitas décadas acabam sofrendo uma reviravolta, e ainda pior, com retroatividade, vulnerando o direito adquirido”, declarou Lewandowski em entrevista ao jornal Valor Econômico publicada nesta 2ª feira (7.ago.2023).
Segundo ele, “há um certo exagero no que diz respeito aos impactos de algumas medidas”. O ex-ministro do STF disse: “Toda vez que há um problema envolvendo questão fiscal, o governo alardeia que são R$ 400 bilhões, R$ 500 bilhões de rombo, mas ninguém explica de onde vieram esses números. É claro que os magistrados ficam preocupados com esses dados”.
Para Lewandowski, a reforma tributária, em análise no Congresso, é “um avanço importante”, pois “vai facilitar muito esse cipoal tributário” existente no Brasil. “Não tenho maiores críticas, acho que é uma notícia alvissareira, é a primeira reforma em profundidade em muito tempo, e muito positiva no sentido da simplificação que precisamos”, falou.
STF
Lewandowski se aposentou em 11 de abril de 2023. Para seu lugar, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nomeou Cristiano Zanin. O novo ministro do STF tomou posse na última 5ª feira (3.ago.2023).
“Zanin é um jurista muito equilibrado, que preenche os requisitos constitucionais: notável saber jurídico, reputação ilibada, mais de 35 anos. Não precisamos de acadêmicos nas Cortes superiores, mas de pessoas seguras, firmes, que conheçam a Constituição e as leis”, declarou o ex-ministro.
Ele defendeu a adoção de mandatos para os ministros da Corte. “Se pensarmos que um ministro pode entrar na Corte aos 35 anos e se aposentar aos 75, teremos 40 anos de exercício na cúpula do Judiciário, o que é um pouco incompatível com o espírito republicano”, disse.
“Quando o presidente da República indica um nome para um tribunal superior, e o Senado sabatina e aprova, esse quadro representa a visão que a sociedade tem naquele determinado momento histórico. E isso muda em função da dinâmica social”, completou.
Para Lewandowski, o ideal seria um mandato de 12 anos, pois daria aos magistrados a oportunidade de ocupar “todos os cargos constitucionalmente possíveis”: presidente do Supremo, do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Questionado sobre a quantidade de mulheres no STF, o ex-ministro respondeu considerar a Corte “um tribunal muito plural, por incrível que pareça”. A ministra Rosa Weber se aposenta em 2 de outubro e há pressão para que Lula nomeie uma mulher em seu lugar. Além dela, o Supremo tem apenas outra mulher em sua composição, Cármen Lúcia.
“Ele [STF] é composto por pessoas de origens regionais e profissionais diferentes. Temos homens e mulheres. É claro que é importante que haja um número crescente de mulheres, mas a indicação é do presidente da República”, afirmou Lewandowski.
MERCOSUL
Lewandowski foi indicado pelo governo para o cargo de árbitro do Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul (Mercado Comum do Sul). Seu mandato se iniciou em 28 de julho e o ex-ministro assumirá a presidência do tribunal em 2024.
Segundo Lewandowski, o caminho para se resolver controvérsias jurídicas entre os países do bloco deve ir além da questão aduaneira.
“É desejável uma espécie de um direito comunitário, supranacional, pensar mais no mercado comum, na livre circulação de pessoas, capitais e produtos e bens, quando tivemos uma tarefa comum externa. Talvez, aos poucos, adotar um modelo parecido com o tribunal das comunidades europeias”, falou. “Aqui, ainda não temos um sistema tão amadurecido. Mas a tendência é o fortalecimento do Mercosul e de seus órgãos decisórios”, declarou.
“A ideia é que o Mercosul atue como um bloco perante os demais blocos”, disse o ex-ministro, citando que acordos bilaterais como o em construção por Uruguai e China “são indesejáveis”.
Conforme Lewandowski, “o Mercosul é a 5ª economia do mundo e isso obviamente representa um poder de barganha maior”. O ex-ministro da Corte se disse otimista quanto ao acordo do bloco com a UE (União Europeia).
“Algumas questões ainda precisem ser resolvidas, como a ambiental. Superados esses entraves, será um avanço extraordinário para as economias de ambos os blocos”, afirmou.