O envio das investigações da Lava Jato para outros estados pode gerar perda de qualidade no andamento da força-tarefa, alerta o procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Júlio Marcelo de Oliveira. Em entrevista ao CB Poder — uma realização do Correio Braziliense e da TV Brasília —, nesta terça-feira (27), ele rebateu os críticos da operação que defendem a descentralização dos inquéritos.
"Na Lava jato, temos um conjunto de investigações que podem ser divididas em grupos de dez investigações, mas o fato é que precisamos avançar. Alguns fatos são conexos e outros têm mais independência. Os que estão em Curitiba guardam mais conexão porque ali há um conjunto de pessoas que se especializaram nesse tipo de investigação. Espalhar a investigação causará uma perda de qualidade no processo", afirmou Oliveira.
O procurador do MP junto ao TCU lamentou a declaração do presidente Jair Bolsonaro de que "acabou" com a Lava-Jato porque não existe corrupção no governo. "Foi uma frase muito infeliz e equivocada do presidente. Há mais de 400 inquéritos, investigações em curso, só na força-tarefa de Curitiba. Há muito trabalho a ser feito, e não cabe ao presidente da República acabar ou não com a Lava Jato. Isso é uma consequência do esgotamento dos fatos a serem investigados, que acontecerá em algum momento. É uma atribuição do Ministério Público e do Poder Judiciário", esclareceu.
Oliveira também comentou a relação da milícias no Rio de Janeiro com a política. Para ele, a situação da segurança pública no Rio é gravíssima e, para superar isso, o estado deve se equipar com pessoas, materiais e inteligência. Além disso, uma resposta do Judiciário e uma atuação do sistema prisional para isolar lideranças criminosas é importante, segundo ele. "Todo um conjunto de órgãos tem que se articular para um enfrentamento dessa magnitude", afirmou.
Ao comentar sobre controvérsias no Judiciário, o procurador avaliou o caso André do Rap. O traficante do PCC fugiu no último dia 10, após ter a prisão preventiva revogada pelo ministro Marco Aurélio Mello, do STF. "No caso do Supremo, tem o problema da distribuição de processos que permitiu que os advogados entrassem com nove habeas corpus e depois desistissem, porque não caíram com um ministro que achavam que seria simpático à causa. Quando caiu com o ministro Marco Aurélio, ele foi em frente e concedeu a ordem", observou o procurador.
Júlio Marcelo de Oliveira criticou ainda a fala do ex-marqueteiro do Partido dos Trabalhadores, João Santana, no programa Roda Viva , da TV Cultura ontem (26). Santana, responsável pelas campanhas presidenciais do PT entre 2006 e 2014, afirmou que o caixa 2 é a "alma do sistema eleitoral brasileiro". Para Oliveira, a declaração é problemática, pois aponta para uma naturalização da corrupção.
"O caixa 2 existe porque alguém quer doar recursos e não quer contabilizar essa doação. E por que alguém faz esse tipo de doação? Porque tem algum interesse a ser preservado ou conquistado com a eleição daquela pessoa que recebe a doação. É um investimento, haverá uma cobrança depois. É extremamente nociva para o nosso sistema", completou.