O Metrópoles teve acesso a toda a documentação que embasou a denúncia feita à Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam), para o enquadramento na Lei Maria da Penha, incluindo áudios inéditos os quais comprovariam a brutalidade verbal, psicológica e também física contra a então esposa. O casamento durou 13 anos. Há, também, ex-empregadas confirmando terem sido vítimas de assédio sexual por parte do renomado juiz.
“Cachorra”, “safada”, “víbora”, “filha da puta”, “burra” e “gorda” são alguns dos recorrentes adjetivos usados por Roberto Caldas para se referir a Michella. Em uma das gravações mais revoltantes, a impressão é de que o juiz agride a mulher fisicamente.
Em nenhuma das brigas registradas houve reação imediata por parte de Michella. As gravações indicam que as agressões contra ela, das mais diversas formas, foram geradas inclusive por motivos fúteis.
Apesar de uma formação acadêmica e do grande prestígio nacional e internacional pela carreira jurídica em defesa dos direitos humanos e da rede de proteção humanitária, Roberto Caldas esconde, por trás das togas e dos costumes, um temperamento desproporcional, desequilibrado e covarde.
Em um dos áudios aos quais o Metrópoles reproduz abaixo, o conceituado advogado não poupa a ex-mulher de ataques extremamente agressivos. Roberto Caldas dispara críticas e xingamentos contra Michella, por aparentemente um descuido com os filhos do casal, que estariam sujos após um churrasco de amigos.
“Você é uma cachorra, safada”, grita ele em um dos momentos da gravação. “Ah, vá se fuder, caralho”, continua, após não querer ouvir a justificativa da ex-esposa. “Só separando de você mesmo. Ô, merda. Bastam dois dias contigo para ficar com o saco assim”, diz, antes de finalizar com um “cala a boca, vagabunda”.
Em outra gravação entregue à polícia, é possível perceber que o juiz se respalda em motivos banais para violentar verbalmente Michella, apesar das tentativas dela em acalmar o então marido. Na conversa, Roberto reclama da iluminação instalada no espelho do quarto do casal.
“Você é gorda e burra ainda por cima”, diz ele. A universitária tenta ponderar: “Para de me ofender. Me escuta, vamos conversar com civilidade”, insiste. No entanto, o juiz segue com as ofensas: “Não, Michella. Não quero saber. Some da minha vida”.
Jantar e ataque de fúria
Segundo relato de Michella ao Metrópoles, o primeiro sinal de violência do advogado contra ela foi durante um jantar em casa, ainda em 2007, logo após perceber que a mulher havia pedido para que as ajudantes preparassem mocotó e rabada.
Por manter dieta rigorosa, Roberto Caldas teria ficado revoltado com a escolha dela e quebrou o prato com a comida antes de se trancarem no quarto e ele puxar os cabelos dela. “Esse foi só o começo de uma vida de abusos”, contou Michella à reportagem.
A defesa de Roberto Caldas disse reconhecer “serem graves as inúmeras ofensas verbais feitas pelo casal ao longo de uma tumultuada relação”. Mas, segundo o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, não houve qualquer agressão física.
A estratégia do defensor é minimizar o episódio, atribuindo a relação conflituosa a uma disputa financeira. Mas, com farto material em áudio e os contundentes depoimentos de testemunhas dos episódios de agressão, essa linha de raciocínio vitimiza Michella duas vezes. A primeira, ao sofrer as agressões durante todo esse tempo. E agora, ao tentar desqualificar o drama vivido pela vítima, pontuando a questão como sendo meramente econômica.
Em depoimento emocionado, Michella afirma que sua luta contra o ex-marido segue em duas frentes: a cível, na qual discute a partilha de bens, e agora a penal, em que, após mais de uma década, reuniu coragem para expor as vísceras de um relacionamento francamente abusivo.
Colaboraram: André Rochadel, Carlos Carone, Luiz Prisco, Otto Valle, Rafael Campos, Samir Mendes, Suzano Almeida
Confira áudios e transcrições de conversas gravadas por Michella. Os registros são de dias e circunstâncias diferentes. Embora em alguns casos não seja possível perceber o contexto dos diálogos, fica evidente a sucessão de abusos cometidos por Roberto Caldas.
“Eu faço o que eu quiser”
Roberto: Filha da puta. Não te quero mais, porra. Vagabunda. A casa é minha, os filhos. Se você quiser, você sai. Vagabunda. Tem um monte de empregado. Eu faço o que eu quiser. Me dá paz. Sai daqui.
“Quem me bateu foi você”
Michella: Olha aqui, ó: o vermelho que ficou meu braço. Você tá vendo? Você tá vendo? Da controlada que você deu. Além de gritar com o menino porque eu mandei o menino te dar boa noite. Ridículo você, viu? Quem não vai dormir aqui é você. Quem me bateu foi você. Não fui eu que te bati. Quem te deu controlada não fui eu. Quem não vai dormir aqui é você. Que, além de fazer isso com o menino, me deu uma controlada dessa.
Roberto: Vaca.
M: Não me chame de vaca que eu não sou vaca não. Não vai jogar controle em mim de novo não. Quê? Jogue na cara, jogue. Você não é doido.
R: Gordona escrota.
M: Gordona escrota. Eu sou o quê? Gordona escrota? Gordona escrota é você. Eu sou gordona escrota, mas eu não faço isso com a criança nem pego controle e jogo na esposa pra ficar vermelho o braço dela. Você é um doido, isso sim.
“Você é uma cachorra, safada”
Michella: Vou fechar aqui o carro. Eu falei se você ouviu o áudio. Até o Baduí aquele dia do churrasco…
Roberto: Não quero, porra! Foda-se. Foda-se
[Barulho de rádio]
M: Ele fica lá todo o tempo? Porque ele fica indo e voltando lá para a cozinha. Quando eu desci do elevador, estavam duas meninas… duas meninas.. inaudível. Uma de joelho e a outra sentada. abraçada com ele sentada, se agarrando. Entendeu? Foi isso que eu falei? Não falei que eles estavam em cima do sofá e falei que estava todos lá na sala. Falei o seguinte: adolescente não tem cuidado com as coisas, entendeu? Não tem cuidado com as coisas. Ali não é o tipo de móvel para estar adolescente bêbado num dia de churrasco, entendeu? Com as mãos *inaudível*. Foi isso que eu te falei, que não era lugar e eu não acho que seja lugar. Porque quando o Roberto está lá com os amigos, eu peço pra eles ficarem fora, tem uma varanda enorme ali. Tá bom o clima. Leia direito o que eu falei que você vai ver. Eu não tenho feito nada lá em casa porque estou numa fase que eu quero sossego e tranquilidade.
R: [Inaudível] A vida não é sem turma não.
M: Dele fazer tudo bem… Se você ouvir os três vídeos, eu falei assim: Até o Badauí, naquele churrasco do Badauí, ficou todo mundo na varanda. Não fica na sala dele.
R: Foda-se. Você perde a legitimidade de falar qualquer coisa razoável porque você é uma mentirosa.
M: Menti o quê?
R: Desse negócio dá… de ir em cima do sofá, do gaetano e da mancha. Mentirosa, cachorra.
M: Leia de novo que eu só falei assim…
R: Você é uma cachorra, safada.
M: Os meninos estão lá…
R: E pra quê… Se era uma mancha que existia antes pra que você falou?
M: Eu não falei assim, eu falei já está manchado e os meninos sujos de churrasco.
R: Inaudível.
M: Não foi isso.
R: Ah, vá se fuder, caralho
M: Eu disse que ali não era lugar de estar menino de churrasco, bêbado… Roberto… Foi isso. Não falei nada demais.
R: Só separando de você mesmo. Ô merda. Basta dois dias contigo pra ficar com o saco assim…
M: O que eu fiz demais? Eu só falei a verdade, igual Roberto e Benício. Não deixo eles ficarem alí…
R: Foda-se! Olha a diferença…
M: Os meninos com mão de gordura de churrasco
R: Foda-se. Não me minta. Você pondere isso, você pode até falar com ele, pondere, agora não fala esse negócio
M: Eu não menti nada
R: Que eu já chego…
M: Ai, doeu
R: Doeu é o caralho. Foda-se! Estou te odiando. Ódio da minha vida que foi eu me amarrar nessa merda. Não vou mais nessa porra não. Você representa o casal
M: Você vai. Eu não menti nada
R: Eu vi o bilhete, foi pra você. Não sei pra que você mandou pra li. Pra se mostrar? Que esses filha da puta, bandido, mandam pra você. Cambada de canalha.
M: Quem me mandou foi a Cris, é sempre a mulher quem manda.
R: Pois é
M: Você está exagerando aqui, porque eu não menti nada
R: Pra que você falou aquilo? Vagabunda, você deu a entender, vagabunda… Você faz de caso pensado.
M: Você sabe muito bem de que mancha aquele jantar foi… Você sabe muito bem
R: Então, e eu pensei lá que era aquela, sua vagabunda.
M: Eu falei, já está manchado, pra manchar mais
R: Não senhora. Você deu a entender
M: Você lembra, foi no dia do jantar
R: Cala a boca, vagabunda
M: Minha Nossa Senhora, eu ponderei
R: Eu vou me separar de você, eu não aguento. A única pessoa na minha vida que eu tenho conflito é você.
M: Eu não menti, não fiz nada, eu só ponderei
R: Cala a boca
M: Eu só comentei…
R: Cala a boca! Cala a boca
“Seu padrão é mentira. É uma doença”
Michella: Eu pensei, pô. Minha mãe ainda disse…
Roberto: Não adianta você dizer que pensou. Você é a responsável… É você a responsável pelos meninos. Se você quer ajuda, você pergunte. Agora, a responsabilidade é sua. Então, mate a outra que te informou errado.
M: Se a da Maria Eduarda termina dia 11 e a dos meninos…
R: Para de falar idiotice. Cadê o ar-condicionado? Vagabunda. Não posso confiar em porra nenhuma, ainda bem que não te deram a chave. [inaudível]
M: E, aí? Cancela a viagem deles?
R: [inaudível]
M: Roberto, se Maria Eduarda que é mais importante foi dia 11, agora, vou dizer uma coisa para você. Todo ano, na última semana de aula, eles não fazem nada
R: Pois é…
M: É só para os pais terem onde deixar… Eu lembro que o ano passado, era até optativo ir na última semana, era até optativo. Que até quando eu fui lá na escola, Priscila falou que…
R: Chega! Chega. Cancela e ninguém vai pra lugar mais nenhum. Eu não sou idiota para estar gastando dinheiro toda hora. É só isso.
M: Posso falar…
R: Era sua responsabilidade. Vai tomar no cu.
M: Na última semana, não tem nada
R: Agora, você vem com essa, então devia ter resolvido sozinha, sem vir me falar. Eu não acredito em você. Pode chamar quem você quiser. Você faz as coisas tudo arrumadinho. Seu padrão é mentira. É uma doença.
[inaudível]
R: Eu tenho o que fazer, vai pra lá, vagabunda
“Se sua mãe quer ser gorda, deixe ela”
Roberto: Porra, mesmo assim, não tem que fazer jantar. Você não tem voz aqui, Michella.
Michella: Eu não sabia que tinha feito massa. Não mandei ninguém fazer massa
R: Se a Graça fez, tem sua autorização. Ela disse que quando eu viajo, a coisa aqui degringola
M: Vou perguntar a ela se ela disse isso.
R: Pergunte na minha frente. E não vá coagir a outra não. O dia que eu vim, eles tavam comendo miojo. Você não é mãe para ajudar na dieta. Olha ele comendo aqui.
M: Eu não tenho culpa que você brigou com o Pashalsky de manhã e tá querendo descontar em mim não. Por favor.
R: Ai meu Deus do céu. Eu tô brigando porque só tem idiota ao meu lado. Só isso. Tô brigando pelas suas coisas. Aqui ó: o menino com mais de 50kg. Pare de comer isso. Bote isso lá. Isso é massa…
M: Vou pegar só os camarões
R: E cuide você. Leve pra lá, Giselle. Isso é doença, você está engordando, vai ter pressão alta, diabetes. Bota na cabeça, porra. Se sua mãe quer ser gorda, deixe ela. Isso tá em livro. Eu já disse para não fazer massa aqui em casa. Enquanto o Roberto estiver em dieta, ninguém. Querem comer, comam fora. Vocês estão fazendo uma dieta, vem com um negócio na frente para o outro. Se você não colabora porque o menino vai em nutricionista, em médico. Idiota
M: Chame Dona Graça de idiota. Foi ela quem deixou.
R: Eu chamo você, porque você que tem..
M: Eu não mandei ela fazer nada. Chama ela. Quando ela chegar segunda-feira, vou dizer que Roberto disse que é idiota quem faz.
R: É mentira sua porque eu a respeito porque ela me atende, entendeu?
M: Te atende tanto que você tá aqui e ela fez com você aqui…
R: Ah, foi…
M: É
R: Porque você deve ter dito.
M: Eu não disse nada.
R: Tá bom, pois eu falo com ela. Você é a dona da casa, é mãe e você nem liga quando ele tá comendo aqui. Só isso. Ela me respeita mais do que você
“Ele, tipo, fez assim pra me beijar”, diz empregada
M: Pode falar, Luana. Pode falar?
[inaudível]
L: Eu dei aviso meu de sair, dia 3.
M: 3 de julho?
L: Não, de outubro. É, não sei se ela passou.
M: Nunca me passou.
L: Falei, vou lembrar dona Michela.
M: Mas você deu o aviso por quê?
L: Porque estou muito cansada, dona Michela, muito serviço.
Outra pessoa: “porque você não fala a verdade, Luana. Porque que você não fala a verdade que você vai sair?
L: Então, deixa eu falar. A senhora viu o tanto de exame que ele me passou?
O: Não, não é essa a verdade.
L: É… Eu estou muito, eu vou passar em psicólogo, a senhora viu…
M: Ó, Luana, deixa eu te falar uma coisa, eu confio muito em você
L: Não, deixo a senhora falar depois a senhora vai me entender.
M: Eu confio muito em você, espero continuar confiando, entendeu? Eu espero que se… eu até nem queria que você fosse embora, eu vou te perguntar uma coisa e eu quero que você seja sincera, porque a verdade eu já sei. Eu quero ouvir da sua boca. Lembra que eu te falei ontem que eu sabia de um negócio e queria saber da sua boca?
L: É verdade
M: Então, é isso. Então, assim, é a verdade eu já sei tudo, não adianta você negar, mas quero ouvir da sua boca. Pra mim o seu emprego está garantido, se você quiser ficar,
Estou gostando do seu serviço, você está indo muito bem, você está indo melhor na casa do que quando você estava com os meninos, eu acho que lidar com criança é difícil pra você. Que você não tem tanto jeito assim pra falar…[batem à porta] Oi? Quem é?
G: O Roberto… o Gabriel convidou o Roberto pra dormir lá, tudo bem?”
M: Tá, daqui a pouco eu falo, Gisele.
G: