10/03/2019 às 13h25min - Atualizada em 10/03/2019 às 13h25min
A DEGRADAÇÃO DA POLÍTICA
A DEGRADAÇÃO DA POLÍTICA
A DEGRADAÇÃO DA POLÍTICA
A POLÍTCA desceu ao fundo do poço. Nos últimos tempos, parcela ponderável da representação popular caiu nas malhas da Operação Lava Jato. Sua imagem está em baixa. É verdade que temos um novo quadro parlamentar no Senado e na Câmara. Tradicionais nomes foram despejados das cúpulas côncava e convexa do Parlamento.
Persiste, porém, a dúvida: os novos nomes representam compromissos com uma nova política?
Os sinais não são animadores. A base do governo, em processo de formação, mostra que, sem participar da administração federal, não vai fi ncar pé em sua defesa. O dilema se impõe: como pode o país exibir melhorias nos níveis gerais de vida da população – taxas de escolaridade, distribuição de renda, Índice de Desenvolvimento Humano – quando a qualidade política deixa a desejar?
Norberto Bobbio lembra que o valor central da democracia representativa é o papel do “quem”: o parlamentar deve ser fi duciário e não um delegado; e, quanto ao “que” (fazer), o fi duciário deve representar demandas sociais e não interesses particulares. O titular de um mandato vincula-se ao eleitor, ao qual deve obedecer.
Entre nós, os ajuntamentos que consideram o mandato seu feudo se multiplicam. São esses que têm como foco cargos e espaços no governo, por entenderem o mandato como domínio pessoal. Grande parte desses tipos integra o que se chama de “baixo clero”, geralmente localizado nos fundões do plenário. Essa legião seria mais sensível a barganhas. Não se pretende dizer que os cardeais do “alto clero” são puros.
Dinarte Mariz, estrela do Senado nos tempos de chumbo, costumava dizer: “Todo homem tem seu preço e eu sei o preço de cada um”. O velho senador potiguar se referia ao indefectível traço do caráter político: o jogo de recompensas.
O rebaixamento do nível parlamentar se reforça com a substituição do paradigma clássico da democracia representativa pelo parâmetro de uma “democracia funcional”, formada para abrigar interesses de grupos especializados da sociedade pós-industrial.
Cientistas políticos, como o francês Maurice Duverger, chegam a definir a democracia de nosso tempo como “tecnodemocracia”, amparada em organizações complexas e nos conjuntos que integram um novo triângulo do poder, formado pelo sistema político, pela alta administração e pelos círculos de negócios. (A Operação Lava Jato fi sgou representantes dessa tríade).
Em democracias clássicas, os impactos desse modelo, apesar de fortes, não chegam a eliminar a missão dos partidos políticos. Mas em democracias incipientes, como a nossa, os efeitos se fazem sentir. A perda de força dos partidos abre espaço para a formação de bancadas temáticas, como as de grupos econômicos; profissionais liberais (médicos, advogados, etc); sindicalistas; religiosas; em defesa do armamento; funcionários públicos etc. Seu traço de união é o corporativismo. São os arquipélagos do oceano parlamentar.
(Leia texto completo na seção Artigos, no site
www.brasiliaagora.com.br)
GAUDÊNCIO TORQUATO, professor titular da USP e consultor político