15/12/2018 às 08h18min - Atualizada em 15/12/2018 às 08h18min

“Desimpedidos”, ministros do TCU fazem manobra para absolver Agaciel

Ex-diretor do Senado é acusado de prejuízo de R$ 14 milhões aos cofres públicos. Condenação o deixaria impedido de ocupar cargos públicos

METRÓPOLES

Um revés inusitado no Tribunal de Contas da União (TCU) garantiu a absolvição de Agaciel Maia (PR), mas a manobra foi tão fora dos padrões que provocou o Ministério Público a pedir a anulação do julgamento. Acusado de superfaturar contratos quando era diretor-geral do Senado Federal, o deputado distrital corria o risco de ficar impedido, por 8 anos, de ocupar cargos e funções públicas. No entanto, uma manobra pouco usual na Corte reverteu o placar que estava desfavorável a ele.

O fato aconteceu na última quarta-feira (12/12), quando os ministros julgavam a tomada de contas especial de um contrato celebrado entre o Senado e a Aval Empresa de Serviços Especializados. Auditoria do TCU havia detectado que os gestores, na época, deram um prejuízo de R$ 14 milhões aos cofres públicos. A eventual condenação poderia complicar a vida política de Agaciel e a do ex-senador Efraim Morais, primeiro-secretário da Casa na época, também envolvido no caso.
 

Durante a sessão, o placar chegou a 4 x 3 contra os acusados. Os ministros José Múcio Monteiro (relator), Ana Arraes, Benjamin Zymler e Walton Alencar Rodrigues votaram pela condenação; enquanto Vital do Rêgo, Bruno Dantas e Augusto Nardes, pela improcedência das acusações. Por sua vez, Aroldo Cedraz havia se declarado impedido, uma vez que era deputado federal pelo Democratas, partido de Efraim Morais, quando tomou posse.

Tão logo percebeu que a votação prejudicava Agaciel e Efraim, Cedraz resolveu se declarar “desimpedido” e empatar o placar a favor da dupla. O presidente da sessão, Raimundo Carreiro, teve de dar o voto de Minerva e decidiu pela absolvição dos acusados. No entanto, em uma sessão anterior que originou a auditoria, Carreiro também havia se declarado impedido, por ter ocupado o cargo de secretário-geral da Mesa do Senado no mesmo período quando Agaciel era o diretor-geral da Casa.

Assista ao exato momento em que os ministros decidem votar:

A manobra causou reação dos colegas. O ministro substituto André Luís de Carvalho (que acompanhava a sessão), Zymler e Walton demonstraram estranhamento diante do procedimento inusitado. Em sua defesa, Aroldo Cedraz disse que essa avaliação dele não poderia ser questionada. Por sua vez, o presidente decidiu encerrar a sessão e a discussão.

A representante do Ministério Público junto ao TCU, procuradora Cristina Machado, disse ao Metrópoles que ingressará com um recurso para revisão do julgamento. “Até o momento em que estava 4 a 3, tudo corria de forma correta, dentro do que prevê a lei. O problema surgiu justamente após a declaração do voto de um ministro impedido. Vamos procurar o instrumento devido para que seja anulada essa segunda parte da sessão”, garantiu.

“Constrangimento”
O caso repercutiu entre os auditores do TCU. Em entrevista ao Metrópoles, o presidente da Federação das Entidades dos Servidores dos Tribunais de Contas do Brasil (Fenastc), Amauri Perusso, chamou de “inusitada” a postura dos ministros.

É uma conduta não apenas inapropriada, numa dinâmica de proteger quem está sendo julgado, mas é um produto do formato de como é feita a escolha dos atuais ocupantes do TCU, que reflete em situações assim. Temos denunciado constantemente esse conluios políticos para indicação de ministros profundamente associados a quem tem interesse nesses julgamentos"

Amauri Perusso, presidente da Fenastc

Segundo Perusso, o resultado do julgamento gera “constrangimento” para toda a sociedade. “Isso só demonstra que há ministros que se preocupam com quem está sendo julgado, e não com o que está sendo avaliado. Sem dúvida, merece um repúdio nacional, porque compromete uma instituição que deveria ser séria.”
 

Entenda o caso
Na gestão de Agaciel e Efraim, o Senado Federal decidiu interromper o contrato de serviços de informática com a empresa Spot Representações, para abrir nova concorrência. Foi escolhida, então, a Aval. Segundo auditoria do TCU, a nova vencedora cobrava R$ 1 milhão por mês, contra os R$ 334,4 mil praticados pela antecessora – portanto, com preços de referência bem mais altos que os antigos.

O processo ficou parado por pelo menos cinco anos nas gavetas do TCU, até a Procuradoria-Geral de Justiça (PGJ) acionar o tribunal pela letargia da tramitação. Pelos cálculos do órgão de controle, o prejuízo aos cofres públicos ultrapassou a casa dos R$ 14 milhões.

Pela irregularidade apontada na auditoria, o relator do processo sugeriu a aplicação de multa prevista de R$ 100 mil para Agaciel e de R$ 150 mil a Efraim e à Aval Empresa de Serviços Especializados.

“Diante da evidente gravidade das infrações cometidas no caso concreto, entendo que o TCU deve inabilitar os aludidos responsáveis para o exercício de cargo em comissão e de função de confiança no âmbito da administração federal pelo período de 8 anos”, concluiu o ministro José Múcio. Ele disse que as contas deveriam ser consideradas irregulares, “condenando-os solidariamente ao pagamento dos débitos apurados”.

O que dizem os citados
O deputado distrital Agaciel Maia afirmou, por meio da assessoria de imprensa, que não houve ilegalidade na contratação da empresa. “O processo foi analisado e julgado pelo órgão competente. Não vou comentar uma decisão do colegiado. O processo foi instruído por mais de uma dezena de servidores de carreira do Senado. Não houve irregularidade”, disse.

O ex-senador Efraim Morais também foi procurado, mas não foi localizado pelo Metrópoles. Já a assessoria de imprensa do Tribunal de Contas da União foi acionada para se posicionar oficialmente sobre o episódio, mas não havia se manifestado até a última atualização desta reportagem.


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