06/08/2017 às 07h02min - Atualizada em 06/08/2017 às 07h02min

Polícia investiga pai acusado de torturar e escravizar filhos em Formosa

O Correio percorre cerca de 500km para contar a história de crianças submetidas a tortura e trabalho escravo em assentamento na região de Formosa. A denúncia contra o pai de duas delas, também padrasto de três, é investigada pela polícia e pelo Conselho Tutelar

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arraco de lona iluminado por velas. Telhas finas esburacadas. Animais com aspecto de abandono. E água armazenada em baldes. Esse foi o cenário encontrado pelo Correio ao chegar, na última quinta-feira, ao Assentamento Morrinhos, entre os municípios goianos de Formosa e Vila Boa. Lá, vivem um casal e cinco filhos, de 5 a 13 anos. Na última semana, três deles fugiram de casa e alcançaram a capital do país com histórias que denunciam tortura, maus-tratos, espancamento e trabalho escravo.
A situação chegou ao conhecimento das autoridades goianas e brasilienses após um casal pedir socorro ao Conselho Tutelar de Santa Maria, no Distrito Federal, que acionou a equipe de Formosa. Quatro policiais militares, três policiais civis e um conselheiro tutelar da cidade do Entorno viajaram até o local com a missão de averiguar a denúncia e, se fosse o caso, resgatar as outras duas crianças, de 5 e 6 anos, que ficaram para trás.
 
Luis Nova/Esp. CB/D.A Press

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O pai e padrasto negou a acusação de maus-tratos contra as crianças
 
Logo na chegada ao assentamento, por volta das 20h30, o conselheiro de Formosa Carmilton Santos foi recebido na porta da casa por João (nome fictício), 46 anos. Ele é padrasto de três das cinco vítimas e pai biológico de outras duas. Alto, de fala mansa e ar sereno, negou, prontamente, maltratar os filhos. “Isso jamais aconteceu. Estão me acusando de algo que não existe”, defendeu-se. Segundo o agricultor, ele e a mulher, grávida de seis meses, suspeitam que as crianças tenham sido aliciadas. “Tinha gente fazendo a cabeça dos meus filhos. Dando dinheiro e presentes para que eles se voltassem contra mim, para me prejudicar”, alegou.
 
João também negou a acusação de que submetia os meninos a trabalho escravo. “Eu tenho todos como meus filhos. Jamais os obrigaria a esse tipo de atividade”, disse. Ele apenas admitiu que cobrava dos mais velhos tarefas simples, como buscar água em uma lagoa próxima à residência. “Eles pegavam a carroça para buscar água. Nada além disso”, reforçou.
 
Luis Nova/Esp. CB/D.A Press

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A família vive em um barraco iluminado por vela, com lona e telhas finas
 
Maria (nome fictício), a mãe, de 30 anos, também negou qualquer tipo de maus-tratos. “A minha relação com o meu marido é como qualquer outra entre marido e mulher. Não existe agressão a mim ou aos meus filhos. Nós os corrigimos quando eles teimam”, contou. Segundo ela, pede-se às crianças que façam serviços leves de limpeza doméstica. “Eles varrem e catam o lixo do quintal. Não sei se isso é trabalho escravo”, afirma.
 
O casal contou que, na quinta-feira, dois dias após o desaparecimento dos três mais velhos, procurou a delegacia de Formosa e registrou uma ocorrência. O conselheiro Carmiltom informou que eles alegaram na denúncia à polícia que os filhos haviam sido sequestrados. “Eles acusam algumas pessoas de aliciarem os meninos. E isso seria um dos fatores para a fuga”, explica.
 

Investigação

Após o diálogo com João, um policial civil e o conselheiro tutelar conversaram de forma mais reservada com as crianças. O padrasto ficou sentando em um banco de madeira do lado de fora do barraco. Maria se acomodou em uma espécie de cozinha, ao lado do fogão à lenha que esquentava o jantar do dia. Cerca de uma hora depois, o grupo decidiu que as crianças não poderiam ficar naquele ambiente. Ao Correio, as autoridades explicaram que os mais novos negaram punições com castigos físicos. Mas confirmaram que os mais velhos apanhavam caso não obedecessem ou se pegassem algo de outra pessoa. “Os meninos serão levados para um abrigo em Formosa até que a Justiça analise o caso. Essa é uma medida para proteger as crianças”, explicou Carmiltom. Eles foram encaminhados para a Casa da Mãe Social, até que a situação familiar seja resolvida.
 
O agente da Polícia Civil de Goiás Elmo Pinheiro Lopes informou que João e Maria deverão comparecer à delegacia de Formosa, amanhã. Segundo ele, apesar da situação precária em que as crianças eram mantidas, ainda não havia elementos para a prisão do homem. “Não há prova contundente de crime ou abuso. Nós intimamos os pais das crianças e as testemunhas”, explicou. “Nós vamos buscar mais informações sobre os outros irmãos. No entanto, as investigações seguem. Se for confirmado o abuso, ele poderá ser levado à Justiça”, reforçou o policial. Nenhum dos dois tem passagens pela polícia.

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