Alexandre Garcia: Lula na berlinda

"O que mudou em Lula? Talvez nada tenha mudado. Talvez por isso. O mundo mudou, o Brasil mudou, o mundo digital é outro, torna as pessoas mais informadas numa diversidade de notícias", observa o jornalista

20/02/2025 08h19 - Atualizado há 4 dias
Alexandre Garcia: Lula na berlinda
Queda recorde de Lula vira pauta de reunião neste sábado no Planalto - (crédito: Platobr)

O marqueteiro Sidônio Palmeira pôs o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no palanque. Lula transforma o palanque em berlinda. Essa exposição dos últimos dias tem gerado mais críticas e ironias do que aplausos — que se limitam às plateias que têm composto os eventos da caravana. Começou na Bahia, quando imaginou que ensinava o povo a não comprar o que está mais caro, tal como faria o Conselheiro Acácio. Depois, em Brasília, onde reuniu os melhores cabos eleitorais do país — quase 4 mil prefeitos — e pediu voto, esquecendo a legislação eleitoral: "Quando terminar meu terceiro mandato, vocês vão pedir 'Lulinha, fica'". Isso, a 16 meses do início legal da campanha eleitoral.

No Amapá, Lula, e não a oposição, recomendou ao povo que apague nas redes sociais os políticos que mentem e dizem besteiras. Depois, estimulou os homens a irem para a cozinha porque as mulheres estão trabalhando fora. E se desviou do tema sobre petróleo da Margem Equatorial para contar que come ovo de ema e pata, e vai comer de jabuti. Quem não consegue comer ovo de galinha deve ter ficado com água na boca.

Na Petrobras, criou a narrativa de que a Operação Lava-Jato enfraqueceu a estatal para que fosse privatizada. No mesmo dia, seu governo, por meio da Controladoria-Geral da União (CGU), abria mão de R$ 5,7 bilhões, descontados de acordos de leniência com seis empreiteiras. Corrupção confessa e devoluções milionárias de propinas por parte de dirigentes da Petrobras não foram consideradas por Lula.

Será que Sidônio já não estaria arrependido? Será ideia dele a volta do chapéu originalmente adotado para esconder marcas da cirurgia no crânio? Fica estranho em ambiente fechado, em que, por respeito, se descobre a cabeça. O Panamá com o macacão vermelho da Petrobras exibe uma mescla excêntrica — que pode combinar com as declarações da mesma natureza. A ideia de expor Lula não vai resolver a carestia, a falta de planejamento, a mediocridade no ministério.

Aliás, a promessa de reforma ministerial antes do carnaval está afundando pelo abandono de lideranças políticas que comandam partidos que apoiaram Lula em 2022, como Paulinho da Força, Gilberto Kassab e o pessoal da social-democracia. A pesquisa Datafolha que mostra um despencar de aprovação no Nordeste, de 49% para 33%, e aprovação nacional de apenas 24%, com 41% de desaprovação, soa como um "salve-se quem puder" entre partidos que garantem votos no Congresso e fora dele.

E no domingo, o advogado que tanto defendeu Lula, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, ligadíssimo a José Dirceu, veio a público para dizer que "o Lula do terceiro mandato, por circunstâncias diversas, políticas e principalmente pessoais, é outro. Não faz política, está isolado, capturado. Não tem a seu lado pessoas com capacidade de falar o que ele teria de ouvir. Não recebe mais os velhos amigos políticos… É outro Lula que está governando… Corremos o risco do que parecia impossível: perdermos as eleições em 2026".

Os que não têm acesso a Lula queixam-se de que a primeira-dama Janja o "protege dos problemas". Kakay diz que Lula está preso à memória de seu passado.

O que mudou em Lula? Talvez nada tenha mudado. Talvez por isso. O mundo mudou, o Brasil mudou, o mundo digital é outro, torna as pessoas mais informadas numa diversidade de notícias — já não as escolhidas por um cartel. E dá voz a todos.

Lula está convicto de que não há memória do mensalão e da Lava-jato, quando expõe narrativas como a da Petrobras. Está certo de que o povo não tem memória. E tem bons motivos para isso. Afinal, em 2022, mais de 60 milhões de brasileiros votaram nele, segundo o Tribunal Superior Eleitoral.


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