Aos 80 anos, Corina Yoris Villasana — filósofa e professora universitária — foi escolhida pela ex-deputada venezuelana María Corina Machado para substitui-la nas eleições presidenciais de 28 de julho como principal candidata da opositora Plataforma Unitária Democrática. Durante o período de registro eleitoral, entre 21 e 25 de março, Yoris não conseguiu inscrever a própria candidatura. O sistema informatizado do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), em Caracas, teria apresentado um bloqueio. No entanto, o presidente Nicolás Maduro não teve problemas em registrar o seu nome à reeleição para o terceiro mandato consecutivo. Em entrevista a um veículo de comunicação brasileiro telefone, Corina Yoris falou sobre o incidente e afirmou que não foi comunicada pelo CNE sobre um suposto veto à sua candidatura.
Ela insistiu que recebeu o respaldo de uma votação unânime da Plataforma Unitária e defendeu que o CNE aceite María Corina como a candidata natural para o pleito. A intelectual destacou o desejo de a Venezuela encontrar o caminho da liberdade e destacou que a democracia pressupõe respeito à dissidência e à separação de poderes. "Precisamos de liberdade e de autonomia, dois elementos absolutamente indispensáveis para que um regime possa ser classificado como 'democrático'", observou Yoris. Filha de venezuelanos, com três filhos e sete netos, a filósofa garantiu ter um "profundo amor" pelo país e confidenciou o que diria a Maduro, caso tivesse a oportunidade: "Cumpra a Constituição". Ela declarou que considera a mudança de postura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao criticar o regime madurista, como "muito importante". Para Yoris, a manifestação de Lula deve ser analisada no contexto do êxodo de massa dos venezuelanos.
Confiram a entrevista com Corina Yoris:
O que ocorreu exatamente quando a senhora não conseguiu registrar sua candidatura?
Desde o primeiro dia das inscrições das candidaturas, as pessoas autorizadas a entrarem no sistema não receberam os códigos de acesso. Isso foi, inclusive, alertado pela própria María Corina Machado, que o seguiu fazendo nos dias seguintes. O problema, aparentemente, parecia informático, de acesso à plataforma. Tratamos de ir ao Conselho Nacional Eleitoral pessoalmente. No entanto, para poder ter acesso ao CNE, era preciso possuir as credenciais obtidas durante o credenciamento. Isso não ocorreu comigo. Além disso, tínhamos uma carta que solicitava ao CNE a prorrogação das inscrições. Ela teve que ser enviada pelos correios e pela internet, pois não pudemos fazê-lo pessoalmente. A candidatura não pôde ser inscrita durante os dias de inscrição, como temos dito em várias oportunidades. Não podemos dizer que o registro da minha candidatura obedeceu a um impedimento direto comigo, pois nunca recebemos nenhuma comunicação dizendo que recusavam minha candidatura.
Então, como se explica a inabilitação de seu nome para as eleições?
Não estou inabilitada, não tenho nenhuma mancha em minha trajetória, não somente acadêmica, mas da vida pública. Não pertenci a partidos políticos, portanto, não tive cargos públicos. Eu tenho atuado no mundo acadêmico e universitário. Portanto, não haveria a possibilidade de me inabilitar. De tal maneira que o problema se apresenta de maneira digital. Publicações na internet dizem que não é verdade que impediram minha inscrição. Afirmam que o sistema estava aberto e que, simplesmente, não fizemos o que tínhamos de fazer. No entanto, temos as capturas de tela, as quais estão em posse de pessoas autorizadas da Plataforma Unitária.
O regime de Maduro informou ao governo do Brasil que seu nome não foi aceito pela oposição, o que impossibilitou o registro...
Na verdade, estou me inteirando disso agora. Acho difícil comentar sobre algo que desconheço. Não foi a Plataforma Unitária que se opôs ao meu nome. Isso é claríssimo... Meu nome foi aprovado de forma unânime. Essa notícia é duvidosa, não a conheço...
No contexto da inabilitação política de María Corina e na impossibilidade de a senhora registrar a candidatura, o regime tenta cercear a oposição?
Evidentemente, vejo como um desejo do regime de bloquear, completamente, a participação de María Corina. Isso se refletiu na minha candidatura, delegada pelo respaldo de todas as vozes que se levantaram e de manifestações ocorridas por todo o país, além de um acordo unânime na Plataforma Unitária Democrática. Trata-se do desejo de impedir essa participação, seja a de María Corina Machado, seja a minha. O que ocorre é que não posso afirmar que recusaram a minha inscrição, porque eu nunca recebi uma comunicação desse tipo.
O governo do Brasil mudou o tom em relação ao governo de Maduro, nos últimos dias. Como vê isso?
A manifestação do presidente Lula foi reconhecida por María Corina nas redes, assim como os posicionamentos de Emmanuel Macron (França) e de Gustavo Petro (Colômbia). Eu apoiei esse reconhecimento e externei meu agradecimento a essas manifestações, sobretudo pelo fato de serem pessoas que não foram muito explícitas em suas críticas ao regime de Maduro e a tudo o que ele representou para a Venenezuela nesses últimos 25 anos. A declaração de Lula foi muito importante e é preciso vê-la no contexto do que significa acompanhar a situação da América Latina: a diáspora venezuelana continuar a aumentar, e os países da região serem gravemente afetados por ela. Se quisermos resolver o problema que se apresenta às nações devido a este êxodo em massa, devemos acabar com a origem do problema, não utilizar paliativos.
Quais são seus planos políticos?
Estamos trabalhando para que esse problema de não podermos nos inscrever seja revertido. Essa é uma das motivações que temos pela permanência e pela luta para conseguirmos que as eleições sejam transparentes, limpas e confiáveis. Isso garantiria um retorno à democracia no país.
O que a comunidade internacional deve fazer para que isso ocorra?
A comunidade internacional tem a sua palavra. Nós temos um acordo assinado em Barbados, o qual foi assinado para a garantia de eleições transparentes e limpas.
Se tivesse a possibilidade de dizer algo a Maduro, o que seria?
Eu diria a Maduro para que cumpra a Constituição. A Carta Magna é muito clara, de tal modo que tudo o que ele tem que fazer é fazer valer a Constituição. Precisa fazer com que as eleições sejam livres, limpas e transparentes. E permitir a presença de observadores internacionais também. Isso é sumamente importante.
Sem sua candidatura, como ficam as forças da oposição na Venezuela?
Acho que as forças de oposição estarão com sérios problemas se não chegarmos a um acordo. Estamos trabalhando nisso, nas diversas opções que podemos ter. São coisas que não podemos antecipar, pois não temos uma bola de cristal que nos permita saber, com exatidão, como os outros reagirão. Mas as negociações e as conversas prosseguem, pois a minha candidatura foi produto de uma votação unânime na Plataforma Unitária Democrática. Eu creio que precisamos colocar ênfase nessa candidatura proposta por María Corina Machado, a vencedora das eleições primárias de 22 de outubro de 2023. Ela teve a representação dessa votação massiva, não somente a representação... A palavra mais adequada seria o mandato que lhe foi conferido por uma maioria esmagadora. Isso lhe deposita confiança para que possa representar essa maioria, que deseja mudança na Venezuela.
María Corina alertou que o regime de Maduro não pode escolher o candidato da oposição. É um respaldo ao seu nome?
María Corina sublinhou o fato de que temos tempo até 18 de julho para fazer qualquer mudança. Ela disse que eu sigo sendo a candidata. Caso ela fosse habilitada politicamente, eu cederia o posto a ela, a fim de que ela prosseguisse. Não vamos abandonar a luta. Não podemos correr o risco de Maduro escolher o candidato. Se ele não me aceitar e colocar alguém que aceite, isso não seria uma eleição, mas uma comédia, uma piada completa.
Quem é Corina Yoris e o que ela deseja para a Venezuela?
Eu desejo a liberdade para a Venezuela. Desejo a democracia, a qual se define, basicamente, pelo respeito à dissidência. Existe uma separação de poderes. Precisamos de liberdade e de autonomia, dois elementos absolutamente indispensáveis para que um regime possa ser classificado como "democrático". Quanto a quem eu sou... Venho do mundo acadêmico, universitário. Nunca tive cargos públicos. Portanto, não podem me inabilitar e me aplicar sanções. Tenho um currículo impecável e me respaldam, principalmente, minha participação e meus estudos. Escrevi, e sigo escrevendo, artigos de opinião no jornal El Nacional, de grande circulação na Venezuela. Nas últimas semanas, não escrevi por razões óbvias de tempo e de compromissos. Sou mãe de três filhos e avó de sete netos, venezuelana de nascimento. Meus pais eram venezuelanos. Tenho um profundo amor pelo meu país.