Baku — Depois de quatro dias de reuniões e debates em Baku, capital do Azerbaijão, a reunião preparatória para a 29ª Conferência do Clima das Nações Unidas (COP29) — que será realizada no país, em novembro ¬— avançou no sentido de que é preciso elevar substancialmente o volume de recursos para financiar a transição energética e os programas de mitigação dos impactos da emergência climática. Essa é a posição do país anfitrião e também a do Brasil, que sediará a conferência do ano que vem, em Belém.
Até o início da COP29, haverá intensas negociações diplomáticas para que os chefes de Estado e de governo possam aprovar, não só os novos números, mas definir metas para a regulamentação do mercado de créditos de carbono, outro consenso desta reunião pré-COP. "A última decisão financeira sobre a transição verde foi tomada em 2009. Foram US$ 100 bilhões de compromissos do mundo, particularmente, do mundo desenvolvido. Foi difícil, mas a meta foi cumprida este ano. Agora, o mundo está esperando a nova meta financeira para esta COP", disse Hikmet Hajiyev, chefe do Departamento de Assuntos de Política Externa do Azerbaijão e principal assessor do presidente do país, Ilham Aliyev.
Apesar das incertezas em relação ao acordo global sobre financiamento da chamada transição verde, os negociadores deixam Baku com uma certeza: a de que não dá mais para prolongar as conversas. "Nossa expectativa é que a COP vai produzir avanços muito importantes na área de financiamento, que devem vir dos países ricos para os países em desenvolvimento, sobretudo aqueles mais vulneráveis. Além disso, temos que continuar a fortalecer a estrutura do regime de combate às mudanças do clima, o que inclui a questão dos mercados de carbono", explicou ao Correio o secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Itamaraty, embaixador André Corrêa do Lago, que chefia a delegação brasileira nessas negociações.
Energia
Paralelamente às negociações preparatórias para a COP29, Brasil e Azerbaijão, junto com os Emirados Árabes Unidos (que organizou a COP28), no ano passado, lideram a posição dos países em desenvolvimento em relação ao uso de combustíveis fósseis em benefício de suas próprias economias, e para financiar a transição energética e as medidas de mitigação dos danos causados pelos eventos climáticos extremos.
Os dois países são grandes produtores de petróleo e gás, e vão continuar usando esse ativo, inclusive, para bancar a transição energética. Outro objetivo é atrair a iniciativa privada para projetos de geração sustentável de energia.
"Agora, todos concordam que o dinheiro público não é suficiente. Deve haver uma abordagem multicamadas: setor privado, ONG, todos devem contribuir para esse processo", declarou Hajiyev. É esse esforço que o Azerbaijão está fazendo, no sentido de atrair investimentos privados.
A reportagem do Correio foi até a cidade de Garabagh, a cerca de uma hora do centro de Baku, para conhecer uma gigantesca fazenda de produção de energia solar, financiada integralmente por investidores dos Emirados Árabes Unidos. A usina solar, que custou US$ 262 milhões (cerca de R$ 1,5 bilhão), tem capacidade para gerar 230 MW de energia renovável e impressiona pela extensão da área em que estão instalados os painéis fotovoltaicos.
São 550 hectares (correspondente a quase 400 campos de futebol) que abrigam 570 mil paineis solares, em uma ampla planície. A planta é fundamental para que o país possa, em poucos anos, chegar a 30% de energia verde em sua matriz energética. Investimentos em energia eólica também estão em andamento, para aproveitar os fortes ventos que sopram do Mar Cáspio e que fazem dessa região do Cáucaso uma das mais promissoras do mundo. O governo azerbaijano estima que o potencial energético eólico pode agregar até 200 GW à matriz do país.
"Sempre estivemos cientes de que o petróleo e o gás devem acabar mais cedo ou mais tarde, portanto, sempre investimos na diversificação da economia — indústria criativa, transporte, setor de TI (tecnologia e inovação) e educação. Estamos nos tornando um centro de transporte em nossa região. O turismo continua a crescer. E a mineração também", disse Hajiyev.
O assessor da presidência azerbaijana só reclama das críticas que a chamada Troica (Brasil, Azerbaijão e Emirados Árabes Unidos) vem recebendo por manter a posição de não reduzir a produção de combustíveis fósseis.
Para ele, esse debate está contaminado por ideologia. Ele gosta de citar uma frase, atribuída a um ministro da Arábia Saudita dos anos 1970, que dizia que "a Idade da Pedra acabou, mas não porque acabou a pedra".
"Vemos elementos de crítica na mídia internacional. Nós três somos países exportadores de combustível e não estamos escondendo isso. Nossa resposta é que Azerbaijão, Emirados Árabes Unidos e Brasil, esse sediando a próxima COP, mostram nossa determinação e como estamos comprometidos, como países de combustível fóssil, em fazer parte da transição verde. Então, por favor, nos julguem por nossas ações."
Um promissor mercado no Cáucaso
A conferência climática no Azerbaijão pode ser uma boa janela de oportunidade para parcerias e negócios para o Brasil. O embaixador brasileiro em Baku, Manoel Montenegro, disse ao Correio que, apesar do conhecimento ser pequeno, a imagem é muito positiva entre os dois países. "Embora sem muita informação, (os azerbaijanos) percebem que somos povos muito parecidos, a economia está crescendo com base nos combustíveis fósseis. Nosso foco, aqui, é criar sinergias."
"Há muito espaço potencial que, até agora, não foi preenchido por causa da distância e do desconhecimento. E nossas estatísticas de comércio erram feio quando falam do Azerbaijão porque muito do comércio é feito por tradings, a importação é feita via Dubai (Emirados Árabes Unidos) e portos da Geórgia. O sistema supõe que o açúcar vai para a Geórgia, mas ele vem para cá. Se nossas estatísticas não percebem isso, nosso empresariado também não", complementou o diplomata.
A embaixada brasileira vem mantendo negociações com os azerbaijanos no sentido de incrementar o comércio e a troca de experiência e tecnologias na produção de alimentos. Para o embaixador, o agronegócio brasileiro pode trazer soluções "mais baratas".
Um dos movimentos feitos pela embaixada para alterar essa percepção será a presença, na COP29, de uma delegação de empresários da Confederação Nacional da Indústria (CNI). "Isso só pode fazer bem para nosso comércio, para investimentos. A COP é uma oportunidade única de nos aproximar nesse campo econômico, sobre a base de um relacionamento político excelente."
Montenegro também rebateu as críticas em relação ao uso do petróleo por países produtores, e elogia o pragmatismo dos azerbaijanos, que não param de prospectar acordos de investimento na área de energia, incluindo o petróleo. "Há duas coisas: a transição energética, que é positiva. A outra é não discriminar quem tem petróleo e gás, uma discriminação política. Esses são argumentos que nos convêm, também", acrescentou.