29/06/2024 às 06h48min - Atualizada em 29/06/2024 às 06h48min

Massacre de Paraisópolis: testemunhas serão ouvidas nesta sexta

25 testemunhas — a maioria ligada à Polícia Militar do estado de São Paulo — serão ouvidas no Fórum Criminal Ministro Mário Guimarães (SP) a partir das 10h

​A audiência dará seguimento à 3ª audiência de instrução do processo, ocorrida no dia 17 de maio, e servirá para decidir se há elementos suficientes de que os réus cometeram algum crime - (crédito: Paulo Pintp/Agencia Brasil)

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) dará início, nesta sexta-feira (28/6), a audiência de defesa dos policiais militares réus no caso do massacre de Paraisópolis, que vitimou nove jovens de idades entre 14 e 23 anos em 2019. Serão 25 testemunhas de defesa ouvidas no Fórum Criminal Ministro Mário Guimarães, no bairro da Barra Funda, em São Paulo, a partir das 10h. A maioria delas é ligada à Polícia Militar de São Paulo (PMESP).

A sessão dará seguimento à 3ª audiência de instrução do processo, realizada no dia 17 de maio — na qual dez testemunhas foram ouvidas —, e servirá para decidir se há elementos suficientes de que os réus cometeram algum crime. Em caso afirmativo, o juiz deverá levar o caso a júri popular e definir uma data para o julgamento.

O caso também é apurado na esfera da Justiça Militar, que aguarda a conclusão do caso na Justiça Comum para poder dar continuidade ao processo dos oficiais. Dessa forma, caso a audiência de instrução tenha resultado negativo para o cometimento de crime, o caso tramitará somente na esfera militar.

Doze oficiais da PM e um ex-oficial foram acusados de envolvimento no massacre. A tenente Aline Ferreira Inácio, o subtenente Leandro Nonato, o sargento João Carlos Messias Miron, o cabo Paulo Roberto do Nascimento Severo, o ex-cabo Luís Henrique dos Santos Quero — expulso da corporação por outros motivos não informados —, o cabo Gabriel Luís de Oliveira e os soldados Anderson da Silva Guilherme, Marcelo Viana de Andrade, Mateus Augusto Teixeira, Rodrigo Almeida Silva Lima, José Joaquim Sampaio e Marcos Vinicius Silva Costa são réus por homicídio. O soldado José Roberto Pereira Pardim é réu acusado de explosão.

O massacre
Ocorrido em 1º de dezembro de 2019, o massacre de Paraisópolis foi uma chacina decorrente de uma operação da PMESP que visava o baile da DZ7. Oficiais da PM entraram na comunidade, cercaram uma área de maior fluxo de pessoas e usaram bombas de gás lacrimogêneo e de efeito moral. Segundo o Ministério Público, após esse momento, os policiais encurralaram as vítimas em um beco sem saída, o que resultou na morte de oito delas por asfixia e de outra por traumatismo. Nenhuma delas era residente do local.

Gustavo Xavier, de 14 anos, Marcos Paulo Oliveira, de 16 anos, Gabriel Rogério de Moraes, de 20 anos, Eduardo Silva, de 21 anos, Denys Henrique Quirino, de 16 anos, Dennys Guilherme dos Santos, de 16 anos, Luara Victoria de Oliveira, de 18 anos, e Bruno Gabriel dos Santos, de 22 anos, morreram por asfixia, enquanto Mateus dos Santos Costa, de 23 anos, morreu por traumatismo.

Para Maria Cristina Quirino, mãe da vítima Denys Henrique Quirino, a presença de membros do alto escalão da PM na lista de testemunhas de defesa ressalta a existência de um sistema que não só permite uma conduta violenta e assassina dos policiais para com a população — especialmente a de poder aquisitivo mais baixo —, como também protege esses policiais por isso.

“A grande maioria das testemunhas de amanhã são quem estava agindo em conjunto com os próprios réus, ou seja, vão defendê-los, é óbvio. São aqueles que têm as patentes altas, que é o corregedor da Polícia Militar da época, é o comandante do 16º Batalhão, é o (policial) que presidiu o IPM (inquérito policial militar). Essas pessoas foram aquelas que legitimaram a ação da polícia. Então é completamente ‘fora da casinha’ pra nós, cidadãos comuns, que eles tenham esse tipo de defesa. Estou falando a minha opinião. Tinham que fazer como nós, pegar pessoas civis, comuns, para serem testemunhas. Já que dizem que estão falando ‘a verdade’, a verdade mentirosa deles, eles que provem isso, mas não com a própria cúpula (da PM), né?

O certo seria isso, mas nunca. O sistema não permite”, lamentou.
Os oficiais do alto escalão a que Cristina fez referência são os ex-comandantes gerais da PMESP, Marcelo Vieira Salles, que comandou a área em que fica o 16º Batalhão, e Fernando Alencar Medeiros, que foi comandante tanto do 16º Batalhão, quanto do 1º Batalhão de Choque “Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar” (ROTA) — conhecido por ser o líder de mortes em SP. Ao Correio, a Defensoria Pública do estado confirmou a presença de ambos dentre a lista de testemunhas de defesa.

“Essa lógica de que polícia é proteção, prevenção, é tudo mentira. Isso não existe. Na comunidade, para preto, pobre e periférico, isso não existe. Polícia para quem? Ninguém precisa de polícia que mata. Eles não matam as pessoas que têm poder aquisitivo, eles abaixam a cabeça se tiver um Porsche, essas coisas. Lá eles não fazem esse tipo de ação, eles só fazem isso onde as pessoas estão em maior situação de vulnerabilidade, que é nas comunidades”, completou Cristina.

Ao Correio, a MPESP informou que aguarda a decisão da Justiça para tomar as medidas cabíveis em relação aos envolvidos que ainda integram a corporação. “Os inquéritos civil e militar sobre o caso foram concluídos e remetidos ao Poder Judiciário. Um dos indiciados não integra mais os quadros da Polícia Militar”, concluiu a nota.

Correio tentou contato com os advogados de defesa dos réus. João Carlos Campanini, que faz a defesa de Anderson Guilherme, afirmou que a audiência de sexta segue com a oitiva das testemunhas de defesa, sem “nada de novo no andamento”.

O advogado Fernando Fabiani Capano, responsável pela defesa dos réus Aline Inácio, Leandro Nonato, João Miron, Paulo Severo, Marcelo Andrade, Mateus Teixeira, Rodrigo Lima e José Sampaio, afirmou que a expectativa é que os testemunhos de sexta esclareçam a inexistência de relação causal entre as mortes e a conduta dos policiais.

“Amanhã me parece que isso vai começar a ficar desenhado para que, inclusive, nós não tenhamos, sequer, a possibilidade de agendamento de plenário em segunda fase, porque estes policiais, de fato, não merecem ser processados, tendo em vista, como a gente sempre defendeu, a ausência de nexo de causalidade entre qualquer tipo de conduta deles e essas inaceitáveis e muito tristes mortes que ocorreram naquela ocasião”, sinalizou.

Os advogados Marcos Manteiga, que defende Marcos Costa, e Ana Maria Monteferrario, que defende Luís Quero e Gabriel Oliveira não retornaram contato até a publicação desta reportagem. A defesa de José Pardim não foi encontrada para comentar o assunto.


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