Um caso que se arrasta há, pelo menos, 12 anos, deixando um rastro de prejuízos pelo país, tem ré confessa respondendo a ação em liberdade. Em 2011, a Polícia Federal prendeu a servidora da Prefeitura de Luziânia (GO), cedida ao Tribunal Regional do Trabalho do Distrito Federal (TRT), Márcia de Fátima Pereira e Silva Vieira por chefiar um esquema criminoso que se apropriava de pagamentos de verbas trabalhistas. Cálculos preliminares estimam desvio de, pelo menos, R$ 30 milhões de pessoas físicas, jurídicas e da União, em 91 processos. A demora na resolução do caso pode levar trabalhadores, empresas e a própria União a ficarem sem ressarcimento. Após anos de tramitação, uma decisão da juíza Lizita Lobo da Silveira, 2ª Vara do Trabalho — DF, em 2017, assustou os que esperavam reaver o dinheiro. A magistrada explicou que o ressarcimento dos credores não será possível em razão do “corte de 30% do orçamento da Justiça do Trabalho, colocando em risco até mesmo o funcionamento das unidades judiciárias”.
Segundo a juíza, o TRT solicitou ao Conselho Superior de Justiça do Trabalho (SCJT) a liberação de crédito suplementar, porém, em cinco anos, o valor foi inferior ao necessário para ressarcir os prejudicados. Para evitar que o caso prescreva, a magistrada declarou a “extinção da execução” na 2ª Vara. Dessa forma, de acordo com a decisão, será possível buscar indenização em “juízo competente”. Como a União tem “a obrigação de indenizar prejuízos causados por ação ou omissão de seus agentes no exercício da função pública”, Lizita Lobo da Silveira indica que os prejudicados entrem com ação na Justiça Federal para tentar fazer valer seus direitos. O advogado Luciano Elexandro Gonzaga, que representa um empresário lesado, lamenta o desenrolar do caso. “Pela decisão ficou claro o calote. Esse dinheiro talvez nunca chegue aos atuais credores. Servirá de herança para filhos e netos”, disse. Depois de tanto tempo, tem muitos prejudicados que perderam o prazo para recorrer. “Além disso, parte do processo corre em segredo de Justiça, porque envolve servidores com foro privilegiado, que devem ser juízes e parlamentares. E a servidora que cometeu o crime goza de liberdade total”, reclamou um empresário.
As irregularidades ocorriam desde 2006, quando Márcia, que tinha autorização para movimentar depósitos, emitia ordens judiciais falsas para o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal para que os recursos de processos fossem depositados em contas falsas. Em 2011, além da servidora, foram detidos o marido dela, a mãe e um irmão. Apesar de ter assumido o crime, ela foi solta, o processo, na época, desmembrado e os parentes, retirados da ação. Segundo Márcia, a divisão da ação ocorreu porque uma parte tem segredo de Justiça, pois envolve pessoas com foro privilegiado. “A corda acaba sempre arrebentando do lado mais fraco”, disse. A ex-servidora ressaltou que está arrependida. “Quero devolver o que devo e liberar os bens da minha família. O processo só não anda mais rápido por conta da burocracia da Justiça”, reclamou. Na época da prisão, a Polícia Federal apreendeu com ela e a família carros importados, joias, relógios de luxo, celulares, televisões, imóveis e dinheiro. De acordo com a investigação, a ex-servidora criou uma empresa de terraplanagem para lavar os recursos desviados. De acordo com o advogado Lyndon Johnson Santos Figueiredo, que defende a ré nos processos penal e civil na Justiça Federal de Brasília, Márcia mora em uma fazenda e depende da renda da mãe para viver. “Ela ainda não prestou contas à Justiça poque os valores totais estão sendo apurados”, afirmou. Em 18 de janeiro, o Tribunal de Contas da União (TCU) deu prazo de mais 120 dias ao TRT-DF para que reúna os 91 processos nos quais a servidora está envolvida e que causaram prejuízos a pessoas físicas, jurídicas e à União. Em julho do ano passado o TCU havia estabelecido pagamento de multa de R$ 15 milhões para Márcia e de R$ 12 milhões para outros envolvidos na fraude, mas um recurso postergou o pagamento.