12/09/2023 às 06h41min - Atualizada em 12/09/2023 às 06h41min

Minirreforma ministerial atende à governabilidade, mas divide aliados

Com as trocas na Esplanada dos Ministérios, presidente Lula leva o Centrão para o governo, mas abre flancos sensíveis que envolvem disputas locais, como em São Paulo

​A criação de um ministério para abrigar o aliado Márcio França foi a costura mais delicada de Lula para ampliar o espaço do Centrão no governo - (crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)


Discutida por meses, a reforma ministerial anunciada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na semana passada se mostra mais simbólica para o governo. Herdando o arranjo montado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL), Lula vinha negociando com o Centrão a liberação em lotes das emendas parlamentares — o último totalizando R$ 5 bilhões — sempre antes de cada votação estratégica.

O instrumento, porém, é limitado. O Planalto pode, no máximo, definir quando libera a verba, já que a destinação é dada pelo Parlamento. Assim, para selar a parceria com o Centrão, foi incluído o Republicanos e o Progressistas no primeiro escalão da Esplanada. O governo espera, assim, ter mais força nos temas de maior resistência política, como a taxação de fundos exclusivos e das offshores.

No retrospecto, como diversas vezes o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, fez questão de ressaltar, o governo conseguiu aprovar na Câmara quase todos os projetos considerados prioritários, antes da reforma ministerial e sem maioria parlamentar formal. "O que o governo não aprovou? Conseguimos aprovar tudo que era importante, então, qual é a dificuldade na articulação?", respondeu Padilha depois de questionado sobre as dificuldades da articulação com a Câmara.
Mesmo antes de assumir, Lula emplacou a PEC da Transição, que garantiu a governabilidade neste ano e fechou as contas do governo passado. No primeiro semestre, conseguiu aprovar o novo marco fiscal e o retorno do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), e juntou forças com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) para aprovar o projeto de reforma tributária.

Com esse apoio negociado a conta gotas, o governo foi conseguindo os votos e aprovando nas duas Casas do Parlamento as suas pautas prioritárias, mesmo com alguns revezes, como o esvaziamento do Ministério do Meio Ambiente.
Progressistas

Foi a base histórica quem mais vocalizou críticas sobre a saída de Ana Moser do Ministério do Esporte para acomodar o PP, com o deputado André Fufuca (MA), aliado de Lira. Apesar das críticas, a conta ainda saiu barata, pois Lira pressionava pela Saúde, de Nísia Trindade, e pelo Desenvolvimento Social, de Wellington Dias.

Lula ainda deve negociar com o PP a troca no comando da Caixa e da Funasa. A Fundação Nacional da Saúde, alvo de diversas denúncias de desvios, extinta no início do mandato de Lula, é uma máquina de distribuir dinheiro para prefeituras em ações na saúde, o que interessa muito ao PP.

Disputa paulista
Apesar da menor repercussão com a substituição de Márcio França nos Portos e Aeroportos por Silvio Costa Filho do Republicanos (PE), essa foi uma troca politicamente mais delicada para o presidente. França resistiu em entregar o cargo, e é exatamente a pasta que tem o maior projeto (em valor) do novo Plano de Aceleração ao Crescimento (PAC), o túnel Santos-Guarujá, no litoral paulista.

O túnel, que terá 860 metros de extensão, representa um investimento de R$5,4 bilhões em recursos federais, sendo R$2,5 bilhões já disponíveis no caixa da Autoridade Portuária de Santos, controlada pelo ministério agora comandado por Silvio Costa, aliado e do mesmo partido do governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas.

Na principal base eleitoral de Márcio França, que foi prefeito de São Vicente, na região Metropolitana da Baixada Santista, a obra seria um trunfo importante para as pretensões do pessebista em São Paulo.

Nos oito meses que esteve à frente da pasta, França entrou várias vezes em conflito com Tarcísio, que, além de adversário político, foi ministro da Infraestrutura do governo Bolsonaro, pasta que comandava o Porto de Santos, que estava sendo preparado para a privatização, proposta rejeitada por França.

Com a troca do comando, resta saber se Tarcísio conseguirá emplacar um aliado para substituir o atual presidente da Autoridade Portuária de Santos, o advogado Anderson Pomini, recém nomeado por França e ligado ao vice-presidente Geraldo Alckmin.

O descontentamento de França com a troca de cadeiras ficou evidente, na quinta-feira, quando ele provocou Tarcísio reproduzindo uma foto do governador com o presidente Lula. "Saúdo o Lula por trazer para o governo o Tarcísio de Freitas e seu partido para nos apoiar. O Brasil voltou", escreveu o ministro em uma rede social.

Um importante líder petista no Congresso resumiu ao Correio a situação. "Quem perdeu foi o França. Eu, no lugar dele, também estaria esperneando", disse.

Geraldo Alckmin foi outro que perdeu espaço no governo, já que a pasta de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic) cederá parte das suas atribuições para o novo ministério da Micro e Pequena Empresa, que abrigará França. Alckmin só não perdeu a pasta toda para o correligionário, ideia defendida por petistas e com pouca resistência do PSB, por decisão do próprio Lula, que julga importante o papel do vice pelo diálogo que estabeleceu com setores do empresariado resistentes à atual gestão.

O governador de São Paulo chegou a ameaçar sair do partido em caso de adesão ao governo, mas assessores do Palácio dos Bandeirantes confirmam que está pacificada a permanência dele no PR.


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