A Secretaria de Transporte e Mobilidade do Distrito Federal (Semob) decidiu apurar uma denúncia sobre o uso indevido de repasses efetuados para a contratação de planos de saúde aos trabalhadores do sistema público de transporte local.
O Sindicato dos Rodoviários recolhe, por mês, a diferença do valor repassado pelo Governo do DF (GDF), por meio das empresas, que seria destinado integralmente para o custeio de auxílio médico e odontológico dos operadores do sistema.
Um acordo coletivo de trabalho firmado no ano passado entre as operadoras do sistema e a entidade sindical estabeleceu que, mensalmente, o recurso repassado seria de R$ 277,29 para custear o plano de saúde e outros R$ 28,77 para fins de suporte odontológico, totalizando R$ 306,06 por trabalhador. A entidade cobra das empresas um reajuste de 10% desse valor a partir de novembro, conforme prevê o mesmo acordo.
Ocorre que, após a mudança para a nova prestadora de saúde, ocorrida em junho de 2020, o atual contrato prevê um gasto por trabalhador de R$ 260,12 para garantir o atendimento médico e hospitalar, o que uma diferença mensal de R$ 17,17 por cada rodoviário.
No universo de cerca dos 12 mil trabalhadores, a sobra individual somaria o valor de R$ 206.040,00 a cada 30 dias. Por ano, portanto, o excedente passaria a ser de R$ 2.472.480,00.
Parte dessa soma que cai mensalmente na conta do sindicato é oriundo de recurso público local, por meio da complementação do custeio do transporte. A tarifa técnica é o valor real que deveria ser cobrado pela passagem, considerados os custos do transporte.
O usuário paga apenas uma parte dessa cifra. O governo arca com a diferença e a repassa às empresas por meio de subsídios, o que é chamado de complementação da tarifa técnica, para manter todos os custos do sistema.
De acordo com o Sindicato dos Rodoviários, contudo, embora o repasse exclusivo para o plano de saúde seja superavitário, o valor concedido para plano odontológico cria um déficit mensal de R$ 3 por sindicalizado, que acaba sendo custeado com a outra sobra.
Além disso, informa a entidade, os R$ 14,17 restantes são incluídos numa espécie de caixa para despesas inesperadas e exemplificou situações como sentenças judiciais para cobertura de procedimentos não previstos no contrato com o plano de saúde.
“Temos convencionado que trata-se de uma verba como um todo para a área de saúde do trabalhador rodoviário. Essa verba tem que contemplar um plano de saúde e odontológico. Assumimos a responsabilidade porque as empresas nunca aceitaram conceder o plano especificamente, porque ele sofre uma oscilação de valor constantemente. Há operadoras que em dado momento anunciam reajustes de até 100%. Conseguimos da empresas a verba para administrar esse benefício”, explicou João Osório, tesoureiro do sindicato.
Segundo o representante da entidade, desde 2012, quando o plano de saúde passou a ser obrigatório, o valor repassado pelas empresas não cobria os gastos, fazendo que o trabalhador complementasse a diferença.
“Nos últimos anos, contudo, o valor tem sido suficiente. Nós temos um plano de saúde mais enxuto possível pela média de idade da nossa categoria, que é de 45 anos, mas mas é necessária uma margem para essas despesas inesperadas, inclusive até para custear a operacionalização do plano dentro do sindicato”, emendou.
De acordo com João Osório, esse mesmo recurso também é usado para manter o plano de saúde para trabalhadores afastados pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).
“Diversos trabalhadores ficam encostados pelo INSS por vários anos e por diversos meses sem receber nenhum centavo, nem das empresas e nem do INSS. O rodoviário fica num limbo até que haja perícia do instituto. Para se ter ideia, estamos pagando neste momento o plano de saúde de 276 trabalhadores que estão desprovidos de renda, por isso pagamos a mensalidade”, disse.
Para o diretor sindical, a sobra precisa ocorrer para problemas emergenciais, como o que ocorreu com a Viação Amaral, que decretou falência total há cinco anos e não indenizou os trabalhadores.
“Nestes casos, continuamos dando o suporte de atendimento médico e hospitalar para o trabalhador. Mas é bom deixar claro que o sindicato só faz uso dos recursos destinados para saúde única e exclusivamente para esse fim”.
Por fim, Osório esclarece que, como o repasse do recurso é feito diretamente pelas empresas de transporte, não se trata de dinheiro público. “Todos os nossos balancetes das contas é explicado e aprovado pelos nossos sindicalizados”, disse.
O Metrópoles procurou a Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob) e, por nota encaminhada pela assessoria de imprensa, afirmou que decidiu investigar o caso.
“A Secretaria de Transporte e Mobilidade informa que tomou conhecimento do fato nesta semana e já está apurando o caso. Cabe destacar que, se for constatada alguma irregularidade, serão feitos ajustes no valor da tarifa paga pela Semob”.