Após votações conturbadas, com direito a bate-boca entre policiais militares e integrantes do Sindicato dos Professores (Sinpro), quatro escolas públicas do Distrito Federal vivem dias de transição e tentam se adequar ao modelo de gestão compartilhada com a Polícia Militar. O regimento traz consigo novidades que, gradualmente, são inseridas nos cotidianos das unidades educacionais.
Embora ainda seja cedo para se avaliar o impacto em questões como desempenho escolar, alguns efeitos já são sentidos. No Centro Educacional 1 da Estrutural, por exemplo, a diretora Estela Accioly conta que a lista de espera de matrícula “aumentou muito” desde a chegada dos militares. Ainda não há números oficiais, que devem ser fechados nos próximos dias. No entanto, mais de 400 mil estudantes e 28 mil professores retornaram às atividades nas 678 unidades de ensino espalhadas pela capital do país, no último dia 11.
“Ainda é a segunda semana de aula, mas já é possível observar muita diferença. São poucos pais insatisfeitos com a gestão compartilhada. As turmas estão lotadas, os professores se sentem mais seguros. Os próprios alunos veem os policiais como companheiros agora e estão muito mais calmos”, afirma Estela.
O primeiro-tenente Araújo é o responsável pela formação disciplinar dos alunos no turno da tarde. Ele explica que o papel dos policiais não interfere na questão pedagógica. “Trata-se de uma gestão compartilhada, não militarizada. Estamos aqui para dar mais segurança e facilitar o trabalho da educação”, disse.
Na formação de entrada, os policiais ficam responsáveis por organizar os alunos. Além disso, conforme conta o tenente Araújo, os PMs colaboram reforçando conceitos de cidadania, ética e postura. Algumas regras podem ser observadas: todos devem utilizar calças – nunca short ou saia; as meninas devem usar coque no cabelo e os meninos precisam apresentar um corte padrão.
São cerca de 700 estudantes, em três turnos, para sete policiais. O projeto, no entanto, segundo a PM, é que fiquem de 20 a 25 militares em cada escola, a princípio, voluntários. “Esperamos uma verdadeira transformação tanto da educação quanto da comunidade em que eles vivem, em questão de convivência e valores”, resume o tenente.
“Xerife”
Uma das novidades mais curiosas nos colégios é a criação de uma espécie de “xerife” em cada sala de aula. Com funções e responsabilidades semelhantes às de um representante de turma, o aluno escolhido irá desempenhar papel fundamental em questões disciplinares, incluindo o controle de presença dos colegas de classe.
“Ele que irá fazer uma relação informando aos professores se determinado colega faltou ou foi embora mais cedo, sem ser notado”, explicou o major Lobato Marques, um dos PMs responsáveis pela parte disciplinar do CED 1 da Estrutural.
Conforme Lobato explica, por enquanto os “xerifes” têm recebido todo auxílio dos militares e professores, mas ele estima que em até três meses estejam aptos para desempenharem as funções sozinhos. “Queremos adotar o modelo da autogestão, e a ideia é ter a máquina andando por si só dentro deste prazo. Nosso objetivo essencial é permitir que o professor consiga dar aula e não perca tempo com questões disciplinares”, completou.
As punições aos alunos faltosos ainda não foram definidas, mas devem seguir o modelo adotado anteriormente, no qual o estudante inicialmente receberá uma advertência. Se mantiver o comportamento, os pais serão comunicados e, caso continue faltando, o Conselho Tutelar também será informado. O aluno que não comparece à escola em 31 dias é desligado da unidade.
Secretário de Educação do DF, Rafael Parente vê com bons olhos os dias de adaptação dos colégios. “O processo está andando muito bem e estamos prevendo uma fase de transição que dure até dois meses. O projeto de lei está com a parte jurídica e passa por análise interna ainda”, disse ao Metrópoles.
Pontualidade
Outra novidade é a rigidez quanto à pontualidade dos alunos. No CED 1 da Estrutural, por exemplo, as aulas do turno vespertino têm início às 13h, e a tolerância é de 50 minutos. Excedido o limite de tempo, os atrasados não poderão entrar na unidade.
De acordo com Lobato, a rigidez faz parte do regimento disciplinar militar e evita que se prejudique o andamento das aulas e atividades previstas para o horário, incluindo o momento quando os alunos são postos “em forma”. O procedimento militar tradicional consiste em enfileirar os estudantes antes do início das aulas.
A previsão é que o procedimento seja repetido de segunda a sexta-feira, pelo menos três vezes ao dia: entrada, intervalo e saída. Os estudantes, por enquanto, não usam farda e ainda não aderiram à uniformização dos cortes de cabelo, mas as medidas estão previstas no novo regimento, conforme informou o major.
Outras unidades
Além do CED 1 da Estrutural, os centros educacionais 3, de Sobradinho, e 308, do Recanto das Emas, já funcionam com o esquema de gestão compartilhada com a PM. Nos próximos dias, o governo promete encaminhar à Câmara Legislativa o projeto que formaliza o modelo por meio de lei. O objetivo é ampliar a iniciativa para 20 instituições ainda neste primeiro semestre e terminar o ano com 40 sob essa nova forma de gestão.
O modelo é inédito na capital. As escolas passaram a ser denominadas de Colégio da Polícia Militar do Distrito Federal (CPMDF). Os PMs e bombeiros que vão atuar nos centros de ensino são responsáveis pelas atividades burocráticas e de segurança, como controle de entrada e saída, horários, filas, além de darem aulas de musicalização, ética e cidadania no contraturno. Orientadores, coordenadores e professores permanecerão encarregados do conteúdo pedagógico das classes.
Metodologia
Segundo o secretário de Segurança do Distrito Federal, inicialmente deve ser elaborada uma metodologia de seleção para levar a militarização às outras unidades. “Fomos muito procurados por pais e alunos sedentos pelo projeto. Estamos fazendo estudos para ampliar”, ressaltou Anderson Torres.