Você sofre toda vez que se lembra da necessidade de botar a mão no bolso para abastecer o carro? Isso não parece ser realidade para os deputados federais de Brasília. Só no primeiro semestre deste ano, o dinheiro público liberado por meio da cota parlamentar bancou R$ 91.771,16 em combustíveis e lubrificantes para sete dos oito representantes do Distrito Federal na Câmara dos Deputados. Os dados estão no site da Casa.
Com esse valor, é possível comprar 21.091,96 litros de gasolina comum, levando em conta o preço médio de R$ 4,351 registrado no período pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Um automóvel capaz de percorrer 12km por litro poderia rodar 253.103,64 quilômetros com essa quantidade de combustível, o suficiente para dar seis voltas no planeta Terra, que tem em torno de 40 mil quilômetros de circunferência – e ainda sobraria um pouquinho.
Laerte Bessa (PR) foi o que mais rodou nos primeiros seis meses de 2018. Sozinho, o parlamentar desembolsou R$ 17.961,11. Logo atrás, estão Erika Kokay (PT), com gasto de R$ 17.308,53, e Rogério Rosso (PSD), com R$ 17.238,91. Enquanto os dois primeiros sinalizam o desejo de se reeleger, Rosso concorrerá ao Palácio do Buritinas eleições de outubro.Não quer percorrer o mundo todo? Sem problemas. Como a linha reta que separa o Brasil do Japão mede em torno de 17.360km, nessas condições seria possível ir e voltar ao país asiático seis vezes.
Os valores podem crescer, pois os parlamentares têm até 90 dias após o fornecimento do produto ou prestação do serviço para apresentar documentação que comprove gasto, para então receber o reembolso.
A cota parlamentar
No mesmo período de 2017, o montante despendido com produtos a fim de se viabilizar a circulação dos parlamentares e suas equipes por meio de automóveis foi de R$ 84.028,86. Se corrigido o valor da gasolina naquele intervalo pelo preço atualizado deste semestre, o gasto real seria R$ 99.154,05.
Os deputados federais da capital da República têm à disposição R$ 30.788,66 mensais de Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar, segundo a Câmara dos Deputados. A despesa para combustíveis e lubrificantes tem limite inacumulável de R$ 6 mil por mês. Além desses produtos, os parlamentares podem utilizar esse dinheiro para gastos como passagens aéreas, serviços de telefonia, locação de imóveis e contratação de consultorias, entre outros.
Críticas
Se, por um lado, os deputados defendem a cota parlamentar como recurso necessário para a atividade legislativa (confira na galeria), especialistas em finanças públicas apontam falhas nesse argumento. O fundador e secretário-geral da Associação Contas Abertas, Gil Castello Branco, por exemplo, acredita tratar-se de privilégio que torna as eleições injustas ao beneficiar cidadãos com mandato.
Wladimir Gramacho, doutor em ciência política e professor da Universidade de Brasília (UnB), diz que a vantagem existe para quem ocupa qualquer cargo, seja no Executivo ou Legislativo. No período pré-eleitoral, destaca Gramacho, os deputados tendem a se deslocar mais, para ficarem próximos das bases e reforçarem os cabos eleitorais.
O doutor em custos aplicados ao setor público e também docente da UnB Marilson Dantas destaca outro ponto: a necessidade de se aprimorar a transparência. “Tem que dar possibilidade para o cidadão comparar as informações de cada parlamentar. A própria gestão de custos do Poder Executivo pode gerar esse relatório. A obrigação está exposta nos artigos 50 da Lei de Responsabilidade Fiscal e 5º da Lei de Acesso à Informação“, concluiu.
O outro lado
Ao Metrópoles, os oito parlamentares que representam o DF na Câmara dos Deputados foram unânimes em ressaltar a necessidade da compra de combustíveis e lubrificantes para viabilizar o trabalho na Casa.