O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu a diferenciação de usuário e traficante, com critérios objetivos, em ação que trata da descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal. O julgamento sobre o tema foi retomado no STF, nesta quarta-feira (2/8), oito anos após o início de sua análise.
Até o momento, são 4 votos a zero pela descriminalização, com diferentes teses. O julgamento foi suspenso após pedido de adiamento do ministro Gilmar Mendes. A ministra Rosa Weber, presidente da Corte, aceitou o adiamento, mas ainda não marcou data de retorno.
Moraes foi o primeiro a apresentar seu voto-vista, em plenário. Pela tese proposta pelo ministro, deve ser considerado usuário quem estiver portando entre 25 e 60 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas. O ministro defendeu que a regra deve valer apenas para maconha, não para outras drogas, conforme diz o relator da ação, ministro Gilmar Mendes.
Em seu voto, Moraes defendeu a fixação de uma quantidade de droga aprendida para se caracterizar porte ou tráfico, mas ponderou que esse não deve ser o critério único. Para ele, deve ser observado, por exemplo, a quantidade de entorpecentes diferentes; a apreensão de balança de precisão; cadernos de anotação ou celular; locais de apreensão; e se havia uma pessoa entregando e outra pagando naquele momento.
“Não pode uma pequena quantidade, sem nenhum outro elemento, levar à conclusão de que é tráfico. A fixação da quantidade é elemento importantíssimo, mas não único. Essa necessidade vai ao encontro do tratamento igualitário dos diferentes grupos sociais, culturais, raciais”, considerou o ministro.
O STF retomou, nesta quarta-feira (2/8), a análise da possível descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal. O julgamento começou com a leitura do voto-vista do ministro Alexandre de Moraes. Além dele, três ministros se declararam favoráveis a algum tipo de descriminalização da posse de drogas.
A ação sobre o porte de drogas para consumo pessoal está parada desde 2015, quando o ministro Teori Zavascki pediu vista do processo. O magistrado morreu em um acidente aéreo em 2017. O ministro Alexandre de Moraes, que herdou seu lugar, liberou o processo para votação em novembro de 2018 e leu o voto nesta quarta.
Em suas argumentações, Moraes usou diversos dados, análises de cenários e de eficácia da Lei de Drogas desde sua aplicação. O ministro ressaltou que, após a Lei nº 11.343, de 2006, o porte de drogas continuou sendo crime, mas sem medida privativa de liberdade. No entanto, para os traficantes, as penas aumentaram.
“A lei veio para melhorar a situação do usuário: é crime, continua sendo crime, mas a partir de agora não vai ter pena privativa de liberdade. Mas a aplicação da lei foi invertida. Os resultados das leis foram totalmente invertidos”, disse.
Ao citar dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Moraes ressaltou que, após a lei, a proporção de presos por tráfico de drogas aumentou de 15,5% para 25,5%, e a população prisional aumentou 80% no geral. “Tivemos, a partir dessa nova lei, aumento exponencial dos presos no Brasil. Isso gerou o fortalecimento das facções. Transformou usuários em pequenos traficantes”, considerou.
Repercussão O caso tem repercussão geral, ou seja, a decisão do Supremo vai valer como parâmetro para todas as instâncias da Justiça. Os ministros vão analisar a constitucionalidade do artigo 28 da Lei nº 11.343, de 2006, sobre os atos de “comprar, guardar ou portar drogas sem autorização para consumo próprio” serem considerados crimes.
No caso em questão, um homem foi condenado pela Justiça de São Paulo a prestar dois meses de serviços à comunidade por portar três gramas de maconha para consumo próprio.
A Defensoria Pública do Estado de São Paulo questionou a tipificação penal para o porte em uso individual. Segundo os argumentos, o dispositivo ofende o princípio da intimidade e vida privada, previsto no art. 5º, inciso X, da Constituição Federal. O órgão alegou ainda que não há lesividade na hipótese do porte de drogas para uso próprio, uma vez que tal conduta não afronta a saúde pública, “mas apenas, e quando muito, a saúde do próprio usuário”.
Assista a sessão completa da votação, nesta quarta-feira (2/8):
Os ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Gilmar Mendes já tinham proferido seus votos a favor da descriminalização da posse de drogas, mas em graus diferentes. Para o relator do caso, ministro Gilmar Mendes, devem haver sanções administrativas para esses casos, sem punição penal.