O Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) rejeitou, nesta terça (9/4), a recomendação do Ministério Público de Contas (MPC-DF) de suspender a mudança do GDF para o Centro Administrativo (Centrad), prevista para ser iniciada na sexta-feira (12). A votação foi apertada, com desempate feito pela presidente da Corte de Contas, Anilcéia Machado. Apesar de negar pedido do MPC-DF, a Corte determinou ao GDF que explique, no prazo de três dias, como será feita a ocupação do complexo, em Taguatinga.
Embora tenha anunciado que a mudança começaria este mês, o GDF não explicou os termos do acordo com a concessionária que administra o Centrad nem se haveria economia de recursos ao erário. Tampouco foram informados os custos da operação e as condições em que os prédios estão atualmente para receber os funcionários.
Também não há estudos que mostrem como a alteração de endereço vai impactar moradores de regiões mais afastadas que precisam de serviços públicos hoje ofertados no Palácio do Buriti e no prédio anexo, a exemplo de Sobradinho e Planaltina, uma vez que a distância para Taguatinga é maior do que em relação ao Plano Piloto. Outra questão ainda não avaliada diz respeito às medidas a serem tomadas para mitigar os impactos no trânsito na área onde fica o Centrad.
A mudança havia sido questionada pelo procurador Demóstenes Tres de Albuquerque. O relator do caso, conselheiro Inácio Magalhães apresentou voto contrário à concessão da medida cautelar. Renato Rainha, Paulo Tadeu e Márcio Michel discordaram do relator e pediram a suspensão. Porém, os conselheiros Manoel de Andrade e Paiva Martins votaram com o relator, e a presidente do TCDF, Anilcéia Machado, desempatou.
Complexo não tem Habite-se
A decisão do TCDF deixa o caminho aberto para o governo iniciar a operação de mudança anunciada pelo governador Ibaneis Rocha (MDB), mesmo sem que os problemas jurídicos envolvendo o Centrad estejam sanados.
Um dos problemas é que, hoje, existem hoje 60 processos que tratam do tema, apontamentos do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e recursos do consórcio formado pela Via Engenharia e Odebrecht sem o desfecho em primeira ou segunda instância.
Entre os impedimentos, está a pendência do Habite-se, uma certidão que autoriza o início do uso ou ocupação efetiva de construções. Em 2 de abril, a promotora Raquel Tiveron afirmou ao Metrópoles que o Ministério Público vai agir em caso de ocupação irregular.
“O Habite-se está diretamente relacionado à segurança dos ocupantes do empreendimento. Além disso, a falta desse documento impede a averbação do imóvel no Cartório de Registro e a emissão de alvará de funcionamento”, disse.
A certidão apresentada pelo então governador Agnelo Queiroz (PT), à época da inauguração da obra – 31 de dezembro de 2014 –, acabou cassada no ano seguinte. A alegação do MPDFT, acatada pela Vara de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, foi a de que não houve o cumprimento de todos os pré-requisitos legais. Em abril de 2017, o juiz Carlos Frederico Maroja de Medeiros manteve a decisão.
Justificativas no TCDF
Mesmo com todas essas ressalvas, ao elaborar o voto, o conselheiro relator, Inácio Magalhães, entendeu não haver elemento concreto para a suspensão nesta terça (9). “Minha preocupação é conceder a cautelar com base apenas no que saiu na mídia. Neste momento, seria fazer juízo de valor e não dar uma oportunidade de o governador se explicar”, justificou.
Ele foi acompanhado pelos conselheiros Manoel de Andrade – que sugeriu a extensão do prazo a Ibaneis para cinco dias, sem sucesso – e José Roberto Paiva Martins.
Renato Rainha, Paulo Tadeu e Márcio Michel deram outros argumentos ao caso: “Imagine que em três dias o governo não se manifeste. Vamos voltar aqui na próxima terça-feira (16) para decidir isso de novo?”, interpelou Márcio Michel. Ele sugeriu ainda que o GDF se abstivesse de assinar qualquer contrato sobre a ocupação do Centrad até uma avaliação da Corte.
Paulo Tadeu demonstrou preocupação com a possibilidade de o TJDFT interferir nas decisões do TCDF. “Assinado o contrato, sabemos o limite deste tribunal de atuar no processo. Sempre procuramos construir redações para evitar que o Judiciário entenda que passamos das nossas competências legais”, argumentou.
Com o 3 a 3 formado no placar, Anilceia Machado deu o voto de Minerva acompanhando do relator.
Cofres públicos
Na representação feita pelo MPC para pedir a suspensão da mudança para o Centrad, o procurador Demóstenes Tres de Albuquerque alegou que não havia garantia de que a mudança seja vantajosa para o poder público. Ele argumentou que não houve planejamento para a transferência.
A transferência, lembra ele, passa por contratos logísticos, pontos de energia, água, internet, ar-condicionado, além de mobiliário e divisórias. Segundo Demóstenes, o GDF não sabe quanto vai custar efetivamente a troca de sede.
O documento foi protocolado após o GDF anunciar data para a ocupação do prédio, que fica em Taguatinga. “A se confirmar a informação revelada pela imprensa e pelo próprio governo, estar-se-á diante de violação ao princípio da economicidade, em razão da patente inexistência de planejamento para a realização da mudança. Impossível estabelecer, diante das informações disponíveis, vantagem de qualquer natureza, notadamente econômica, com a mudança ocorrendo em espaço de tempo tão diminuto e, claramente, sem planejamento”, disse o procurador.
De acordo com Demóstenes, ao assumir o imóvel, “altíssimos custos serão devidos ao consórcio, tal como previsto em contrato, ao valor aproximado de R$ 23 milhões mensais, por 22 anos, além dos já mencionados gastos com infraestrutura e mobiliário”. “Assim, poderá ocorrer substancial prejuízo aos cofres do DF que, como é fato notório, não passa por situação financeira confortável”, assinalou.
Nulidade do contrato
Outro entrave para a transferência do Buriti a Taguatinga, desta vez remanescente da gestão Rodrigo Rollemberg (PSB), é o pedido de nulidade do contrato com o consórcio (de 2017) feito pela Procuradoria-Geral do Distrito Federal, que observa o viés jurídico dos assuntos de interesse do Distrito Federal.
O argumento da PGDF ao ingressar com a Ação Civil Pública de Declaração de Nulidade e Ineficácia da Cláusula Arbitral é a de que se trata de “vício insanável já no nascedouro da avença entre as partes”, “questão de corrupção massiva”.
A peça baseia-se em delações premiadas do alto escalão da Odebrecht na Lava Jato. As denúncias foram de fraudes e pagamento de propina durante a construção do Centrad.
“O contrato não foi respeitado pela concessionária responsável pelo Centrad, sendo aplicável a execução dos termos não cumpridos, pois os prédios jamais tiveram condições de abrigar órgãos públicos do DF, além de ter incorrido clara nulidade da licitação e do contrato por conta de confessada corrupção perpetrada pela Odebrecht, que teve participação da Via Engenharia”, diz trecho do documento produzido pela Procuradoria-Geral do DF.
O caso é investigado pelo Ministério Público Federal (MPF), que, em resposta à reportagem, disse não comentar apurações em curso.