O PT vive uma situação delicada. Poucos dias após a divulgação de dois acordos de delação que devem respingar na legenda, a Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou a cúpula partidária e acusa a sigla de participar de desvios equivalentes a mais de R$ 1 bilhão. Sem nomes fortes para disputar o Planalto, correndo o risco de morrer antes das eleições e com possibilidade até de perder o registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o PT enfrenta um momento crítico, dizem especialistas. Caciques já estão presos ou perto de ir para a cadeia, o que traz à tona uma dificuldade de sobrevivência impensável nos 13 anos da era petista no Planalto.
“O momento é crítico, muito sensível, sobretudo em ano eleitoral. A legenda é histórica, tem um eleitor muito mobilizado, mas os últimos acontecimentos colocaram os companheiros em uma encruzilhada. Se eles não promoverem alianças e reorganizarem a base, a situação pode se complicar ainda mais”, explica o professor de ciência política Marcelo Vieira, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), lembrando que a denúncia da PGR atinge, entre outros, a presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR). “É claro que isso respinga nela. Agora, veja, temos um conflito interessante, que é o ex-ministro Antonio Palocci sendo acusado pela PGR de roubar com o PT, de um lado, e a Polícia Federal dizendo de outro, que o cara vai delatar todo mundo do partido”, avalia Vieira. Para o professor da Ufes, a dificuldade em substituir o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva — que está preso e inelegível, condenado a 12 anos e um mês de prisão no caso do tríplex do Guarujá (SP) — é um dos maiores problemas, e mostra a fragilidade em que os petistas se encontram.
“Não tem mais nenhum nome forte. O partido apostou muito mal nos quadros de sucessão ao Lula. Quem era forte está preso. Dilma (Rousseff) foi um fracasso. (Fernando) Haddad mantém plataforma política, mas é um gestor malsucedido, sem adesão eleitoral nacional”, observa Marcelo Vieira, que não acredita mais no poder de Lula para eleger alguém de sua confiança. Segundo o especialista, transferências de votos não funcionam para o PT desde as eleições de 1989, quando Leonel Brizola cedeu votos a Lula.
Registro eleitoral
Para Joana Meireles, professora aposentada de direito eleitoral da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), “o PT errou muito no cálculo político para promover a sobrevivência eleitoral sem Lula, ainda mais em uma eleição majoritária”. Sem o nome do ex-presidente nas urnas, o eleitorado que não acompanha a ideologia do PT, só votava nele por causa da estrela petista, vai migrar. “O Lula fazia com que o eleitorado mais amplo ficasse em torno dele. A gente não vê isso na senadora Gleisi, por exemplo, que vai deixar o Senado para fortalecer a Câmara. Isso é uma atitude desesperada, tentar aumentar a bancada na Casa Baixa como sendo a única opção era uma atitude inimaginável 10 anos atrás”, completou.
O PT corre ainda o risco de perder o registro partidário. O pedido foi feito no fim do ano passado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Juristas alegaram a desmoralização do partido, que corre risco real de ser cassado. E que poderá se agravar ainda mais, caso seja comprovada a transferência de US$ 1 milhão do ditador líbio Muamar Kadafi para a campanha de Lula, em 2002, conforme sinalizou o ex-ministro Antonio Palocci, em sua proposta de delação premiada.
Defesa de Lula critica a PGR
A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado e preso por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, divulgou nota ontem, na qual contesta a mais recente denúncia da Procuradoria-Geral da República contra o petista. Os advogados do ex-presidente classificam a acusação formal de uma “nova investida” do Ministério Público Federal e argumentam que “a ausência de qualquer materialidade e a repetição de imputações descabidas ao ex-presidente Lula sobressaem” na peça, baseada na delação premiada da Odebrecht, e enviada ao Supremo Tribunal Federal. Lula é acusado de ter dado o “aval presidencial” para as operações — entre elas, há casos de financiamento de campanha pela empreiteira em troca do atendimento a interesses da Odebrecht em órgãos como a Petrobras, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Ministério do Planejamento. Um dos casos citados é uma linha de financiamento de U$ 1 bilhão da exportação por empresas brasileiras a Angola.