09/09/2019 às 06h26min - Atualizada em 09/09/2019 às 06h26min

Deputado Luis Miranda, alvo de chantagem, é acusado de aplicar golpes

Em matéria do Fantástico, investidores o acusam de fraude. Parlamentar foi procurado por homem que dizia ter poder para barrar a reportagem

rês dias após o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) protagonizar ação na qual a Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) prendeu um homem que o extorquia, o parlamentar voltou ao noticiário. Em reportagem do programa Fantástico, da Rede Globo, veiculada na noite deste domingo (08/09/2019), o congressista é acusado de aplicar uma série de golpes para lesar investidores. A matéria televisiva seria justamente o pivô da chantagem sofrida por Miranda que levou à prisão Daniel Luís Mogendorff, 35 anos, na noite de quinta-feira (05/09/2019).

Conforme revelou o Metrópoles, Mogendorff, que tem passaporte alemão e mora em Israel, vinha mantendo contato com o parlamentar há pelo menos um mês. Nas conversas, ele exigia R$ 760 mil em troca da promessa de cessar publicações produzidas por um grupo de youtubers que atacava o político do DF nas redes sociais. O valor, segundo, o chantagista, também serviria para barrar uma reportagem no Fantástico, uma vez que ele alegava ter influência sobre a equipe da atração dominical.

Até então, não se sabia o teor da matéria. Contudo, a denúncia publicada no Fantástico mostra uma série de vídeos nos quais o parlamentar, que era empresário e morava em Miami (EUA) na época da campanha de 2018, prometia rendimentos astronômicos, sem esforço, a seus seguidores nas redes sociais.

Testemunhas contaram, em depoimento ao Fantástico, ter perdido milhares de reais. O programa conversou com 25 pessoas. Um dos entrevistados contabiliza prejuízo de R$ 150 mil. “Minha surpresa é que, de tudo que ele prometeu, nada aconteceu”, diz o homem.

Uma das aplicações dadas como certas por Luis Miranda em vídeos no YouTube era no sistema de Tax Lien, uma espécie de certificado de penhor em condados dos Estados Unidos.

Em outros vídeos, ele pede investidores para serem sócios dele em fundos de investimentos e negócios de compra e venda de carros. Ele ainda vendia cursos on-line para ensinar as pessoas a ganharem dinheiro.

Nas gravações, ele dizia que um investimento de US$ 5 mil poderia ter rendimentos entre 18% e 24%, dependendo da região, ou até mesmo resultar na aquisição de um imóvel. Há, ainda, postagens nas quais ele apresenta maneiras de lucrar 100% “sem sair de casa”: “Isso sim é negócio, gente”, diz o deputado.

Um ex-funcionário de Luis Miranda o acusou, na reportagem do Fantástico, de ter maquiado números para lesar investidores. Segundo o homem, o hoje deputado ficava com o dinheiro alheio para bancar um estilo de “vida luxuoso”.

O parlamentar ficou sabendo da reportagem há cerca de 40 dias e alegou sofrer chantagem para que a publicação não ocorresse. Ao Metrópoles, o deputado Luis Miranda se diz vítima de perseguição e negou ter lesado os investidores.

Segundo o congressista, ele mantinha um negócio de locação de veículos nos Estados Unidos e os denunciantes querem prejudicá-lo. Em um dos casos, afirmou, a denunciante “locou um carro por um mês, mas como a família queria voltar ao Brasil, generosamente cancelei o aluguel sem multa e devolvi o dinheiro”.

Sobre o ex-funcionário que também o denunciou, o deputado também alegou que se trata de uma tentativa de ferir a imagem dele. Segundo Luis Miranda, ele realizou um boletim de ocorrência contra o rapaz pelo furto de US$ 300 mil da empresa do parlamentar nos Estados Unidos “no momento em que somente ele tinha a chave e eu já estava aqui no Brasil”..

 

A operação policial

Em uma ação conjunta com a Polícia Civil, Luis Miranda denunciou uma quadrilha responsável por extorsões. A operação levou à prisão Daniel Mogendorff. Ele foi detido em flagrante na noite de quinta-feira (05/09/2019) em um hotel no centro de Brasília depois de ser gravado com câmeras escondidas acopladas às roupas de Miranda.

Um dos pontos que configurou a chantagem, segundo entendimento dos investigadores, foi o momento em que o suspeito disse que conseguiria evitar a publicação de matéria na atração da Rede Globo. “Se você tem vontade de tirar isso do Fantástico, a gente faz. Já tá tudo no pente”, afirma Mogendorff.

O suspeito chegou a propor que Miranda pagasse os R$ 760 mil em duas vezes: R$ 400 mil seriam em razão da suposta retirada de matéria da pauta do Fantástico e o restante para o homem remover do YouTube vídeos com ofensas ao parlamentar e evitar que outros fossem a público.

Os vídeos gravados com câmeras escondidas na roupa de Miranda, aos quais o Metrópoles teve acesso, mostram o teor da conversa mantida entre o homem e o congressista. O aparato que produziu o flagrante foi montado pela Delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos (DRCC), da PCDF. Foi com esse aparelho também que ficou registrada a conversa na qual Mogendorff se gaba de ter poderes para fazer imagens desaparecerem da internet.

Na conversa, mantida no restaurante Coco Bambu do Lago Sul, bairro mais nobre da cidade, os dois negociam valores que seriam usados no sentido de proteger Miranda contra as acusações. Tudo monitorado por 20 agentes à paisana.

Assista:

Leia abaixo a transcrição do trecho gravado com equipamentos da polícia:

Daniel Mogendorff : Qual é a minha ideia? Só pra você entender meu raciocínio. Se você tem vontade de tirar isso aí do Fantástico, a gente faz. Já tá tudo no pente, o Danilo tá esperando dá o ok. Entra amanhã de manhã e à tarde passa pra outro, que, por sinal, é Lauri também.

Luis Miranda: O nome do cara da Globo se chama Lauri?

Daniel Mogendorff : Você sabia?

Luis Miranda: Não, pô. Eu tô trabalhando igual um cachorro como deputado. Não tenho tempo para essas coisas, não.

O deputado, sabendo que estava sendo monitorado pelos policiais, faz uma pergunta incisiva ao seu interlocutor:

Luis Miranda: No passo a passo. Fantástico, se eu quiser, a gente consegue melhorar aquele valor [de R$ 400 mil]?

Daniel Mogendorff : Eu não estou ganhando um centavo por isso.

Luis Miranda: É R$ 400 mil se eu não quiser que a matéria vá ao ar?

Daniel Mogendorff : É. Por isso que eu te falo. Eu acho que esse valor… você não precisa gastar, é uma opinião. Agora, se você fala, ‘Daniel, é minha vontade…’

Luis Miranda: Eu não quero. A matéria é uma mentira, você sabe que é uma mentira. Você construiu essa mentira sobre minha pessoa.

Daniel Mogendorff : Mas isso aí, é como a questão que te falei. É bom pra gente…

Luis Miranda: Uma mentira? Por quê? Depois eu vou processar o Fantástico?

Daniel Mogendorff : Não. Primeiro, a liminar [incompreensível] e eles vão respeitar, porque a Globo respeita, você sabe disso.

Whindersson Nunes

No mesmo diálogo, Mogendorff também diz ser o responsável pela invasão do Instagram da cantora Luísa Sonza no início de fevereiro. Em vídeo gravado com câmeras escondidas, o possível chantagista afirmou ter cobrado do marido de Luísa, o youtuber e comediante Whindersson Nunes, US$ 90 mil para que uma foto dela nua “desaparecesse” das redes.

À época, em fevereiro deste ano, a cantora afirmou que uma imagem dela nua tinha sido enviada ao marido, para “matar a saudade”, porém algum criminoso havia invadido seu celular e postado a foto. “Me hackearam”, afirmou a cantora.

Leia trecho do diálogo entre Mogendorff e Miranda:

Daniel Mogendorff : Sabe quanto o Whindersson [Nunes] me pagou para sumir a foto nua da mulher dele? Cê viu que abafou? Cê viu que sumiu?

Luis Miranda: Quanto?

Daniel Mogendorff : 90 mil dólares. E cada caso é um caso. Porque você solta uma ou outra idiotice, só que você tem que saber soltar no momento certo, na hora certa, na competitividade certa. Entendeu? Eu sei fazer.

Luis Miranda: O do Whinderson Nunes foi seu grupo que fez também?

Daniel Mogendorff : Foi.

Outro lado

Por telefone, o Metrópoles entrou em contato com a Rede Globo. Uma funcionária da emissora orientou a reportagem a enviar a demanda para a ouvidoria da empresa. O Metrópoles também procurou um produtor do Fantástico, mas ele não quis dar nenhuma declaração e pediu para que as perguntas fossem encaminhadas aos advogados da Globo. Até a última atualização deste texto, a emissora de TV não havia respondido.

Já preso e em depoimento aos investigadores, Daniel Mogendorff negou o crime de extorsão e alegou que o dinheiro ao qual se referia no encontro com o deputado seria usado para a contratação de advogados. Os defensores, segundo Mogendorff , entrariam com liminar na Justiça para “tentar evitar” publicação de matéria contra o deputado.

Procuradas pela reportagem na tarde de sábado (07/09/2019), a assessoria de Whindersson Nunes não havia retornado o contato até a última atualização deste texto.


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