Bezerra é idealizador e fundador da Patrulha da Paz, organização missionária que recorre a aparatos muito parecidos – não idênticos – ao de forças policiais com o objetivo de abordar pessoas em situação de rua no Distrito Federal.
O formato do projeto chamou a atenção da própria comunidade evangélica e até mesmo de autoridades, que questionam a legitimidade da ação social. E levou a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa (CLDF) e até o Conselho de Pastores Evangélicos (Copev-DF) a cobrarem explicações oficiais sobre a metodologia adotada.
Contudo, em entrevista ao Metrópoles, o pastor afirmou que o método usado é uma forma de chamar a atenção de pessoas vulneráveis para a seriedade da abordagem. “Quando nos apresentamos, já fica demonstrado que temos uma organização, que temos responsabilidade com esse trabalho”, disse.
De fato, quem não conhece e observa as “operações”, as quais envolvem até quatro “viaturas” paramentadas, veículos da marca Blazer devidamente adesivados com o nome do projeto e ainda com as rotolights acesas, chega a concluir se tratar de uma ação policial enérgica.
Entretanto, o pastor explica que, na verdade, é um pelotão para levar “a palavra de Deus” a quem precisa encontrar um caminho. “Nós temos apenas um comandante: é Deus”, frisa.
Atualmente com a iniciativa conta com o apoio de 40 voluntários. O fundador da Patrulha da Paz garante não estar em conflito com a lei por recorrer à aparência das forças de segurança para realizar um trabalho com objetivo classificado como nobre.
“Estamos nos preparando para pedir ajuda financeira ao governo local e aos deputados distritais para continuarmos tocando o projeto. Se as autoridades acharem por bem que a gente deixe de usar nossos uniformes de trabalho, a gente deixará. Mas nunca estivemos fora da lei”, destaca Gilmar Bezerra.
As inegáveis semelhanças aos “camburões” e aos uniformes dos grupos de operações táticas da Polícia Militar nem de longe, afirma Gilmar, têm a intenção de coagir as pessoas menos esclarecidas.
“Nunca fizemos o uso de comparação com a polícia. No nosso carro está escrito o nome do nosso projeto. Todos os moradores de rua já conhecem os paramentos das forças policiais, que são diferentes dos nossos. Nosso nome diz: somos da paz”, garante.
Quer saber? Nunca fomos confundidos com policiais e isso é muito simples: na hora em que nos apresentamos, a primeira coisa que falamos é boa noite. Quando há o trabalho de repreensão, como é feito pela polícia, não há de se falar em abordagem gentil. Nosso trabalho é diferente, é social.
PASTOR GILMAR BEZERRA, IDEALIZADOR E FUNDADOR DA PATRULHA DA PAZ
Aos 45 anos, o brasiliense diz desenvolver atividades na região periférica de Ceilândia desde 2011, mas apenas no ano seguinte surgiu a ideia de registrar o trabalho e fazê-lo ser oficialmente reconhecido.
“Fizemos o nosso registro apenas em 2014, quando pensamos em estabelecer o uso de uniformes e de carros devidamente identificados. Essa ideia surgiu de mim mesmo e de outros quatro irmãos de igreja”, explicou.
Fundador e seguidor do Ministério A Promessa de Deus, igreja sediada no mesmo local da Patrulha da Paz – o condomínio Privê, em Ceilândia –, o pastor desmente a internação clínica de dependentes químicos como desculpa para a evangelização. Também reafirma que não há coação e que a maior preocupação é com a saúde e acolhimento das pessoas em situação de rua.
“O nosso trabalho nas ruas é o de levar a palavra de Deus, mas sempre evangelizando. Ninguém é internado de forma compulsória, nem temos poder para isso. O que fazemos e mostrar que existe um outro mundo para as pessoas em situação de rua. Se eles aceitam, a gente faz uma triagem, custeia exames e direciona para uma instituição com o perfil adequado”.
Segundo Gilmar Bezerra, atualmente, a Patrulha da Paz encaminha os abordados para até seis clínicas diferentes, algumas até na região do Entorno do Distrito Federal.
“Um dos nossos operários morava na rua, dentro de um buraco. Era usuário de entorpecentes e hoje é um de nossos evangelistas da Casa de Deus. Um outro, chamado Roger, passou por tratamento de desintoxicação e está conosco também. São histórias que foram mudadas graças a esse trabalho social”, conta.
Mas nem todas as histórias têm final feliz: “Há pacientes que ficam dois meses e não voltam a usar drogas. Mas há também aqueles que concluem o tratamento e acabam voltando para as ruas, pela falta de estabilidade familiar. Essa questão influencia muito e acaba levando eles de volta ao vício”. Ele calcula que, diariamente, uma pessoa é acolhida e entregue ao tratamento contra os vícios.