Decisão sobre SNE se aproxima e divide opiniões no Congresso

Projeto discutido há mais de 10 anos deve ter nova versão apresentada até agosto; entidades e parlamentares alertam para riscos de centralização e falta de representatividade regional na tomada de decisões sobre a educação no país

08/07/2025 03h23 - Atualizado há 10 horas
Decisão sobre SNE se aproxima e divide opiniões no Congresso
- (crédito: Foto: Tony Oliveira/Agência Brassília)

Mudança prevê a criação de conselho tripartite formado pela Undime, Consed e MEC; tema será debatido em audiência nesta quinta. 

O Sistema Nacional de Educação (SNE), debatido no Congresso Nacional por mais de 10 anos, está próximo de ser aprovado. Após passar pelo Senado em 2019, o projeto está atualmente sob relatoria do deputado Rafael Brito (MDB-AL), presidente da Frente Parlamentar Mista da Educação (FPME), e pode finalmente entrar em vigor. O tema será debatido em audiência pública na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados nesta quinta-feira.

O novo modelo propõe a criação de um conselho tripartite — algo semelhante ao conselho do Sistema Único de Saúde (SUS) — para tomada de decisões sobre a educação no Brasil. O colegiado será formado pela União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), pelo Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e pelo Ministério da Educação (MEC).

O sistema começou a ser discutido em 2015, quando a Comissão de Educação da Câmara realizou as primeiras audiências públicas sobre o tema. No entanto, apesar da urgência, o projeto não foi pautado pelo antigo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Foi somente com a chegada de seu sucessor, Hugo Motta (Republicanos-PB), que a iniciativa ganhou novo impulso, com a designação do presidente da FPME para dar continuidade ao trabalho.

"O SNE é um sistema que trabalha diretamente ligado a esse planejamento que o Plano Nacional da Educação (PNE) trará e nós colocaremos ele na prioridade. O deputado Rafael Brito, será o relator aqui na Casa e terá que trabalhar de maneira paralela ao trabalho da Comissão Especial do PNE, para que, com isso, essas duas matérias, que serão importantes para a educação brasileira, possam ser votadas aqui no plenário da Câmara no prazo mais curto possível", afirmou Motta durante coletiva no início de maio.

Pontos de atenção

Apesar da atenção de Motta ao projeto, entidades ligadas à educação e parlamentares demonstram certa preocupação com a relatoria que está prestes a ser apresentada. Uma delas é a organização da sociedade civil De Olho no Material Escolar.

De acordo com a presidente da entidade, Leticia Jacintho, centralizar ações em poucos membros seria ruim devido ao tamanho do Brasil. "Centralizar decisões sem que haja uma participação regional mais significativa, colocará a educação do país sob risco. O Brasil tem 5.570 municípios, cada um com sua realidade. Agora pense que 15 pessoas serão responsáveis por representar todas essas cidades em uma decisão importante. Como garantir que todas essas vozes diferentes sejam ouvidas de verdade?", destacou.

Além disso, a entidade também está preocupada com a ingerência sobre a gestão privada da educação, já que o SNE também contempla escolas e faculdades particulares. "O setor privado caminha mais rapidamente que o setor público no processo de educação de nossas crianças e jovens. Da forma como foi proposto, o Sistema Nacional de Educação nivelará por baixo o desempenho escolar", ponderou Jacintho.

Além de organizações, há também parlamentares preocupados com o texto do SNE, entre eles, a deputada Adriana Ventura (Novo-SP), membro da Comissão de Educação. "A criação de um sistema pode ser positiva, desde que tenha como foco uma articulação eficiente e transparente entre os entes federativos, respeitando a autonomia de cada um. Hoje, vejo riscos reais de engessamento, sobreposição de competências e criação de estruturas pesadas e ineficazes. O SNE não pode se tornar mais um órgão burocrático que dificulta a inovação e a gestão local da educação", defendeu Ventura.

Um dos pontos criticados pela parlamentar é a vinculação das decisões às comissões Tripartite e Bipartites. "Isso compromete a clareza institucional e pode gerar conflitos federativos. Eu defendo uma governança técnica, que valorize a articulação, mas preserve a autoridade do MEC como órgão formulador de políticas públicas educacionais", declarou.

A deputada apresentou diversos requerimentos a fim de que o relator da matéria realizasse audiências públicas para debater o tema antes de levar o SNE a votos, mas na visão da parlamentar, o texto atual precisa passar por uma revisão. "Acredito que o conceito de cooperação federativa é importante e necessário, mas o texto atual precisa de revisão profunda."

Ventura disse não ser contra o SNE, mas sim, ao modelo que "centraliza decisões, ignora a diversidade dos sistemas de ensino e cria estruturas pesadas sem foco claro em resultados". "O que não podemos é aprovar um texto apressadamente, sem diálogo qualificado, e correr o risco de agravar os problemas da educação brasileira em vez de solucioná-los", ressaltou.

Prioridade

Assim como o PNE, o SNE tem sido uma das prioridades trabalhadas pela bancada da educação e pela FPME na Câmara. O presidente da frente e relator do sistema, Rafael Brito (MDB-AL), contou que o relatório ainda não está pronto e que faltam ainda a realização de um seminário — que ainda está sem data — e uma audiência pública que ocorre na manhã desta quinta. A primeira audiência sobre o SNE foi realizada em 10 de junho e faz parte do plano de trabalho do relator.

"Vamos fazer a segunda audiência pública agora e depois um seminário que é mais amplo. Mas o relatório não está pronto ainda não. Peguei muita coisa de um texto da deputada Socorro Neri (PP-AC), já me reuni com o MEC por duas oportunidades, a gente vai se reunir de novo também nesta semana e que tem ajudado também na construção do texto", explicou Britto.

"É um assunto que muita gente já participou, já disse o que era bom, o que era ruim. O texto que foi votado no Senado foi muito criticado do ponto de vista negativo, então, a gente sabe mais ou menos o que tem de acerto e de erro. A ideia é fazer um relatório novo, apresentar um substitutivo, para que possamos votar isso, talvez, até o final de agosto", emendou.


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