O nível do Lago Guaíba recuou e, ontem, chegou ao menor nível em quase um mês, ficando apenas oito centímetros acima da cota de inundação, segundo a medição oficial do estado. Apesar da boa notícia, e da expectativa de que continue baixando, diversos bairros da região metropolitana da capital gaúcha seguem inundados pela água que permanece represada.
A medição do nível do Guaíba, porém, tem sido feita erradamente, conforme reconheceu a Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema). A pasta confirmou que tem apresentado dados incorretos sobre o nível do Guaíba desde 3 de maio, quando foi realizada a troca da régua que faz a medição da enchente no lago.
Especialistas vinham alertando o governo gaúcho, há dias, de que as medições oficiais não se mostravam confiáveis, mas o Palácio Piratini insistiu em seguir usando o parâmetro equivocado. Com a expressiva baixa das águas, o erro ficou evidente. Para corrigir a medida, foi alterada apenas a referência do nível de inundação da cidade, que subiu em 60 centímetros — passou de 3m para 3,6m.
Ajuste técnico
Na justificativa, a Sema argumentou que era um ajuste técnico em função da mudança da localização da régua. Mas admitiu que o registro histórico do nível, que teria chegado ao pico de 5,35m, precisará ser reavaliado por técnicos. "Para fins de registro histórico, a cota máxima do nível do Guaíba deverá ser avaliada detalhadamente quando houver condições técnicas para isso", disse a secretaria em nota.
Vitor Hugo Almeida Júnior, diretor da TideSat — startup que faz uma medição paralela do nível das águas —, explicou ao Correio que somente depois da instalação da nova régua em outra localização é que começou a haver divergência nos resultados, por conta da mudança no referencial. Até o início da enchente, porém, havia equivalência com a medição da Sema.
"O nosso pico foi de 5,15m, o deles (Sema) foi de 5,35m. Estava mais alto que as nossas medições e eles resolveram fazer essa mudança na cota de inundação de 3 para 3,6m. Não posso afirmar se estava errada ou certa a medição do governo, mas garanto que a nossa estava correta. Conferimos no local diversas vezes", disse Vitor Hugo, que ainda apontou que os sensores da empresa trabalham com uma margem de erro de, no máximo, três centímetros, para mais ou para menos.
Técnicos chamam a atenção para a possibilidade de o planejamento da resposta à enchente do Guaíba ter sido impactado pelas informações imprecisas da medida oficial. Pedro Cortês, especialista em meio ambiente e professor da Universidade de São Paulo (USP), alerta que "o número não é apenas um indicador, ele vai ser usado para modelagens hidrológicas e para as previsões futuras".
Apesar do erro na medida, a previsão para os próximos dias do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (IPH/UFRGS) aponta para um cenário melhor para Porto Alegre, com a enchente recuando. "Os cenários de previsão indicam recessão da cheia, com níveis ainda elevados, mas em declínio lento nos próximos dias em resultado dos volumes afluentes dos rios pelas chuvas da semana passada", afirma em nota.