A manhã mal começa e um aglomerado de pessoas se forma na parada de ônibus às margens da Via N1 do Eixo Monumental, a apenas 160 metros do Palácio do Planalto. Entre servidores que chegam para trabalhar na Esplanada dos Ministérios e ambulantes vendendo café da manhã, uma movimentação chama a atenção. Sentada em um banquinho de plástico, uma mulher esconde na bolsa elevada quantia de dinheiro em espécie, além de uma máquina semelhante às de cartão de crédito e débito. O equipamento, no entanto, é usado por ela para outro fim: registrar apostas no jogo do bicho.
Apesar de ilegal, a prática tem clientes fiéis. Das 7h às 10h, é intenso o vaivém de interessados em participar na jogatina na porta da sede do Poder Executivo Federal, onde despacha o presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL). Democrático, o jogo registra apostas de rodoviários a funcionários públicos da alta cúpula do governo.
RAFAELA FELICCIANO/METRÓPOLES
Identificados pelos crachás pendurados nos pescoços, os jogadores deixam com a bicheira quantias diversas. De R$ 0,50 a R$ 20, não há limite máximo nem mínimo para o valor jogado. Aqueles que não têm familiaridade com o jogo, logo recebem orientação da contraventora: “Você me fala o quanto quer jogar. Pode apostar R$ 0,50, R$ 1…”.
A mulher explica que quanto maior o valor apostado, maior o prêmio. “Se você jogar um real e ganhar no primeiro prêmio, você pode levar R$ 2,5 mil”, revela à reportagem, sem saber que estava sendo filmada.
Veja o flagrante feito pela reportagem:
O primeiro resultado sai às 11h30 e ela assegura que para receber o prêmio em dinheiro é preciso procurá-la no horário indicado. A entrega da quantia é feita ali mesmo, “no meio da rua”. “Se você quiser conferir se ganhou, vem aqui comigo e confere. Ou em qualquer outro lugar que faz bicho. Mas, para receber o prêmio, é só comigo”, explica.
A ousadia dos contraventores não está restrita aos arredores da Presidência da República, sendo possível observar pontos de jogatina em toda Esplanada dos Ministérios. Durante a semana, o Metrópoles flagrou a atividade a pleno vapor no estacionamento de ministérios, nos anexos da Câmara dos Deputados e no Palácio do Buriti.
É nos fundos do Bloco F, onde está uma das sedes do Ministério da Economia, que funciona um esquema que já virou negócio de família. Conhecidos na região, pai e filho administram e registram as jogatinas debaixo de uma mangueira, no estacionamento da pasta. Segundo pessoas ouvidas pela reportagem, o local escondido não é por acaso. A região tem sido alvo de recentes batidas policiais, levando os contraventores a ficarem “mais atentos”.
Apesar de escondido, o ponto recebe muitos apostadores. Uma delas, flagrada pela reportagem, diz ser frequentadora do local há pelo menos quatro meses. Mesmo apostando assiduamente, ela revela ter ganhado poucas vezes. “Nem me fala de perda, porque eu já perdi tanto. Ganhei duas vezes: R$ 300 foi o maior prêmio que ganhei até hoje”, conta.
Não muito distante dali funciona outro ponto, entre os Blocos B e C. Também no estacionamento e sem chamar a atenção, um homem registra os jogos dentro de um Ford Fiesta sedan de cor preta. Compete aos flanelinhas e lavadores de carro que ficam no local levar os apostadores ao contraventor.