17/07/2020 às 08h35min - Atualizada em 17/07/2020 às 08h35min

Acidente e famílias destruídas: Isabele morreu após queda de arma da mão

Adolescente estava indo guardar armas do pai quando se atrapalhou, diz advogado de defesa

O LIVRE
Era por volta das 22h30 do último domingo (12/7) quando Isabele Guimarães Ramos, de 14 anos, foi atingida acidentalmente por um tiro no rosto, que atravessou seu nariz e saiu pela parte de trás da cabeça.
 

LIVRE conversou com o advogado da adolescente, Rodrigo Pouso, que contou como tudo aconteceu e como está a menina diante da dupla dor: a perda da melhor amiga e seu nome na mídia acusada de tirar a vida de alguém que ela amava.

Tragédia

“Foi um acidente, não foi ela manusear a arma. Ela não estava mostrando para ninguém, ela não estava brincando com a arma, como saiu na mídia. Essa arma estava dentro de uma case, a maleta que guarda a arma”, começou a contar o advogado.

Segundo Rodrigo, o pai da adolescente, o empresário Marcelo Martins Cestari, 46 anos, pediu que a filha guardasse uma maleta, onde estavam duas armas, no quarto dele.

A adolescente pegou a maleta e foi em direção ao quarto do pai. No caminho, porém, parou em seu quarto, onde a amiga Isabele estava no banheiro, e bateu na porta a chamando pelo apelido, “Bel”. Nesse momento, a maleta caiu.

Uma das armas saiu da maleta. A adolescente pegou a maleta com uma mão e se abaixou para pegar a arma que caiu com a outra.

Enquanto tentava equilibrar a maleta com uma mão, a menina encostou a maleta no peito e usou a outra mão para pegar a arma caída, para guardar na maleta.

“A Isabele estava na frente, abriu a porta, saiu do banheiro e estava na frente. Aí a arma disparou”, relatou Rodrigo.

“Ela estava colocando a arma na maleta, a que estava na mão. Elas são da mesma altura, ela estava com a maleta no peito, colocando, porque a maleta estava caindo, porque estava meio bamba. Ela se perdeu nisso de colocar a arma, enquanto segurava a maleta com a outra mão, e acabou disparando a arma e acertou a amiga. Mas não estava brincando, não estava apontando”, garantiu.

O pai da adolescente ligou imediatamente para o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e foi orientado a prestar os primeiros-socorros a Isabele. Depois, o próprio Samu tentou reanimá-la. Mas, segundo o advogado, onde a adolescente caiu com o tiro, permaneceu, não foi retirada do local.

Isabele morreu ainda no local do acidente

Arrasada

Rodrigo Pouso descreveu que sua cliente está “destruída”. As duas adolescentes eram melhores amigas há cerca de quatro anos, viviam na casa uma da outra, sempre se falando no celular quando não estavam juntas, com foto uma da outra no celular, tinham-se como irmãs.

“E aí as matérias saem ‘menina mata’, não tem menina mata, foi sem querer, não tem dolo nenhum, não tem vontade. Foi acidente. ‘Menina atira’, não atirou, a arma disparou, não estava apontando, atirar é quando você aponta”, disse o advogado.

Ele disse que, até então, as famílias não tinham rivalidade alguma, pelo contrário: as meninas eram muito unidas e era um domingo normal, com todos em casa, fazendo comida.

Investigação

Nesse terça-feira (14), a adolescente e o pai prestaram depoimento na Delegacia Especializada de Homicídio e Proteção à Pessoa (DHPP) por oito horas.

O advogado da família fez questão de dizer que a história divulgada na mídia, de que a arma do crime teria sido retirada do local, é falsa.

“A perícia chegou, lacrou o local. O delegado de polícia estava lá, eu entreguei a arma na mão dele. Ele pegou a arma, abriu, verificou, desmuniciou a arma. O local não foi mexido”, relatou.

Na casa foram apreendidas sete armas. Uma em nome do pai da adolescente que segurava a arma do acidente, quatro em processo de emissão de documentação junto ao Exército Brasileiro e duas em nome de outra pessoa, que estavam na casa porque o dono da residência as estava comprando.

A arma que disparou é uma das que estava em processo de compra. Por isso, segundo o advogado, o empresário Marcelo Martins Cestari foi detido por posse ilegal de arma de fogo de uso permitido. Ele, no entanto, pagou fiança e foi liberado.

“Ele estava vendo para comprar. O certo era ter passado para o nome dele. Mas ninguém fala que vai comprar e já passa. É igual comprar um carro. A pessoa fala: ‘Dá uma volta no meu carro’. Ai você fala: ‘ah ta, gostei’, ‘agora me dá o dinheiro que eu transfiro’. Por isso que a arma estava lá e foi apreendida por isso, não estava no endereço correto, mas a polícia vai devolver as armas”, afirmou Rodrigo.

Aulas de tiro

Sobre a adolescente fazer aulas de tiro, como confirmado pela Federação de Tiro de Mato Grosso (FTMT) e também pelo advogado, Rodrigo disse que isso não impede o acidente, visto que ela não estava brincando com a arma e não imaginava que esta estava municiada.

“Se ela estivesse brincando, ela sabe desmuniciar, apesar de ter só três meses de aula, mas ta bom, vamos dizer que é atiradora, então ela ia saber desmuniciar, mas ela não teve tempo pra ver isso aí. A arma caiu e ela se embananou. Se ela pegasse pra atirar, pra treinar, ela ia ver que a arma estava carregada. Não teve isso, é uma arma que caiu e abriu. E deu toda essa tragédia. Ela ser atiradora não interfere em nada. Ela não estava treinando, ela não estava mexendo, não foram pra treinar”.

A arma estar municiada, inclusive, é o grande erro, na visão do advogado, visto que todo atirador é consciente de que não se pode guardar uma arma municiada.

“Tem que apurar a responsabilidade de quem deixou essa arma municiada, essa é a questão. Eu sou atirador esportivo também, a arma que está com case aqui em casa, você pode ter certeza que está desmuniciada, porque você só guarda a arma desmuniciada. Então quando ela pegou e o pai dela também, quando falou pra ela guardar a arma, na cabeça dele estava desmuniciada, estava guardada na case. É uma regra, uma norma, você só guarda a arma desmuniciada. Durante o processo o delegado de polícia vai buscar isso. Estão colocando ela como autora, mas não é isso, foi acidente, não tem como imputar a ela dolo”, afirmou.

O advogado da família Cestari, Rodrigo Pouso

Família pede Justiça

O pai da adolescente que segurava a arma no momento do crime, o empresário Marcelo Martins Cestari, que havia sido preso por posse ilegal de arma de fogo de uso permitido, foi liberado após pagar fiança de R$ 1 mil. A pedido da família de Isabele, no entanto, o Ministério Público Estadual entrou com pedido na Justiça pedindo que o valor mudasse para R$ 1 milhão.

No pedido, o MPE se manifestou primeiro contra o fato de Marcelo não ter sido indiciado por homicídio “doloso”, visto que a arma era de sua responsabilidade e ele permitiu que a adolescente a manuseasse dentro de sua casa.

Depois, contra a fiança arbitrada, quando comparada ao poder aquisitivo da família Cestari, que possuiria bens como aeronave, carro importado, mora em condomínio de luxo e sociedade em uma empresa avaliada em R$ 10 milhões.

Além disso, o MP pediu que sejam juntadas as descrições de todas as armas apreendidas e que o empresário Marcelo Cestari responda por homicídio doloso.


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