14/10/2021 às 07h36min - Atualizada em 14/10/2021 às 07h36min

Oito militares são condenados por mortes de artista e catador no Rio

Todos foram julgados culpados por duplo homicídio e tentativa de homicídio. Outros quatro militares que estavam na ação foram absolvidos

Rio de Janeiro – O Conselho Especial de Justiça Militar em julgamento, nesta quarta-feira (13/10), condenou, por 12 votos a 3, oito militares pelas mortes do músico Evaldo Rosa dos Santos, de 51 anos, e do catador de recicláveis Luciano. Ambos foram vítimas de ação de militares do 1º Batalhão de Infantaria Motorizada Escola, na Vila Militar, em Guadalupe, zona oeste, no dia 7 de abril de 2019.
 
Eles foram condenados por duplo homicídio e tentativa de homicídio. Na ação dos militares, o sogro de Evaldo, Sérgio, ficou ferido, mas sobreviveu.
 
Outros quatro militares que estavam na ação acabaram absolvidos. Todos os 12 se livraram da acusação de omissão de socorro.
 
Foram condenados por dois homicídios qualificados e uma tentativa de homicídio qualificado o tenente Ítalo da Silva Nunes, o sargento Fábio Henrique Souza Braz da Silva, o cabo Leonardo Oliveira de Souza e os soldados Gabriel Christian Honorato, Matheus Sant’Anna, Marlon Conceição da Silva, João Lucas da Costa Gonçalo e Gabriel da Silva de Barros Lins.
 
A decisão saiu mais de dois anos e meio após o episódio. Os réus poderão recorrer em liberdade. Só o carro do músico foi atingido por 62 tiros em uma ação onde os militares dispararam o total de 257 vezes ainda em buscas de assaltantes que usavam um Ford Ka branco, mesmo carro de Evaldo, antes da morte do músico.
 
Durante o julgamento, na 1ª Auditoria da Justiça Militar, 1ª Circunscrição Militar, na Ilha do Governador, zona norte, a mulher do músico, Luciana dos Santos Nogueira, passou mal e foi atendida por uma militar. Ela estava no carro do marido, mas saiu ilesa, com o filho de sete anos e uma amiga adolescente.
 
A promotora Najla Nassif Palma, do Ministério Público Militar (MPM), pediu a absolvição do cabo Paulo Henrique Araújo Leite e dos soldados Wilian Patrick Pinto Nascimento, Vitor Borges de Oliveira e Leonardo Delfino Costa, que não atiraram durante a ação. Najla também pediu a absolvição de todos os 12 acusados de omissão de socorro, porque o tenente Ítalo da Silva Nunes acionou a Polícia Militar.
 
O assistente de acusação, André Perecmanis, pediu aos militares responsáveis pelo julgamento para que não adotassem o corporativismo. “Não ao corporativismo, na medida necessária. Luciano condenado por roubo. O passado dele não importa. Todas as testemunhas, para a defesa dos militares, teriam praticado crime de falso testemunho”, protestou Perecmanis.
 
André Perecmanis lembrou que duas crianças ficaram sem os pais. “Famílias foram destroçadas. O Exército não pode passar essa mensagem, as Força Armadas ensinam a proteger”, sustentou o assistente da acusação.
 
Homicídio Culposo
O advogado dos réus, Paulo Henrique Pinto Mello, pediu que eles fossem punidos por homicídio culposo porque não tiveram a intenção de matar e que só agiram em legítima defesa. Ele sustentou ainda que o estado está em guerra, principalmente no combate ao tráfico de drogas. Ele disse acreditar que as marcas de tiros também poderiam ter sido adulteradas porque o carro foi apreendido em oficina.
 
“Ele morreu com um tiro e não se pode morrer mais vezes”, discursou Mello. O advogado lembrou que o Exército foi acionado para a Garantia da Lei e da Ordem, nos Jogos Olímpicos de 2016, assim como houve a intervenção nos comandos das polícias Civil e Militar em 2018. Mello mostrou ainda vídeos de traficantes afrontado militares e mortes de outros.
 
“Não estamos em uma guerra civil? Nós temos que sair do palco da escola e vir para a vida real. Não há registro de ocorrência que desabone a conduta dos militares, nem reclamação ou denúncia. Militares honrados de ficha limpa. Condenar os militares é condenar a própria força”, defendeu, alegando que houve confronto.
 
Mello argumentou que as mortes de Evaldo e Luciano ocorreram ainda em razão da operação Muquiço, comunidade ocupada entre os meses de fevereiro e junho de 2019. Isso porque traficantes invadiram os apartamentos onde vivem famílias de militares chamados de Próprios Nacionais Residenciais (PNR). Os réus atuaram nesta ação próxima ao local onde o músico e o catador foram mortos.
 
“O tráfico quer invadir o próprio Exército. O tráfico venceu até aqui”, enfatizou Mello, mostrando mortes de militares e ações do tráfico contra o Exército. Além de depoimentos de policiais militares sobre traficantes utilizarem o prédio chamado de Minhocão também próximo do crime para promover disparos contra as forças de seguranças.
 
O caso
O músico Evaldo seguia de carro a um chá de bebê com a família, no momento em que os militares atingiram o veículo com 62 disparos, no dia 7 de abril de 2019, na Vila Militar, em Guadalupe, zona oeste. O artista morreu na hora.
 
Já o catador de recicláveis Luciano Macedo foi morto ao tentar ajudar o artista. Ele morreu no hospital no dia 18 de abril daquele ano. Os 12 militares realizaram duas ações no dia, totalizando 257 disparos de fuzis e pistolas.


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