Além da reforma do Estádio Nacional Mané Garrincha e do BRT Sul, alvos das duas primeiras fases da Operação Panatenaico, outras grandes obras realizadas no DF estão na mira dos investigadores da Delegacia de Inquéritos Especiais da Polícia Federal (Deleinque): o Centro Administrativo (Centrad) e o Jardins Mangueiral. Os empreendimentos são citados nas delações de ex-executivos das empreiteiras OAS, Andrade Gutierrez e Odebrecht.
Os nomes dos ex-governadores José Roberto Arruda (PR) e Agnelo Queiroz (PT), além do ex-vice-governador Tadeu Filippelli (MDB), permeiam as delações.
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O Centrad foi construído pela Odebrecht em parceria com a empreiteira brasiliense Via Engenharia. O contrato do empreendimento, erguido em Taguatinga, foi firmado na gestão Arruda, e a finalização da obra ocorreu durante o mandato de Agnelo.
O projeto foi citado por três ex-executivos da Odebrecht: Alexandre Barradas, João Antônio Pacífico e Ricardo Roth. De acordo com as delações, houve ajuste de mercado entre a empreiteira, a Via, a Delta e a Manchester, no contexto da execução da obra. A denúncia consta da petição enviada pelo relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Edson Fachin, às instâncias inferiores da Justiça.
Um dos focos da investigação é a assinatura de termos aditivos ocorridos na gestão petista. Até hoje, o Centro Administrativo permanece ocioso. Há uma série de questionamentos feitos pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e pelo Tribunal de Contas do DF (TCDF) sobre a estrutura.
Os gastos com o empreendimento, financiados pelas construtoras, ultrapassaram a marca de R$ 1 bilhão. No acerto original, o governo pagaria mensalidades ao consórcio durante 22 anos. Elas ainda não foram repassadas devido aos apontamentos dos órgãos de controle.
Além disso, auditoria da Controladoria-Geral do DF indicou irregularidades no contrato de licitação. Os problemas vão desde a concepção da parceria até a entrega da obra. Foram analisadas legalidade, legitimidade, eficiência, eficácia e efetividade do acordo assinado entre o Governo do Distrito Federal (GDF) e a concessionária do Centrad, formada pela Via e a Odebrecht.
No documento, de 75 páginas, os responsáveis pela auditoria afirmam que “prevalece o desequilíbrio da relação em favor do ente privado (empresas). Verificaram-se irregularidades na licitação, que poderiam anular todo o processo, e inadequações e irregularidades na constatação e na execução contratual, que igualmente poderiam ensejar sua nulidade”.
Caixa 2
O ex-executivo da Odebrecht João Antônio Pacífico Ferreira afirmou, em delação, que Agnelo Queiroz recebeu R$ 1 milhão via caixa 2, em 2010, para viabilizar o Centrad, e mais R$ 500 mil, em 2014, como reforço de campanha. A planilha na qual a propina está registrada mostra que o pagamento foi feito de forma fracionada, com valores variando entre R$ 100 mil e R$ 400 mil por parcela.
Mais propina
Ao ex-vice governador, o consórcio teria repassado R$ 2 milhões em recursos ilícitos. O pagamento a Filippelli foi feito em 17 de fevereiro de 2014. De acordo com o delator, “foram elaboradas três tabelas que refletiam as etapas contratuais a serem cumpridas, os valores da propina e os respectivos status. Duas tabelas se referiam aos valores que seriam pagos a cada um dos beneficiários (governador e vice) e uma terceira discriminava o valor que seria pago a ambos”.
Além da verba de origem ilícita paga a Agnelo e Filippelli, Pacífico afirma que outros R$ 15 milhões foram repassados para o PT e o MDB investirem na última eleição majoritária.
José Roberto Arruda também teria sido beneficiado do esquema do consórcio Centrad. Segundo delação do diretor da Odebrecht, o ex-governador deu aval a um “acordo de mercado” e supostamente recebeu R$ 966 mil via caixa 2, pagos a um operador, em São Paulo. Em junho de 2014, a empresa teria repassado R$ 500 mil ao político para a campanha ao Palácio do Buriti.
Jardins Mangueiral
A delação premiada da ex-secretária da Odebrecht Maria Lúcia Tavares colocou outra grande obra na mira da PF e do Ministério Público Federal (MPF). De acordo com a funcionária, que trabalhava no chamado “Departamento de Propinas” da construtora, alguém de codinome Grama (ainda não identificado pela Polícia Federal) teria recebido R$ 200 mil em espécie, num pagamento referente aos Jardins Mangueiral.
O projeto localizado em São Sebastião, é considerado a primeira parceria público-privada (PPP) habitacional no Brasil.
O executivo da Odebrecht Realizações Imobiliárias João Alberto Lovera foi citado na colaboração de Maria Lúcia Tavares. Em contato com ela, Lovera teria tratado sobre a entrega do dinheiro em 5 de março de 2017, em Brasília, para Grama.
O empreendimento também entrou na delação do ex-presidente da Odebrecht Realizações Imobiliárias Paul Elie Altit. Ele relatou o pagamento de “vantagem indevida” destinada a agentes públicos vinculados ao Governo do Distrito Federal associados ao projeto habitacional.
Propina
Arruda e Geraldo Magela (PT), ex-secretário de Desenvolvimento Urbano e Habitação da gestão Agnelo, são relacionados por delatores a irregularidades no Jardins Mangueiral. Arruda teria recebido R$ 498 mil de propina em 2010, provenientes da obra tocada pela Odebrecht, mesmo após ter saído do comando do governo. Segundo delação premiada do ex-presidente da Odebrecht Paul Elie Altit, o ex-governador solicitou R$ 8 milhões às empreiteiras, como forma de “contrapartida”.
Magela teria pedido R$ 1,4 milhão das construtoras que tocaram as obras do bairro popular. O ex-executivo disse que a quantia foi repassada ao petista no período entre março e outubro de 2014. De acordo com o delator, parte dos recursos não foi contabilizada e acabou sendo paga em espécie. Outra cifra, cerca de R$ 700 mil, foi transferida na forma de doação para a campanha de 2014.
O Jardins Mangueiral é um bairro planejado, com infraestrutura urbana de água, esgoto, iluminação pública, ruas pavimentadas e urbanizadas, lazer e segurança. Lá foram construídas 8 mil unidades habitacionais. O projeto, que movimentou mais de R$ 1,3 bilhão, é uma parceria entre o GDF (que entrou com o terreno) e as construtoras Odebrecht e Via Engenharia. Ocupa uma área de 200 hectares, às margens da DF-463.
Outro lado
Todos os nomes citados pelos delatores negam quaisquer irregularidades. Segundo o advogado de Arruda, Paulo Emílio Catta Preta, as acusações são improcedentes. “Não há procedência nas acusações porque a Odebrecht não executou grandes obras na gestão do governador José Roberto Arruda, pois ele teve seu governo abreviado no início de 2010, como todos sabem. Todas as execuções foram posteriores a isso”, disse.
Em relação ao Centrad, Filippelli disse estar tranquilo, na época em que a denúncia veio à tona. “Nada tenho a temer. O próprio depoimento, aliás, prova que o delator mente ao afirmar que nunca tratou com o vice-governador sobre pagamento de propina”, destacou. Reafirmou também que “nunca houve interlocução com esse indivíduo fora de assuntos técnicos”.
Já o advogado de Agnelo, Paulo Machado Guimarães, disse que “o ex-governador mantém-se convicto e sereno quanto à regularidade de todos os atos por ele praticados em suas campanhas eleitorais e na administração do GDF”.
Magela também nega envolvimento em quaisquer irregularidades.