Um almoço na casa do ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), ajudou a CPI das Bets a encontrar o empresário Fernando Oliveira Lima, o Fernandin Oig, para que ele prestasse depoimento aos senadores.
Fernandin foi convidado a depor sob suspeita de ser o responsável pelo Jogo do Tigrinho no Brasil. Apesar de ser dono de uma bet que explora o tigrinho, ele nega ser representante da empresa que criou o jogo.
Para chamá-lo a depor, assessores da relatora da CPI, a senadora Soraya Thronicke (Podemos), e policiais que auxiliam a comissão tentaram por diversas formas de contatar o empresário, sem sucesso. Ele não respondeu, por exemplo, a contatos feitos por meio das redes sociais.
Fotos de viagens postadas nas redes davam a entender aos senadores que ele estava no exterior. Ao comentar sobre a dificuldade em encontrá-lo com um colega de Congresso, a senadora ouviu do parlamentar que Fernandin estava não apenas no Brasil como em Brasília, almoçando com o ministro do STF.
Sem criar um constrangimento para Nunes Marques, a CPI mandou a Polícia Legislativa checar se o jatinho de Fernandin estava na capital federal. No local, os agentes encontraram a aeronave em um dos hangares.
Agentes da polícia legislativa chegaram por volta das 15h do dia 21 de novembro ao Aeroporto de Brasília e esperaram até 21h15, quando Fernandin foi abordado para assinar a intimação. O depoimento aconteceu na primeira sessão da CPI, no dia 26 do mesmo mês.
Na CPI, o empresário foi questionado sobre sua relação com o ministro em razão de uma viagem à Grécia para comemorar o aniversário do cantor sertanejo Gusttavo Lima. O ministro foi ao festejo no avião de Fernandin.
A pergunta partiu do senador Alessandro Vieira (MDB). “O senhor pode me informar quando o senhor estabeleceu uma relação de amizade com o ministro Kassio Marques?”
Fernandin indagou: “Quem?”. O senador explicou: “O ministro do Supremo Tribunal Federal Kassio Nunes Marques”.
“Ah, o Kassio. É porque todo mundo o chama de Nunes Marques, mas eu o conheci como Kassio. O Kassio é um amigo meu de mais de dez anos atrás, lá do Piauí, de comer panelada de buchada de bode e galinha caipira. É só relação de amizade mesmo. Tanto que eu nem o conheço como Nunes Marques”, contou Fernandin.
O empresário ainda explicou que a tal buchada na qual conheceu o ministro aconteceu há uma década, no Mercado do Piçarra, patrimônio histórico de Teresina, capital do Piauí, estado de origem do magistrado. Ele não soube dizer se Nunes Marques já era desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) à época — ele foi nomeado pela ex-presidente Dilma Rousseff, em 2011.
Alessandro Vieira, então, brincou: “Bom danado e bem frequentado: nós temos um milionário e um ministro do Supremo na mesma buchada. Está vendo? Que alegria!”.
Durante a CPI ficou evidente ainda a amizade de Fernandin com o senador Ciro Nogueira (PP-PI), que também é próximo do ministro do Supremo.
Ciro Nogueira intercedeu em favor do empresário quando Soraya Thronicke mencionou a dificuldade de encontrá-lo e parabenizou a polícia legislativa. Ela queria deixar, desde já, o empresário convocado para voltar a depor. Ciro, então, disse: “Senadora, não é verdade.”
Soraya, então, questionou: “O senhor está dizendo que eu estou mentindo?”. Nogueira reiterou: “Não, estou dizendo que não é verdade que é difícil encontrá-lo”.
A senadora, então, respondeu: “É muito difícil. Pra mim é. Pro senhor deve ser fácil”. Nogueira respondeu: “O Fernando é um grande empresário do meu estado, eu conheço ele há muito tempo. Eu me comprometo aqui com a CPI, caso nós decidamos trazer ele de volta, a encontrá-lo. É uma pessoa que reside no meu estado”.
“Não, mas então deixemos intimado”, insistiu Soraya.
O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) identificou um pagamento suspeito de R$ 1,7 milhão da One Internet Group (OIG), que pertence a Fernandin, a uma empresa em nome de uma faxineira de São Paulo.
A empresa está relacionada em uma investigação da Polícia Civil de São Paulo sobre supostos desvios no contrato entre o Corinthians e a Vai de Bet. Senadores pediram compartilhamento do inquérito com a polícia paulista.
A mesma investigação acabou obtendo acesso a R$ 100 milhões em transações suspeitas e atípicas relacionadas ao mundo das bets. A defesa de Fernandin nega qualquer irregularidade e afirma que “não há qualquer tipo de relação societária ou de parceria da empresa e seu proprietário com o “Fortune Tiger”, nome oficial do Jogo do Tigrinho.
OIG afirmou que “foi uma das primeiras empresas do setor de entretenimento online a pagar a outorga ao Ministério da Fazenda e opera sob absoluta legalidade previamente às normas que entrarão em vigor apenas a partir de 1 de janeiro de 2025. O CEO da OIG, Fernando Oliveira Lima, tem inclusive apoiado o combate aos jogos e plataformas ilegais operantes no Brasil”.
Procurados, o senadores Ciro Nogueira e Soraya Thronicke não se manifestaram. Procurado por meio da assessoria do STF, o ministro Kassio Nunes Marques não respondeu até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto.
Com informações do portal Metrópoles