Entendimento só poderá ser alterado mediante desapropriação formal do Incra
O juiz federal Marcelo Meireles Lobão, da 1ª Vara Federal de Anápolis, reafirmou que as decisões da Justiça Estadual que determinam a desocupação da área do povoado Antinha de Baixo, em Santo Antônio do Descoberto, no Entorno do Distrito Federal, continuam válidas e só poderão ser alteradas mediante desapropriação formal pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Ele enviou ofício ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, em 9 de setembro.
Anteriormente, Fachin já tinhado determinado “a imediata suspensão da ordem de desocupação” das cerca de 400 famílias do povoado. O entendimento é do começo de agosto. Vale citar que, antes, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) solicitou a federalização do caso, que foi acatada pela 1ª Vara Cível do município.
O Incra solicitou a federalização do caso, alegando que a área seria ocupada por remanescentes quilombolas. Para o magistrado, contudo, não há comprovação oficial dessa condição. “Eles se reuniram e se autodeclararam membros de uma comunidade quilombola, e, na sequência, aviaram solicitação como essa finalidade supostamente apresentada à Fundação Palmares. Não há nenhum registro válido de trajetória histórica em tal condição ou emissão de certidão pela Fundação Palmares.”
E ainda: “Examinando cada uma das peças que integram a vasta documentação juntada, não encontro nenhuma menção à suposta comunidade nas oito décadas de tramitação da ação divisória.” Para ele, trata-se de uma “e tentativa artificial de alterar a qualificação jurídica da posse, com o único objetivo de embaraçar a efetivação da sentença judicial”. O juiz, então, entendeu que permanecem “válidas e eficazes as decisões proferidas pelo Juízo de Direito da Comarca de Santo Antônio do Descoberto”.
Pedido de federalização
Ao pedir a federalização, o Incra expôs que a área passa por processo de titulação como território quilombola. A medida faz com que a questão seja de competência federal. Conforme o parecer assinado pela procuradora Patrícia Rossato, coordenadora-geral jurídica de Territórios Quilombolas da PFE/Incra, “o prosseguimento dos atos de reintegração de posse pela Justiça Estadual conduzirá à nulidade do cumprimento de sentença. É incontroverso que a decisão judicial afeta a posse de uma comunidade quilombola, e a competência absoluta da Justiça Federal deve ser reconhecida”.
Cerca de 400 famílias que vivem no povoado Antinha de Baixo, na zona rural de Santo Antônio do Descoberto, foram alvos de uma desocupação que começou no começo do último mês. A ação da Polícia Militar (PMGO) iniciou ainda pela manhã daquele dia e foi acompanhada pelo Corpo de Bombeiros Militar de Goiás (CBMGO). A ordem ocorreu após determinação judicial que tornou três herdeiros donos de toda a fazenda, sendo uma delas Maria Paulina Boss, tia do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil).
A sentença para reintegração ocorreu após décadas. Em 28 de julho, a juíza da 1ª Vara Cível da comarca de Santo Antônio do Descoberto, Ailime Virgínia Martins, expediu mandado de desocupação compulsória dos imóveis no povoado, com ação exceção para 16 famílias vulneráveis. Na decisão, apesar de autorizar o oficial de Justiça pedir reforço da PM, CBMGO e Conselho Tutelar, ela determinou “prudência e moderação”. Com isso, o servidor poderia atuar “arrombando cômodos, móveis e obstáculos, caso se torne necessário”.
Briga na Justiça
A briga na Justiça pelas terras de Antinha de Baixo começou em 1945. À época, um parente de um antigo habitante chamado Francisco Apolinário Viana pediu divisão geográfica junto ao TJGO para garantir que a parte dele ficaria em seu nome. Já em 1985, três pessoas entraram no processo e disseram ser herdeiros de áreas do mesmo local: Luiz Soares de Araújo, Raul Alves de Andrade Coelho e Maria Paulina Boss. Contudo, os moradores afirmam que o trio usou documentos falsos na ação.
Em 1990, eles conseguiram a primeira decisão favorável para reintegração, com o caso transitando em julgado cinco anos depois. Contudo, apenas em 2014 começou a desocupação, que foi evitada por meio de recursos judiciais. Então, o filho de Maria Paulina, Breno Boss Caiado, primo do governador, entrou no caso.
Paulina já é falecida e ele seria um dos herdeiros dela. Ele, inclusive, advogou no caso até 2023, quando foi nomeado desembargador pelo primo. Naquele momento, antes de deixar o processo, apresentou recurso. Neste, ele afirmou que as ações de divisão de terras e de usucapião dos moradores estavam com irregularidades.
Correio de Santa Maria, com informações da 1ª Vara Federal de Anápolis






