25/02/2019 às 07h05min - Atualizada em 25/02/2019 às 07h05min

RE-GO já reprovou campanha semelhante a candidaturas suspeitas do Pros-DF

Candidata que teve contas rejeitadas é mãe do presidente da sigla, que fez declaração semelhante às de políticos do DF. Os concorrentes gastaram R$ 5,3 milhões e tiveram desempenho pífio

Correioweb

As contas de campanha de Maria Aparecida dos Santos, que no ano passado concorreu a deputada federal pelo Pros de Goiás, foram reprovadas por unanimidade pela Justiça Eleitoral. As irregularidades apontadas pelo Judiciário são similares às declarações prestadas por candidatos brasilienses do Pros que tiveram votação pífia e, ainda assim, gastaram R$ 5 milhões. Além da semelhança com as possíveis adulterações no Distrito Federal, o caso revela ainda que o suposto esquema de repasses fraudulentos para candidatos do partido também é uma questão de família. Dona Cida, como é chamada Maria Aparecida, é mãe de Eurípedes Júnior, presidente nacional da legenda. O Correio mostrou ontem que a prestação de contas do partido declara gastos de R$ 5,7 milhões com 33 candidatos, todos com menos de 1 mil votos. Pelos menos oito deles negam ter recebido a verba do diretório nacional.

 

Dona Cida, que foi vice-prefeita de Planaltina de Goiás, não venceu mas conquistou o posto de primeira suplente da coligação, com 38,8 mil votos. O problema é que a Justiça Eleitoral encontrou diversas irregularidades na avaliação das contas da campanha, que custou R$ 1,8 milhão. Do total gasto por Dona Cida, o Pros bancou quase tudo, injetando R$ 1,7 milhão na candidatura. Assim como no caso dos 33 candidatos a deputado distrital, houve abundância de “recursos estimáveis em dinheiro”, quando o partido faz transferências diretas aos candidatos em serviços e material gráfico, por exemplo. Na prática, nesses casos, não há repasse financeiro da legenda para quem concorre. Foram R$ 1,6 milhão investidos assim pelo Pros com Dona Cida. Os recursos são custeados com dinheiro público por meio dos fundos Partidário e Especial de Financiamento Eleitoral. 
 
Chamou a atenção da Justiça, além de uma série de outros problemas, que parte considerável desses gastos não pudesse ser comprovada com a análise da contabilidade da campanha. A legislação dispensa a apresentação de recibos e comprovantes quando os recursos são utilizados para custos com sede e material gráfico, mas, ainda assim, é preciso apresentar documentação demonstrando a entrada e a saída dos itens. “Tais falhas são graves porque impossibilitam a averiguação da regularidade da receita estimável, afetando a transparência e a confiabilidade das contas”, diz trecho do voto do relator do julgamento das contas da candidata, o juiz Luciano Mtanios Hanna.
 
A Justiça observou que R$ 768 mil teriam sido gastos com “créditos de pagamento de pessoal” e R$ 129 mil, com “crédito de controle de cartão combustível”. Não houve, no entanto, comprovação convincente. “Em nenhum dos casos, pode-se aferir a efetiva contratação de cabos eleitorais ou de aquisição de combustível pelo partido político e a posterior cessão ou doação à candidata”, continua o magistrado. 
 
Alvo de polêmicas envolvendo o Pros, o helicóptero da legenda (veja Memória) também foi motivo de avaliação pelo Tribunal Regional Eleitoral de Goiás. Dona Cida teria usado, durante os 45 dias de campanha, 80 horas de voo da aeronave Robinson, no valor de R$ 295,4 mil. Segundo a Justiça, os comprovantes, mais uma vez, são insuficientes para atestar o gasto. “A prestadora de contas, em realidade, trouxe aos autos certificado da aeronave, registros de voo e diários de bordo completamente ilegíveis”, destacou o juiz. 
 
Também o material gráfico, principal foco dos supostos desvios com candidatos do DF, gerou problemas na prestação de contas. Foram R$ 494 mil, todos impressos na gráfica do partido. A utilização do parque gráfico do Pros, entre outras supostas artimanhas, fazia, na prática, com que o dinheiro público saísse do Pros e voltasse para a própria legenda. 
 
Segundo a Justiça Eleitoral, “as irregularidades apuradas abarcam cerca de 66% da movimentação declarada pela candidata”. Por isso, o TRE reprovou as contas de Dona Cida e determinou a devolução da quantia de R$ 1,2 milhão ao Tesouro Nacional. Os representantes da candidata recorreram da decisão.
 
Durante o processo, a defesa de Dona Cida acrescentou inúmeros documentos à prestação de contas e negou irregularidades. Ao entrar com recurso, os advogados contestaram a decisão da corte e pediram a aprovação das contas da candidata, além da suspensão da devolução de verbas. “Tal conclusão não se sustenta se analisados os esclarecimentos e documentos trazidos aos autos”, acrescentou a defesa.  

Cassação

Não é a primeira vez que Dona Cida enfrenta um imbróglio com a Justiça Eleitoral. Ela foi eleita vice-prefeita de Planaltina de Goiás (GO) em 2016, mas a chapa —  que tinha como prefeito David Alves (também do Pros) -- foi cassada em 2018, sob a acusação de compras de votos. Dona Cida não ficou inelegível porque a Justiça entendeu que a responsabilidade das ações era apenas de Davi. 
 

Memória

O helicóptero Robinson, utilizado por Dona Cida na campanha, foi comprado pelo Pros com dinheiro do fundo partidário. Em 2017, o Correio mostrou que a aeronave era usada por Eurípedes Júnior ao menos duas vezes por semana para trafegar de casa, em Planaltina de Goiás, para Brasília —  a 80 km de distância —  e retornar. O Pros recebeu mensalmente R$ 1 milhão do Fundo Partidário em 2018, com descontos e valores bloqueados. O Fundo de Financiamento Especial de Campanha destinou, também no passado, R$ 26 milhões ao partido. 
 

Despesas na gráfica do próprio partido

No Distrito Federal, o diretório nacional do Pros injetou milhões de reais na candidatura de 33 candidatos à Câmara Legislativa, como o Correio mostrou ontem. Todos eles, porém, tiveram desempenho pífio nas eleições do ano passado e não receberam sequer mil votos cada um. Os repasses foram feitos aos candidatos em material de campanha, com números exorbitantes. A propaganda impressa pela legenda para esses concorrentes seria suficiente para que todos os moradores do DF tivessem recebido diversos santinhos e botons. Daria também para colar três adesivos em cada um dos 1,7 milhão de carros da capital federal. 
 
Candidatos, no entanto, ao serem questionados sobre os valores descritos na prestação de contas, garantiram ao Correio que os números foram inflados pela direção da legenda. O apoio com propaganda impressa, segundo eles, foi muito mais modesto — boa parte do material chegou poucos dias antes do pleito e a quantidade era significativamente menor do que a declarada à Justiça. Eles acreditam que a sigla tenha embolsado o valor alegado.
 
O material de campanha descrito pelo Pros na prestação de contas chega ao custo total de R$ 5,7 milhões. O valor inclui pouco mais de R$ 500 mil em gastos com advogados, contadores e despesas de pessoal. Para concretizar o repasse médio de R$ 172 mil em propaganda impressa a cada candidato, o partido teria utilizado  as chamadas “receitas estimáveis em dinheiro” e se aproveitado de uma brecha na legislação eleitoral, que dispensa a apresentação de comprovantes e recibos na transferência de valores em materiais de campanha. 
 

Impressão

Os 33 candidatos, juntos, conquistaram o apoio de 11,9 mil eleitores. Considerando somente os R$ 5,7 milhões em recursos estimáveis, portanto, cada voto teria custado aos cofres públicos R$ 479. A gráfica responsável pela impressão de materiais é também a do próprio partido — o que se comprova pelo CNPJ estampado em alguns dos santinhos — e fica em Planaltina de Goiás (GO). 
 
Por meio da assessoria de imprensa, o Pros alega que "as contas foram reprovadas em razão de uma divergência de entendimento do TRE-GO, que considerou doações estimáveis em dinheiro como doação financeira. Contudo, tal entendimento é objeto de recurso e, portanto, ainda não é definitivo".
 
O partido afirmou desconhecer irregularidades nos recursos utilizados durante a campanha de 2018. A legenda alegou que a prestação de contas é responsabilidade de cada candidato e que cabe à Justiça Eleitoral, “por meio de seus mecanismos, averiguar a regularidade dos dados apresentados”.
 
A opção pelas transferências diretamente em material, segundo a sigla, tinha como objetivo evitar que candidatos e candidatas aplicassem equivocadamente os recursos. Na divisão dos repasses, o Pros diz que “buscou investir tanto nos filiados já testados nas urnas, quanto em novas caras”.
 
A legenda confirma que o material, quase em sua totalidade, foi impresso em parque gráfico de propriedade da sigla, “o que reduziu significativamente os gastos do partido com material gráfico”, acrescenta o comunicado. Ainda de acordo com a assessoria de imprensa, o presidente nacional do Pros, Eurípedes Júnior, desconhece qualquer irregularidade e aguarda, como a legenda, a manifestação dos órgãos competentes.

 


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