Os sinais de que Trump pode estar pronto para recuar nas tarifas

Existem sinais de que o governo Donald Trump poderia estar propenso a reduzir suas tarifas de importação globais. Quais motivos poderiam influenciar esta possível decisão e quais serão os próximos passos para o comércio global?

30/04/2025 08h02 - Atualizado há 8 horas
Os sinais de que Trump pode estar pronto para recuar nas tarifas
Os representantes dos Estados Unidos nas recentes reuniões do FMI enfrentaram irritação, perplexidade e profundas preocupações de quase todo o mundo - (crédito: Reuters)

Ao longo da última semana, cruzei a América do Norte do Estado do Arizona até Washington DC, nos Estados Unidos. Dali, segui até Saskatchewan, no Canadá.

O continente está sofrendo mudanças radicais.

Pude presenciar claras evidências do resultado das históricas alterações da economia mundial. As enormes incertezas fazem com que ninguém realmente saiba para onde elas irão nos levar.

O jardim de rosas da Casa Branca e a sede do Fundo Monetário Internacional (FMI) estão separados por uma caminhada de apenas nove minutos. Mas, nos últimos dias, neste pequeno trajeto, dois mundos muito diferentes colidiram entre si.

Nos jardins da Casa Branca, de posse de uma equação questionável, o presidente americano Donald Trump surpreendeu o mundo no início deste mês, com suas chamadas "tarifas recíprocas".

Já o FMI é o lugar onde, depois de apenas três semanas repletas de reversões, confusões e tumultos no mercado, os ministros das finanças de todo o mundo se reuniram para tentar juntar os pedaços, mesmo que eles ainda estivessem reverberando no chão.

Nas reuniões do FMI, que incluíram encontros de membros do G7 e do G20, surgiu algo inusitado. Os representantes dos Estados Unidos não enfrentaram hostilidade aberta, como se poderia esperar, mas sim irritação, perplexidade e profundas preocupações de quase todo o mundo.

Os americanos levaram a economia global de volta a uma nova crise, no exato momento em que ela finalmente se recuperava de quatro anos de pandemia, guerras e crises de energia.

Os países do leste asiático expressaram esta preocupação de forma mais aguda. Eles foram classificados, no início de abril, como "assaltantes e saqueadores" dos empregos americanos porque estas economias – muitas delas, importantes aliadas dos Estados Unidos – exportam mais produtos do que importam dos Estados Unidos.

O destaque do G7 foi a fúria silenciosa e determinada dos japoneses. Afirma-se que eles se sentem traídos pelas mudanças no comércio americano e que a confusão criada sobre as reais intenções dos negociadores comerciais dos Estados Unidos teria gerado uma forte venda de títulos da dívida pública do país.

O ministro das Finanças japonês, Katsunobu Kato, declarou à mesa redonda que as tarifas de importação americanas são "altamente decepcionantes", prejudicam o crescimento e desestabilizam os mercados.

Aquilo me fez lembrar do ano de 2022, no FMI, quando os ministros das Finanças dos países em desenvolvimento me perguntavam se tudo estava bem no Reino Unido, durante a minicrise do orçamento do governo da então primeira-ministra Liz Truss.

Naquela época, o Reino Unido era a fonte de fragilidade, que fazia comércio como um mercado emergente, quando seu papel normal seria de solucionar crises naqueles mercados.

Toque de retirada

Frente aos mercados febris de títulos da dívida, o até então fraco toque de retirada da guerra comercial americana soou mais forte esta semana.

Os Estados Unidos pareciam oferecer uma floresta inteira de ramos de oliveira para que os chineses retornassem à mesa de negociações. Eles incluíram desde o respeito às suas conquistas econômicas até a oferta de um acordo para um "belo reequilíbrio" da economia mundial.

O discurso se afastou completamente das acusações de "assaltos e saques".

Mas o esperado encontro entre o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Scott Bessent, e seu correspondente chinês não se materializou.

A maior parte dos países, ao sair da reunião com Bessent, relata a impressão de que os Estados Unidos estariam se retraindo de uma posição que eles não podem reconhecer como tendo ultrapassado seus limites.

A visão geral é de que não há necessidade de retaliação dos países. Os CEOs (diretores-executivos) do Walmart e da Target já disseram ao presidente de forma privada que haverá prateleiras vazias nas suas lojas a partir do início de maio.

O colapso do tráfego de contêineres, da China até o porto de Los Angeles – a principal artéria da economia mundial neste início do século 21 – é uma consequência a ser observada.

Os economistas do FMI afirmam que já começam a observar o impacto a partir do espaço, com os satélites rastreando menor quantidade de navios, cada vez mais vazios, deixando os portos chineses. Naturalmente, os Estados Unidos irão negar a situação.

O teatro da Casa Branca

É verdade que houve relativamente mais calma no final das reuniões do FMI em comparação com o início. Por quê?

Porque o Secretário do Tesouro americano, Scott Bessent, assumiu o controle da agenda de tarifas, o que, quase por si só, já acalmou os mercados e o resto do mundo.

Os diplomatas financeiros creditam a ascensão de Bessent e a crucial pausa de 90 dias sobre as chamadas tarifas "recíprocas" a certas cenas teatrais ocorridas na Ala Oeste da Casa Branca.

Conta-se que Bessent só conseguiu influenciar Trump em relação aos danos causados pelas tarifas de importação ao mercado de títulos da dívida pública, depois que um conselheiro econômico da Casa Branca conseguiu lançar a isca sobre uma reunião falsa, para atrair o falcão linha-dura e autor da infame equação das tarifas recíprocas, Peter Navarro, e afastá-lo do Salão Oval.

Os patrões de Wall Street teriam sugerido que somente a demissão de Navarro poderia trazer uma aparência de retorno à normalidade. Mas fontes do governo sugerem que Trump nunca irá se livrar do seu consultor comercial, já que ele foi preso após os distúrbios de 6 de janeiro de 2021, em apoio ao presidente.

Na melhor das hipóteses, parece que o futuro da economia mundial e do nosso modo de vida irá se desenvolver como se fosse um romance da escritora Hilary Mantel (1952-2022) sobre a corte de Donald Trump, com ação em tempo real.

No pior caso, o processo levará os financistas e governos a começar a pensar no impensável sobre até que ponto os Estados Unidos ou o resto do mundo poderão avançar.

E, atualmente, a incerteza sobre todos os aspectos é mais preocupante que o impacto direto das tarifas.

Cenário aterrador

Esta incerteza vem gerando teorias um tanto delirantes sobre o que poderá vir em seguida.

Em tempos de estresse financeiro global agudo, existem "linhas de swap" (acordos de troca de moedas) entre os bancos centrais para preservar a estabilidade financeira. Elas garantem o fornecimento constante de dólares americanos.

Mas, agora, alguns dos bancos centrais do planeta começaram a imaginar o que poderá acontecer se os Estados Unidos decidirem usar suas "linhas de swap" de dólares para o resto do mundo, como forma de alavancagem diplomática ou até como arma.

Seria inconcebível que os Estados Unidos pudessem negar essas linhas ou proibir o Federal Reserve (o Banco Central americano) de distribuí-las?

É preciso simplesmente acreditar que esta é uma situação inconcebível. Afinal, em muitos casos, não há forma de atenuar esta questão.

Mas este cenário aterrador para o sistema financeiro mundial, por mais que seja improvável, não é totalmente implausível no momento.

Uma ideia um pouco menos improvável talvez seja que os países que detêm superávit comercial com os Estados Unidos possam ajudar a financiar os EUA com um imposto efetivo sobre os títulos da dívida do governo americano em seu poder.

Algumas destas ideias vêm surgindo em discursos e documentos dos consultores governamentais americanos.

Neste cenário, alguma ideias preocupantes, mas incorretas, podem começar a minar a confiança geral.

Já houve, por exemplo, uma questão importante sobre a venda de um volume significativo de títulos da dívida do governo americano ocorrida logo após o anúncio original das tarifas de importação: Quem foi?

Algumas pessoas especularam que foi a China. Mas, atualmente, o Japão é o maior credor dos Estados Unidos.

Teria sido uma venda japonesa que ajudou a fazer Trump pausar as tarifas, em uma tática diplomática quase deliberada?

Duas autoridades com muito boas conexões me sugeriram este cenário, demonstrando o momento febril atual, embora pareça algo implausível.

Ninguém está rastejando

Quando Bessent assumiu o noticiário do fim de semana nos Estados Unidos, ao tomar o controle deste processo, foi ainda muito interessante vê-lo enviar a mensagem de que "os investidores precisam saber que o mercado de títulos do governo americano é o mais seguro e estável do mundo".

Se foi realmente necessário dizer isso é porque...

Outro importante ministro das Finanças me disse que, entre seus parceiros globais, "nenhum estava rastejando frente aos americanos", considerando a insuperável eficácia dos Estados Unidos para fazer negócios com seu próprio mercado de títulos da dívida pública.

Em meio às incertezas, ninguém parece saber se a tarifa de importação universal "básica" de 10% é mesmo negociável.

Na verdade, a mensagem do presidente Trump de que as receitas com tarifas podem ser suficientes para "eliminar completamente" o imposto de renda de "muitas pessoas" indica que a tarifa de 10% veio para ficar.

"Depende de com quem você falar em cada dia da semana", disse uma autoridade sênior do G7. "Ouvi três posições diferentes, uma da Casa Branca, uma do Departamento do Comércio e outra de um representante do Comércio dos Estados Unidos."

"Sabe qual vai ser o resultado? O que o presidente quiser naquele momento, levado por questões políticas, industriais e de mercado."

Diplomacia britânica consistente

Este tema é de interesse específico para o Reino Unido, pois as tarifas básicas atingem em cheio os britânicos.

Além das grandes tarifas de importação sobre os carros (o maior produto de exportação do Reino Unido) e provavelmente sobre produtos farmacêuticos (o segundo colocado), as medidas americanas em relação ao Reino Unido parecem inexplicáveis.

Afinal, a criativa definição da própria Casa Branca diz que a "trapaça comercial" ocorre quando um país tem um superávit de exportação sobre outro. Sendo assim, na verdade, os Estados Unidos estão "trapaceando" levemente com o Reino Unido.

Apresentei este ponto à ministra britânica Rachel Reeves diversas vezes, em duas entrevistas em Washington. Ela rejeitou diplomaticamente esta sugestão.

Mas, em dado momento no final da nossa última entrevista, caminhando em torno do famoso corpo d'água entre o Memorial de Lincoln e o Monumento a Washington, ela apresentou algo um tanto revelador sobre este mundo em mutação.

"Entendo o motivo de tanto interesse pelo nosso relacionamento comercial com os Estados Unidos, mas, na verdade, nossas relações comerciais com a Europa, sem dúvida, são ainda mais importantes, pois eles são nossos vizinhos e parceiros comerciais mais próximos", segundo ela.

A declaração causou um pouco de alarde entre os britânicos, mas não foi uma gafe.

Isso porque, para o Reino Unido, fazer concessões aos Estados Unidos sobre padrões alimentícios é fora do propósito, por motivos políticos domésticos.

Os americanos parecem ter aceitado esta questão, depois da consistente diplomacia britânica. O foco permanece em um acordo sobre o progresso da tecnologia.

Parece bastante claro, agora, que o Reino Unido irá promover um acordo de "altas ambições e forte alinhamento" com a União Europeia. É o que se comenta por aqui, entre os ministros das Finanças dos diferentes países.

Uma autoridade internacional muito importante usou a reaproximação entre o Reino Unido e a União Europeia como um exemplo do que faz o resto do mundo, coordenando e "fazendo sua lição de casa", em resposta à falta de confiabilidade americana.

"O Brexit foi um divórcio amargo", ouvi em caráter particular. "Mas, agora, vejo que eles estão namorando de novo."

Também surgiu algum alívio quando os Estados Unidos reafirmaram seus compromissos com o Banco Mundial e o FMI.

O Projeto 2025, publicado em abril de 2023 pelo centro de pesquisa e debates The Heritage Foundation, antecipando um segundo mandato de Donald Trump, previu que os Estados Unidos abandonariam aquelas organizações internacionais. E o presidente do Banco da Inglaterra, Andrew Bailey, manifestou recentemente suas preocupações a este respeito.

Bessent aproveitou as reuniões para reafirmar os compromissos dos Estados Unidos com o Banco e com o Fundo, mas como retorno às suas funções centrais e longe das considerações sobre questões sociais e o meio ambiente. Os europeus consideraram esta decisão uma vitória.

Uma grande batalha?

Mas uma questão maior ainda subsiste. Os Estados Unidos irão usar esta guerra comercial para tentar reunir o resto do mundo ao seu lado, em uma grande batalha contra a China?

Se este realmente for o seu objetivo estratégico, parece inacreditável que eles tenham irritado seus aliados de forma tão básica e significativa.

Um caso típico é o da Espanha, que enfrenta tarifas de importação de 20%, como Estado-membro da União Europeia.

O primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, reuniu-se em Pequim com o presidente chinês Xi Jinping, duas semanas atrás.

A florescente economia espanhola foi a economia avançada que mais cresceu no ano passado. As previsões indicam que irá repetir o feito este ano e é a única a ser promovida pelo FMI.

A economia da Espanha se baseia em energia verde, acesso à mão de obra externa, turismo e quantidades significativas de investimentos e transferência de tecnologia da China.

Os Estados Unidos não concordaram com a visita e mantiveram uma discussão "franca" com o ministro das Finanças espanhol, Carlos Cuerpo.

Ele pareceu não se abalar com tudo isso e me disse, durante a Cúpula Semafor sobre a Economia Mundial, em Washington, o seguinte:

"Existe um enorme déficit comercial com a China. E precisamos corrigir isso nos abrindo para a China, mas também atraindo investimentos chineses – dentro, é claro, de um guarda-chuva de segurança econômica geral. Isso só pode ser feito interagindo e, de fato, conversando com as autoridades chinesas."

A Espanha atingiu níveis consideráveis de transferência de tecnologia e investimentos de fábricas chinesas de veículos elétricos.

Esta situação não agrada os Estados Unidos. Mas, se os americanos quisessem convencer os espanhóis e a União Europeia sobre uma aliança confiável e duradoura contra a China, seria difícil considerar esta estratégia no caos e nas acusações de tarifas verificadas nos últimos meses.

O vencedor das eleições canadenses, seja quem for, irá trazer decididamente a economia do G7 de volta a este debate transformador global.

Será que o primeiro-ministro eleito do Canadá também poderá iniciar uma negociação abrangente com o Reino Unido?

Ele também irá presidir a Cúpula do G7 no mês de junho, quando expira o prazo de 90 dias determinado pelo presidente americano. Acredita-se que Donald Trump viaje para a cúpula a se realizar em Alberta, no Canadá – o mesmo país que ele afirma que deveria fazer parte dos Estados Unidos.

Existe um caminho que leva à paz, à calma e à redução das tensões no comércio. Mas tudo também pode se agravar no futuro próximo.

Estamos vivendo semanas críticas para a economia mundial.


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