Uma moradora da Asa Norte acusa dois sargentos do Batalhão de Policiamento de Trânsito (BPTran) de abuso de autoridade. A abordagem à mulher de 55 anos ocorreu no início da madrugada do último dia 9, na CLN 308/309. Vídeos feitos por pessoas que estavam no local mostram os PMs tentando colocá-la à força dentro do cubículo da viatura. Como o compartimento continha cones, eles desistem e a acomodam no banco do carona.
Segundo relato dos próprios sargentos à Polícia Civil, ela foi detida por desacato à autoridade por estar “se metendo no trabalho dos policiais”. O Metrópoles conversou com a mulher que aparece nas imagens. Para não expô-la, será identificada nesta reportagem como Helena. O caso é apurado pela Corregedoria da PMDF e pelo Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT).
De acordo com Helena, ela havia descido do bloco onde mora para jogar um saco de lixo em um contêiner e notou uma discussão entre policiais e uma advogada parada em uma blitz da Lei Seca. Conforme relato da denunciante, os dois sargentos, identificados como Kleber Ferreira Cardoso e Milton Leite Sales, ficaram irritados com a recusa da defensora em soprar o bafômetro e começaram a gritar com ela.
“Fui falar com ela que aquele absurdo não poderia ficar impune e que ela deveria buscar seus direitos”, disse Helena à reportagem. A mulher conta que um dos PMs ouviu a conversa, se irritou, deu voz de prisão e aplicou um mata-leão. “Ele disse que eu estava sendo presa por estar desrespeitando o trabalho deles, mas eu nem dirigi a palavra a eles, estava conversando com a moça que havia sido parada na blitz.”
Ao pedir explicações sobre o motivo da detenção, Helena diz ter sido jogada no chão e teve os óculos retirados do rosto. “Não consigo enxergar nada além de vultos sem meus óculos. Me colocaram o rosto no asfalto e forçaram tanto o joelho nas minhas costas que me mijei na hora”, conta.
Ao sentir-se injustiçada e agredida, Helena começou a gritar por socorro. A fim de conseguir levá-la à delegacia, os PMs a algemaram. “Apertaram as algemas com muita força. Meus pulsos doíam tanto que chorava e pedia para que eles aliviassem a pressão, mas só riam e diziam que eu estava passando por aquilo para deixar de ser enxerida.”
Levada para a 5ª Delegacia de Polícia, Helena foi liberada após a advogada pivô da confusão descobrir seu paradeiro e apresentar os vídeos. “Ela se compadeceu com a situação e foi me procurar”, diz Helena.
Na unidade policial, a advogada apresentou sua versão e mostrou os vídeos da abordagem dos PMs à mulher. Na sequência, Helena foi liberada. “Foi a maior humilhação da minha vida. Nunca pensei que pudesse ser agredida por quem deveria me proteger”, desabafa.
Na tentativa de resistir à prisão que considera injusta, Helena teve uma torção no braço e precisou engessá-lo. Em fotos feitas após o episódio, ela apresenta hematomas em várias partes do corpo. “A dor física passa, mas a moral é eterna”.
Versão dos PMs e denúncia no MPDFT
Ainda na 5ª DP, o sargento Kleber Ferreira disse que realizava a blitz quando Helena começou a “se meter no trabalho dos policiais”, tendo sido advertida. Segundo eles, a mulher passou a ficar mais agressiva, dizendo que “policiais são todos filhos da puta”.
Kleber contou que, diante das ofensas, deu voz de prisão à mulher. “Todavia esta resistiu e começou a se debater, momento em que os policiais tiveram que usar a força necessária, chegando a ter que usar algemas”, explicou o PM na ocorrência.
Helena denunciou os dois policiais militares ao MPDFT. A Ouvidoria do órgão de controle remeteu a investigação para a Promotoria Militar “tendo em vista a gravidade da denúncia, com possível prática de crimes pelos agentes públicos, abuso de autoridade, maus-tratos, tortura, intimidação e perseguição”, destaca o Ministério Público local.
Testemunhas
A reportagem do Metrópoles foi à CLN 309, onde o BPTran realizou a blitz no último dia 9. Três pessoas que presenciaram a cena confirmaram a versão de Helena. “Eles [PMs] estavam extremamente exaltados, gritando o tempo todo”, contou uma testemunha, que pediu para não ser identificada.
A advogada parada na blitz e autora dos vídeos disse que os PMs “forjaram a justificativa de que foram vítimas de agressões verbais”. “Eles foram para cima dela após ela ter vindo em minha defesa. Quando perceberam que eu estava gravando, falaram em voz alta que ela os teria xingado, mas isso nunca ocorreu. Forjaram a justificativa para tais agressões”
Corregedoria apura
O chefe do Departamento de Comunicação Social da PMDF, tenente-coronel Evaldo Viera, informou que a Corregedoria da corporação recebeu a denúncia na terça-feira (26/2) e está na fase de colher elementos a fim de saber se haverá abertura de procedimento investigatório.
“A Corregedoria tem ido atrás de imagens e ouvindo testemunhas. O prazo de conclusão da apuração dependerá do tipo de procedimento a ser aberto”, afirma o oficial.