Procuradoria-Geral da República apresentou denúncia ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o deputado federal Izalci Lucas (PSDB-DF) pelo crime de peculato – apropriação de recursos públicos. Segundo a ação, ele desviou doações feitas pela Receita Federal e pelo Tribunal de Contas da União (TCU) ao governo do DF entre 2009 e 2010, quando era secretário de Ciência e Tecnologia.
A denúncia faz referência a esses dois casos e, por isso, pede que ele seja processado duas vezes pelo crime. O documento de 13 páginas foi protocolado na última sexta-feira (15) e assinada pelo ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, cujo mandato terminou no domingo (17).
O caso está sob relatoria da ministra do STF Rosa Weber, que deve notificar o deputado para apresentar defesa prévia no processo. Em seguida, o processo será levado à Primeira Turma da corte, que decide se recebe ou não a denúncia da PGR.
Se a ação penal for recebida, Izalci se torna réu nos processos por peculato. Ao G1, o deputado disse que sofre perseguição política.
"É uma coisa totalmente política. Não tem o mínimo de fundamento essa acusação. Recebi material como secretário e encaminhei para a Fundação Gonçalves Lêdo, que fizeram as doações. O pedido que fiz foi mesmo para doações. Eram computadores usados, radinhos de pilha, bagulhos, bugigangas", afirmou.
O suposto desvio dos itens doados pela Receita Federal já era investigado pela Secretaria de Transparência do DF, que enviou documentos à PGR. Segundo a apuração, entre maio e junho de 2009, Izalci enviou pedidos de doação a duas superintendências da Receita (em São Paulo e no Paraná), pedindo que objetos confiscados pelos fiscais do órgão fossem doados ao governo do DF.
Nos ofícios, segundo a PGR, ele pedia "materiais escolares, equipamentos eletrônicos, brinquedos e vestuários apreendidos, ao argumento de que seriam utilizados em prol das atividades desenvolvidas no âmbito daquela pasta [Secretaria de Ciência e Tecnologia]".
Ao fiscalizar essas transações, a Secretaria de Transparência do DF concluiu que o montante doado pela Receita Federal somava R$ 245.176,94, mas os bens de fato incorporados ao patrimônio do DF representavam apenas 11,5% disso – um total de R$ 28.371,29.
As caixas da Receita Federal foram destinadas à sede da Fundação Gonçalves Lêdo, no Recanto das Emas – a mesma citada por Izalci na resposta ao G1. Ouvido pela Secretaria de Transparência do DF, o procurador-geral da fundação, Hélio Francisco Marques Júnior, disse que Izalci mandou uma funcionária abrir as caixas e, ao ser contestado, fez ameaças.
"...[declarou] que de imediato o deputado Izalci telefonou para o presidente da fundação, Manoel Tavares, comunicando que a mercadoria era sua e que apenas mandou guardar a mercadoria na dependência da Fundação e que, se Manuel continuasse com esse procedimento de proibir sua funcionária de abrir as caixas, ele [Izalci] iria cancelar o contrato de gestão DF-Digital com a fundação", diz o termo de depoimento que consta no processo.
Hélio Junior diz, ainda, acreditar que os bens doados pela Receita Federal ao governo foram passados adiante, como brindes, durante a campanha eleitoral.
As listas com o inventário dos objetos doados pela Receita constam no inquérito enviado pela PGR ao Supremo, e obtido pelo G1. As tabelas incluem videogames, pulseiras, fixadores de dentadura, perfumes, baralho e até sutiãs, gaitas e máquinas de costura.
A PGR também denuncia Izalci pelo suposto desvio de doações feitas pelo TCU, também em junho de 2009. Naquele mês, o Tribunal de Contas da União doou "cerca de 200 microcomputadores e 200 monitores de vídeo" à Secretaria de Ciência e Tecnologia.
Durante essa apuração, a Secretaria de Transparência recebeu do Ministério Público fotos que mostravam, supostamente, parte dos equipamentos doados sendo usados em uma sala comercial no centro de Brasília – espaço que pertenceria a Izalci.
Ouvida no inquérito, uma servidora pública que respondia a Izalci no governo do DF diz que as fotos "podem ter sido tiradas no callcenter do Partido da República (PR), localizado no Conic". Também diz que o político tinha várias salas comerciais naquele mesmo prédio, incluindo "um dos maiores escritórios de contabilidade do DF".
Um ex-funcionário da Fundação Gonçalves Lêdo também foi ouvido, e disse que reconheceu computadores doados pelo TCU no comitê de campanha eleitoral de Izalci, em março de 2010, no mesmo prédio comercial.