10/11/2019 às 06h32min - Atualizada em 10/11/2019 às 06h32min

O bolo preparado pelo Supremo Tribunal Federal

A tese marota para que haja a prisão imediata apenas para condenados de crime contra a vida não se sustenta de pé, quando se verifica que a corrupção, como bem lembrou o ministro Barroso em seu voto a favor da prisão em segunda instância: “É um crime violento. Mata na fila do SUS, na falta de leitos, na falta de medicamentos. Mata nas estradas sem manutenção adequada. O fato de o corrupto não ver nos olhos as vítimas que provoca, não o torna menos perigoso”.

Depois do bolo assado é que se pode saber se a receita estava correta. Assim também vale para a decisão final dada pelo Supremo Tribunal Federal, acabando com a prisão em segunda instância. Os desdobramentos práticos dessa decisão, com a possibilidade de abertura dos presídios e soltura de detentos, incluindo nesse bolo os mais importantes protagonistas dos megaescândalos de corrupção, darão o exato alcance dessa medida.


Em 2014, o ex-ministro Joaquim Barbosa, pouco antes de sua saída do STF, motivada, entre outras razões, pela sequência de ameaças que vinha sofrendo, previa que, num futuro não muito distante daquele ano, no qual muitos mensaleiros de alto coturno foram condenados, haveria a formação de uma maioria de ocasião dentro da Corte para, obviamente, promover retrocessos e manter o antigo status quo. Como bem observado também por colunistas políticos de todo o país, todo esse julgamento, por mais que os ministros tenham dissimulado, tinha um objetivo preciso e oculto, traduzido no fim da Lava-Jato para a soltura oficial de Lula, sob a bênção da própria Justiça que o havia condenado.


Não se pode negar de forma alguma, que nunca antes o bordão “nós contra eles” fez tanto sentido. De fato, a sociedade se mostra claramente dividida sobre essa decisão anacrônica. Uma das questões que se coloca agora é como retroagir todo um país no tempo. Na verdade, o que foi feito com a aprovação da medida, equivale, numa imagem, a retirar a escada do pintor, simbolizado pela Justiça, deixando-o suspenso no ar, seguro apenas pela broxa. A tal da insegurança jurídica, potencializada pela aprovação da Lei contra o Abuso de Autoridade pelo Congresso e, de certa forma, alimentada também pela possibilidade de os políticos utilizarem as verbas bilionárias do fundo partidário para o pagamento de advogados de defesa, é hoje um fator a depor contra a própria Justiça em favorecimento direto aos fora da lei.

 

Com isso, volta a se organizar a contrarreforma, de olho no passado. Impossível para um observador isento, mesmo dotado do mais alto grau de conhecimento jurídico, não reconhecer que essa decisão, por seu peso político específico, dentro do atual cenário do país, não tenha sido orientada, desde o começo, por viés claramente político.


Os pretensos abusos da Operação Lava-Jato, apontados como desculpa para a marcha à ré na lei, colocam um ponto de interrogação de difícil resposta. A indiferença desse alto tribunal às pesquisas de opinião pública, que apontavam inconteste preferência nacional pela prisão em segunda instância, contrasta abertamente com o fato de que toda a discussão, desde o primeiro dia, foi amplamente contaminada e absorvida pela assombração do chefão petista preso.


A tese marota para que haja a prisão imediata apenas para condenados de crime contra a vida não se sustenta de pé, quando se verifica que a corrupção, como bem lembrou o ministro Barroso em seu voto a favor da prisão em segunda instância: “É um crime violento. Mata na fila do SUS, na falta de leitos, na falta de medicamentos. Mata nas estradas sem manutenção adequada. O fato de o corrupto não ver nos olhos as vítimas que provoca, não o torna menos perigoso”. Por enquanto, melhor ficar apenas de olho no bolo saído do forno, desconfiar, sem levá-lo à boca.


A frase que não foi pronunciada

“Engraçado. Não estou revoltado. Estou morrendo de vergonha do meu país. Aqui, o certo é errado e o errado é certo. Já nem sei mais como educar meus filhos. Resumindo é isso. Brasil: seja corrupto ou deixe-o.”
Conversa no banco da frente de um ônibus que parou perto do STF


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