10/09/2020 às 06h07min - Atualizada em 10/09/2020 às 06h07min

CGU aponta prejuízo milionário e falta de comida para estudantes entre 2017 e 2019

Relatório da União mostra prejuízo efetivo ao erário de R$ 4,3 milhões devido a contratos do DF mal executados e com falhas na gestão

Caio Barbieri
METRÓPOLES

Os problemas no fornecimento da alimentação para estudantes de escolas públicas no Distrito Federal vão além das suspeitas de conluio com empresários para fraudar licitações, que levaram a Polícia Civil a cumprir 26 mandados em órgãos públicos, residências de servidores, ex-servidores e particulares, nessa quarta-feira (9/9).

Relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) mostra que entre 2017 e 2019 houve prejuízo efetivo ao erário de R$ 4,3 milhões devido a contratos mal executados e com falhas na gestão, bem como por desorganização administrativa. O documento ajudou a subsidiar a Operação Fames – 2ª Fase e a Operação Self-Service, deflagradas pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), por meio da Divisão Especial de Repressão à Corrupção (Decor/Cecor), em conjunto com o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT).

Além disso, ainda conforme a CGU, contrato com a Secretaria de Educação do DF (SEEDF), pago com recursos públicos federais transferidos ao Governo do Distrito Federal como parte do 6º Ciclo do Programa de Fiscalização de Entes Federativos (FEF), tem sobrepreço de gêneros alimentícios nos Pregões Eletrônicos (SRP) promovidos estimado em R$ 11.156.979,68.

Os prejudicados, segundo o relatório, foram as 680 instituições educacionais públicas de ensino do DF e mais de 400 mil alunos.

Conforme a CGU apurou em campo, entre 19 e 23 de agosto de 2019, fragilidades na gestão do programa e precária execução impactaram diretamente na qualidade da merenda e no desenvolvimento dos alunos da rede pública de ensino distrital.

Houve atrasos significativos no fornecimento da merenda e até mesmo falta de alguns alimentos. Diversas reportagens do Metrópoles, baseadas em denúncias, mostraram a falta de proteína no prato dos estudantes da educação básica ou a escassez de produtos básicos, que fizeram crianças, em alguns casos, terem somente pipoca para comer.

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Problemas na gestão dos recursos federais

De acordo com a CGU, os processos licitatórios da Secretaria de Educação do DF para aquisição de gêneros alimentícios (perecíveis e não perecíveis) iniciaram-se sem qualquer informação prévia a respeito do procedimento para escolha dos itens que integram a Alimentação Escolar do respectivo ano letivo.

Segundo o relatório, não fica esclarecido como foi definido o gênero alimentício a ser comprado, nem o custo benefício das especificações. Por exemplo, a canjica crua “in natura” é encontrada comumente em supermercados em pacotes de 500g e ofertada por diversas marcas. A especificação da pasta era de pacote de canjica pré-cozida, entre 3kg e 3,5kg.

Outro exemplo é a carne suína “in natura” em vez de Carne Suína – Paleta em cubos, com tamanho aproximadamente de 3cm x 3cm x 3cm.

“Ou seja, os processos não mostram como foram tomadas decisões para escolha dos itens a serem adquiridos e respectiva definição das especificações técnicas, uma vez que já iniciam com o pedido de gêneros alimentícios específicos com respectivas especificações técnicas”, diz o relatório da CGU, concluído em março deste ano.

Após citar diversos alimentos, a controladoria concluiu que as especificações exigem, injustificadamente, especificações que acabam por prejudicar a competitividade do certame. “As especificações foram consideradas aceitas pela SEEDF em produtos fornecidos pela empresa Juno Veloso Vidal dos Santos, a qual mantém contratos com o Governo do Distrito Federal desde 2001”, destaca o texto.

Confira parte do documento:

REPRODUÇÃO
Relatório CGU sobre merenda escolar

Relatório CGU sobre merenda escolar

Relatório CGU sobre merenda escolar

 

Assim, a CGU entende que há fortes indícios de favorecimento pela habilitação indevida de empresa, ante a aceitação de produtos com características que levaram à desclassificação de outros participantes da licitação, com posterior concessão indevida de benefícios durante a execução contratual.

Por meio de nota, a Secretaria de Educação informou que “todas as contratações de merenda escolar estão suspensas e, quando necessário, a atual gestão da pasta adotará os procedimentos em atendimento às recomendações e determinações do relatório elaborado pela Controladoria-Geral da União, condizente aos contratos de 2017-2019”.

Operações e trabalho da CGU

O trabalho da CGU é realizado em parceria com o MPDFT, por meio da promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e Social (Prodep).

O objetivo é apurar a existência de um grupo de agentes públicos, então vinculados à Secretaria de Educação, que atuaria em conluio com agentes da iniciativa privada visando fraudar procedimentos licitatórios para compra de alimentos.

Investigações

A Operação Fames, cuja primeira fase foi deflagrada em 16 de abril de 2020, teve início a partir dos resultados das fiscalizações do 6º Ciclo do Programa de Fiscalização em Entes Federativos (FEF) da CGU. Mais adiante, à continuidade das apurações e à necessidade de novos aprofundamentos, observou-se que a investigação apresentava pontos coincidentes com as apurações da Operação Self-Service, o que ensejou a deflagração simultânea de ambas.

As investigações do MPDFT e PCDF apontam para diversas práticas delituosas, dentre as quais: possível conluio de grandes empresários do ramo alimentício para fraudar o caráter competitivo de licitações referentes à alimentação escolar; direcionamento do edital de licitação referente a denominada terceirização da merenda para empresas pré-determinadas; irregularidades na contratação de produção de videoaulas; e alteração de parâmetros nutricionais de proteína, sem nenhuma justificativa, beneficiando diretamente os fornecedores.

Diligências

Durante as operaões Fames – 2ª Fase e a Operação Self-Service, foram cumpridos 26 mandados de busca e apreensão, em órgãos públicos; residências de servidores, ex-servidores e particulares, além de empresas envolvidas nas licitações. As diligências ocorreram no Distrito Federal, São Paulo e Piauí. Conforme o Metrópoles revelou, entre os alvo, estão o ex-chefe da Casa Civil do GDF, Valdetário Monteiro, o ex-secretário de Educação do Distrito Federal João Pedro Ferraz e o ex-secretário-executivo da mesma pasta, Quintino dos Reis.

A CGU, por meio da Ouvidoria-Geral da União (OGU), mantém o canal Fala.BR para o recebimento de denúncias. Quem tiver informações sobre esta operação ou sobre quaisquer outras irregularidades, pode enviá-las por meio de formulário eletrônico. A denúncia pode ser anônima: para isso, basta escolher a opção “Não identificado”.


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