Os motoristas de transporte escolar do Distrito Federal entraram em greve na manhã desta segunda-feira (31) para pedir o pagamento de salários atrasados. Segundo a Associação das Empresas de Transporte Escolar de Brasília (Asseteb), a dívida acumulada das empresas chega a R$ 40 milhões e se arrasta desde 2014. O G1 tentou contato com a Secretaria de Educação, mas não teve retorno até a publicação desta reportagem. ...
No total, 11 empresas empregam 1,6 mil funcionários em todo o Distrito Federal. As prestadoras de serviço contam com 700 veículos que transportam cerca de 60 mil alunos todos os dias. O atraso ocorre devido à falta de repasse de verba da Secretaria de Educação desde 2014.
Segundo a advogada da Asseteb, Elisa Cares de Souza, no primeiro ano os atrasos somaram R$ 3,5 milhões, no segundo, R$ 2,5 milhões, e em 2016, até o momento, já chegam a R$ 33 milhões. Elisa afirma que os pagamentos têm sido feitos com atraso igual ou superior a 90 dias e, muitas vezes, são quitadas apenas partes das dívidas.
“Chegou a um ponto em que as empresas não têm como manter. Até alguns meses atrás, elas trabalhavam com empréstimos bancários, mas a situação está crítica ao ponto de o BRB [Banco de Brasília] não oferecer mais o crédito.”
Elisa afirma que as empresas começaram a demitir funcionários dos setores administrativos para conter gastos. Com a falta de repasse, a dívida provocou o atraso no pagamento dos salários dos funcionários e na compra de combustível.
Ilegalidade
Em novembro de 2014, consulta feita pelo Tribunal de Contas ao Detran mostrava que 65% das empresas de transporte contratadas pela Secretaria de Educação não tinham autorização para trafegar. Na prática, faziam transporte ilegal. Dos 566 veículos informados pela pasta, 365 (64,4%) tinham atrasos na vistoria e 148 (26,1%) sequer tinham registro no Detran.
Uma auditoria realizada pelo mesmo tribunal em dezembro do ano passado identificou que 322 vans e ônibus tinham mais de sete anos, limite de idade recomendado pelo Ministério da Educação, e 12 veículos tinham entre 16 e 18 anos de estrada. A ilegalidade também atinge os condutores: 38 contratados tinham multas graves ou gravíssimas e, por isso, não poderiam conduzir veículos de transporte escolar.
O relatório também afirma que a Secretaria de Educação desconsidera essas informações sobre irregularidades e falta de qualidade, contratando e prorrogrando ajustes com empresas que "sabidamente, não têm capacidade técnica". As falhas também impedem que os contratos sejam verificados, já que não há como conferir se os trajetos e horários foram cumpridos, de fato.
Nas regionais de ensino de Planaltina, Guará, Paranoá e São Sebastião, a auditoria aponta que a relação de alunos é enviada em branco para empresas e/ou escolas. Isso significa que a frequência dos alunos de transporte escolar não está sendo verificada. Em muitas, os monitores não conferem os alunos no embarque, o que leva ao esquecimento de estudantes. Dos 160 ônibus examinados pessoalmente pelos auditorias, 77 (48%) não tinham a lista de frequência daquele mês atualizada.
Custo alto
Apesar da qualidade baixa, o transporte escolar tem custado caro aos cofres públicos. Entre 2011 e 2014, nos quatro anos da gestão do ex-governador Agnelo Queiroz, as despesas aumentaram 92,4%. Foram R$ 250 milhões gastos com a oferta do serviço em quatro anos.
Parte do desperdício de dinheiro também pode ser explicada pela falta de logística, segundo o relatório. Há casos de crianças que viajam mais de 80 quilômetros por dia para ir e voltar do colégio – saindo de São Sebastião para estudar na Asa Sul, por exemplo. Em cada trecho, os alunos perdem duas horas que poderiam ser usadas para estudar ou brincar.
"O transporte escolar deveria ser uma exceção. O ideal seria um percurso de meia hora, o tolerado, de uma hora, e acima disso é indesejado. Um terço dos alunos foram transportados no indesejado", disse o presidente do Tribunal, Renato Rainha.
De acordo com Rainha, o gasto com trasporte escolar seria suficiente para construir escolas perto das casas dos estudantes. "A construção de uma escola custa, em média, R$ 5 milhões. A escola classe 22 do Gama, por exemplo, custou R$ 4,2 milhões. Isso significa que seria possível construir 50 escolas com os gastos de transporte em quatro anos, em áreas mais próximas à residência dos alunos."
"A oferta de escolas nas proximidades da residência do estudante possibilita o acompanhamento por parte dos pais, o envolvimento da comunidade e a inserção da escola na realidade da população. Ademais, permite que as crianças cheguem mais dispostas à aula, uma vez que são poupadas das longas viagens em veículos de transporte escolar", diz o relatório.