Por um dia, o hino do novo campeão da Libertadores poderia ser outro. O trecho “Foste herói em cada jogo, Botafogo” poderia facilmente ser adaptado para “10 heróis no decisivo jogo/ Por isso que tu és e hás de ser nosso imenso prazer”. O enredo da vitória por 3 x 1 no Estádio Monumental de Núñez, em Buenos Aires, neste sábado (30/11), é mais do que uma licença poética para a atualização.
O Botafogo encerra uma era de gracejos dos rivais. Tornou-se o último grande clube do Brasil a faturar o título e brindou o futebol do Rio de Janeiro com uma era dourada de conquistas seguidas. Em 2022, o Flamengo faturou o tri da América do Sul. No ano seguinte, o Fluminense entrou no panteão dos vitoriosos e libertados.
A expulsão do volante Gregore no primeiro minuto de jogo, após acertar as travas da chuteira na cabeça do atleticano Fausto Vera, prejudicou o esquema 4-2-3-1 do técnico Artur Jorge e o processo de criação ofensiva botafoguense. Decisivo com gols nos jogos contra Red Bull Bragantino e Palmeiras pelo Brasileirão, o carregador de piano colocou o técnico Artur Jorge em uma encruzilhada: mudar ou não mudar? Eis a questão.
O português com quase oito meses de América do Sul confiou no que tinha de melhor. Não fez substituição, mas reorganizou o sistema inteligente sistema 6-3-. O objetivo era ter mais amplitude, dificultar o vício do Atlético-MG dos jogos pelas pontas e forçá-los a jogar pelo meio. Deu certo. As melhores oportunidades mineiras no primeiro tempo foram em arremates de longa distância de Hulk. Infiltrou bem com Guilherme Arana, mas a finalização passou longe.
O Atlético-MG teve 79% de posse de bola. A superioridade numérico, porém, era inofensiva. O repertório atleticano era pobre, não passava de toques excessivos e cruzamentos forçados. A postura mineira escancarou um Botafogo organizado e compromissado. O nível de concentração botafoguense não caiu diante da adversidade. Na primeira oportunidade de escapada para o ataque, abriu o placar aos 35 minutos e aliviou a pressão. Luiz Henrique inverteu de lado, abriu pela esquerda, limpou Lyanco da jogada e passou para Marlon Freitas chutar. A bola ricocheteou e sobrou novamente para o camisa 7 estufar as redes.
Dez minutos depois, o Atlético-MG sofreu um apagão e um erro de comunicação custou caro. Guilherme Arana tentou proteger bola na grande área, mas Luiz Henrique foi astuto, quase a pegou e foi derrubado pelo goleiro Everson. O VAR confirmou o pênalti, e Alex Telles converteu.
Com a desvantagem de 2 x 0 em meio à superioridade de homens em campo, o Atlético-MG precisava mudar. Diferentemente do técnico botafoguense, Gabriel Milito não tinha motivos para manter a mesma equipe. Antes de a bola rolar novamente, promoveu três mudanças: tirou o zagueiro Lyanco para entrada do volante Mariano, sacou o ala Scarpa para o atacante Vargas e substituiu o volante Fausto pelo meia Bernard. Abriu mão do esquema 3-4-2-1. Campeão da Libertadores pelo Galo em 2013, Bernard assumiu a responsabilidade articulador. Hulk era o escape pela esquerda, e Paulinho pela direita. Deyverson e Vargas eram as referências dentro da área.
As mudanças não demoraram a surtir efeito. Um escanteio aos dois minutos da etapa final renovou o ânimo mineiro. Hulk coloca bola na cabeça do de Eduardo Vargas. Com 1,74m de altura, o chileno cabeceia firme e desconta. A bola caiu no setor em que o volante Gregore (1,81m) normalmente estaria. Mas a alegria do gol do Galo durou pouco. Ao contrário dos cariocas, o Atlético-MG não soube aproveitar o momento da bola na rede.
Apressou as jogadas, abusou dos cruzamentos e começou a entrar no momento do desespero.
O técnico Gabriel Milito abriu mão do amuleto Deyverson e confiou em Alan Kardec. Artur Jorge tirou as estrelas Luiz Henrique e Thiago Almada para colocar o ponta Matheus Martins e o centroavante Junior Santos. A ideia era ter mais velocidade no contra-ataque e capacidade de segurar a bola no ataque.
No entanto, o Atlético-MG seguiu em cima. Aos 40 minutos, teve chance de ouro com Eduardo Vargas. Mariano teleguiado a bola para o chileno na pequena área e, antecipando-se aos zagueiros, o chileno mandou por cima. Na sequência, aproveitou outra bola longa e batida de cabeça da zaga botafoguense e, de frente para John, isolou.
Artilheiro da Libertadores e responsável por brilhar no início da campanha do clube, com nove gols, Junior Santos foi o dono do último ato. Assumiu protagonismo pela direita, tirou onda com bela jogada individual contra dois, invadiu a área, chutou, pegou o rebote e estufou a rede. Botafogo campeão.