Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) decidiu rever os pagamentos de aposentadorias por invalidez e auxílio-doença distribuídos em 2019. A medida, segundo o órgão, objetiva identificar irregularidades nos benefícios concedidos em todo o país. Em decorrência do pente-fino, 806 mil pessoas que estavam com processos paralisados há mais de 45 dias foram impossibilitadas de sacar o dinheiro dos seguros.
A força-tarefa, no entanto, atingiu também beneficiários que garantem estar em dia e regularizados junto à Previdência Social. No Distrito Federal, 336 mil cidadãos dependem do benefício pago pelo órgão. O INSS não informou quantos brasilienses tiveram o fornecimento interrompido.
Um dos segurados prejudicados foi Lee Brandon (foto em destaque), de 26 anos. É com um salário mínimo que recebe do instituto que o jovem consegue financiar seus gastos com alimentação, luz, água e aluguel da casa onde mora, no Sol Nascente, em Ceilândia. Diagnosticado ainda criança com disostose cleidocraniana e esclerose lateral amiotrófica, o rapaz foi impossibilitado de trabalhar, pois as doenças genéticas não o permitem fazer esforço. Em decorrência dos problemas de saúde, aposentou-se por invalidez.
O pouco dinheiro que ganhava da aposentadoria possibilitava seu sustento. Em junho deste ano, quando tentou sacar o valor, notou que a quantia constava em sua conta, mas não conseguia retirar o seguro. “Achei que era um problema do banco. No primeiro dia, não consegui sacar. Voltei no dia seguinte e no outro, e continuava do mesmo jeito, bloqueado. Fiz duas provas de vida no banco e nada”, relata.
De acordo com ele, o bloqueio por suspeita de fraude ocorreu sem que ele fosse notificado ou avisado previamente. Só quando ligou para o telefone 135, da Previdência Social, que descobriu e tomou conhecimento do erro no sistema. Lee foi uma das 806 mil pessoas que tiveram o benefício bloqueado.
Para tentar reaver o direito, recorreu a postos da Previdência Social em busca de explicações, mas sem sucesso. Nas unidades, segundo conta, servidores não explicaram o que era preciso ser feito para realizar o desbloqueio do dinheiro e repetiram o mesmo discurso: “O anúncio [dos bloqueios por suspeita de fraude] foi nacionalmente transmitido em todos os canais e emissoras de televisão: se você não viu, nada podemos fazer aqui”.
Lee realmente não assistiu a transmissão veiculada em horário nobre da TV brasileira, mas explica o motivo: “Para quem recebe um salário mínimo todo mês, comprar televisão é luxo”. A falta de informações o fez peregrinar pelos postos da Previdência e, em todas as oportunidades, saiu de mãos abanando, sem que o problema fosse resolvido.
“Cada vez que ia em algum lugar diferente a atendente me dizia que um documento estava faltando, mas no próprio site do INSS diz que só é preciso levar RG, CPF e comprovante de residência”
Desinformado e desesperado, procurou respostas em outro órgão: o Centro de Referência de Assistência Social (Cras). “No Cras, me disseram ser preciso realizar um cadastro e me deram até o dia 30 deste mês para fazer, mas no site diz que as novas vagas serão abertas em 1º de agosto, depois do prazo que me forneceram”, explica.
Em função do impasse, Lee não recebeu dinheiro algum no mês de julho. Sem a remuneração, tem contado com a solidariedade de amigos e faz “bicos” para pagar as contas. “Eles [amigos] têm me ajudado. Eu também trabalho na noite como drag queen, faço maquiagem, dou aula como instrutor de dança e de capoeira. Faço de tudo. O dinheiro desses outros trabalhos não vai dar para quitar as contas, mas está dando para comer, pelo menos”, lamenta o aposentado.
Assim como Lee, a baiana de Porto Seguro Vanuza Cruz da Silva foi outra a ter o benefício suspenso. Hoje com 47 anos, a segurada desembarcou na capital do país ainda jovem em busca de tratamento para a doença que debilitou o movimento de suas pernas: a síndrome poliomielite. Apesar de diagnosticada com a anomalia que provoca a paralisia gradual dos membros inferiores, Vanuza se arriscou trabalhando como servidora pública do Serviço de Limpeza Urbana do DF (SLU).
No entanto, por recomendação médica, precisou se aposentar. “Não queria, sabia que iria ganhar pouco, além do fato de que é muito difícil para nós deficientes conseguirmos um emprego. A aposentadoria é meu direito. Não trabalhei muito porque a doença não me permitiu, mas trabalhei".