Como se não bastasse a blindagem do foro privilegiado, a classe política não quer ser alvo de piadas, mas o movimento de censura está instituído claramente, no Artigo 45 da Lei Federal nº 9.504, de 1997. Desde 2010, a mordaça se encontra suspensa, mas em caráter liminar. Na próxima quarta-feira, 13, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidirá a parada de vez , no julgamento do mérito. Ou seja, será decidido se o povo pode ou não, pelo menos, rir das lambanças das excelências.
Na manhã de ontem, o relator do processo, ministro Alexandre de Moraes, recebeu os comediantes Fábio Porchat, Marcius Melhem e Bruno Mazzeo. Com bom humor, o trio buscou sensibilizar o magistrado em favor da liberdade de expressão. O questionamento jurídico está formalizado na Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 4451, proposta pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert).
“Os dispositivos legais em questão não se coadunam com a sistemática constitucional das liberdades de expressão e de imprensa e do direito à informação, garantias institucionais verdadeiramente constitutivas da democracia brasileira”, argumenta a Abert. Taxando a legislação como censura, a associação defende a possibilidade da sátira com um elemento necessário para a construção de um ambiente eleitoral sadio.
“Assim, a ideia de um procedimento eleitoral justo não exclui, mas antes pressupõe, a existência de um livre, aberto e robusto mercado de ideias e informações, só alcançável nas sociedades que asseguram, em sua plenitude, as liberdades de expressão e de imprensa, e o direito difuso da cidadania à informação”, alinhava a Adin.
O analista de risco Paulo Kramer não vê graça na legislação antipiadas. E afirma: a sátira é um elemento da vida pública. “E para quem é liberal, como eu, é muito importante que os políticos temam a sátira, para que não se sintam muito à vontade em fazer o que querem com o dinheiro do contribuinte”, pondera. A irreverência é uma arma da democracia. Na ditadura militar, jornalistas e humoristas buscaram transmitir ideias pelo riso. “Millôr Fernandes brincava: ‘jornalismo é oposição; o resto é armazém de secos e molhados’”, cita.
O professor Ricardo Caldas, do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), também não ri com a mordaça proposta pelos políticos. No seu entender, a sátira é válida, mas não pode ultrapassar as fronteiras da grosseria, vulgaridade e difamação. Nestes casos, diz, cabe reparação.
Aos políticos, no entanto, não soa coerente a regalia de um campo de força contra os risos do povo. Muito menos nesse Brasil, onde as excelências protagonizam um stand up nada engraçado com escândalos de “suposta” corrupção e má administração dos serviços públicos.
Saiba Mais
Confira a piada (SQN):
“Art. 45. Encerrado o prazo para a realização das convenções no ano das eleições, é vedado às emissoras de rádio e televisão, em sua programação normal e em seu noticiário:
(…)II – usar trucagem, montagem ou outro recurso de áudio ou vídeo que, de qualquer forma, degradem ou ridicularizem candidato, partido ou coligação, ou produzir ou veicular programa com esse efeito;
III – veicular propaganda política ou difundir opinião favorável ou contrária a candidato, partido, coligação, a seus órgãos ou representantes”.