21/01/2022 às 18h25min - Atualizada em 21/01/2022 às 18h25min

PMs atiraram 58 vezes contra suspeitos mortos em plantação de maconha

Quatro foram mortos na região da Chapada dos Veadeiros. Amigos e familiares questionam a versão da PM e dizem que mortos não eram violentos

Goiânia – Policiais militares atiraram 58 vezes durante uma ocorrência em uma plantação de maconha, que terminou com quatro mortos na manhã de quinta-feira (20/1), em uma chácara entre Colinas do Sul e Cavalcante, na região da Chapada dos Veadeiros, em Goiás.
 
Familiares e amigos de três dos mortos estão questionando a versão da Polícia Militar, de que houve uma troca de tiros. Eles afirmam que as vítimas não tinham um comportamento violento ou andavam armados. Além disso, seriam pessoas conhecidas e queridas na região da vila de São Jorge, em Alto Paraíso.
 
Ocorrência
Segundo o boletim de ocorrência, dos 58 disparos efetuados por seis policiais, 40 foram de fuzil e 18 de pistola. A PM disse que estava averiguando uma denúncia de plantação de maconha na região, quando se deparou com a plantação e sete pessoas debaixo de uma cobertura de palha.
 
Essas pessoas teriam reagido e atirado contra os policiais, que teriam respondido. Quatro morreram e três teriam fugido. Os baleados chegaram a ser levados para o hospital de Colinas do Sul, porque na região não tinha sinal de telefone para chamar o resgate, como determina o procedimento padrão da PM. Eles estavam mortos quando foram atendidos pela equipe médica.
 
Segundo os policiais, os suspeitos teriam usado uma espingarda e três revólveres para atirar nos militares, sendo eles de calibre 32, 22 e 38. Amigos das vítimas só reconhecem a existência da espingarda, algo que seria comum entre moradores de comunidades rurais.
 
Conhecidos na região
Os lavradores Ozanir Batista da Silva, de 46 anos, conhecido como Niro ou Jacaré, e Chico Kalunga, que não teve o nome completo divulgado, seriam vizinhos da plantação de maconha, segundo amigos ouvidos pela reportagem.
 
“Eram pessoas que não tinham uma moto, um automóvel, viviam pedindo ajuda para comer, porque na vila de São Jorge a gente é uma família. A gente se ajudava. Quando não tinha dinheiro, dava uns trocados para rastelar. (…) A gente quer Justiça. A gente não vai abaixar a cabeça para isso”, afirmou um familiar das vítimas.
 
Já Salviano Souza Conceição, de 63 anos, seria o dono da plantação, mas não seria uma pessoa de comportamento violento, segundo amigos. “Não justifica o que aconteceu, ele era uma pessoa pacata e tranquila”, disse um conhecido. Alan Pereira Soares, de 27 anos, era morador de Colinas do Sul.
 
Chacina
O produtor cultural Murillo Aleixo, de 33 anos, era amigo das vítimas Niro e Chico. Ele disse que moradores da região estão revoltados e indignados. A dupla era conhecida por fazer bicos de jardinagem e construção.
 
“Eles não tinham absolutamente nada a ver com a plantação de maconha. E mesmo o pessoal tendo plantado, não há direito de pena de morte. Eles não tiveram o direito de ser julgados. Precisa usar a palavra “chacina”, porque isso não pode ser normalizado”, defendeu Murillo para a reportagem.
 
A família de Chico é de uma comunidade quilombola, onde ele será enterrado. Ele costumava trabalhar com jardinagem e plantas medicinais. Os pais de Niro são de uma família pioneira em São Jorge. Ele já teve problema alcoolismo, mas estaria se recuperando. Familiares estão resolvendo as burocracias para liberar os corpos. Niro e Salviano serão enterrados no cemitério de São Jorge.
 
Pés de maconha
No boletim de ocorrência, a PM divulgou que havia cerca de 2 mil pés de maconha na plantação. Mais tarde, o número foi corrigido para entre 500 e 600 pés. As plantas foram incineradas na própria fazenda.
 
Também foram apreendidas uma balança de precisão, uma pequena quantidade de maconha prensada e pronta para venda em tabletes, segundo a PM. Além de sementes, folhas secas, uma prensa manual e munições.
 
Outro lado
Questionado pelo Metrópoles sobre a versão de familiares e amigos dos suspeitos mortos, o comandante da PM em Niquelândia (GO), que coordenou a ação, o subtenente Flávio Taveira Guimarães, defendeu que toda ação policial com morte é investigada e passa pelo Ministério Público.
 
“É família! A gente entende o sentimento deles. Quanto à versão da PM, sempre que há confronto é aberto um procedimento investigativo para apurar os fatos. (…). Um fato deste não começa e acaba nas mãos da PM. Existe a atuação de outros órgãos que têm independência de atuação”, afirmou.
 
Procurado pela reportagem, o Ministério Público de Goiás afirmou que deverá aguardar o andamento das investigações, incluindo a definição sobre a sua jurisdição, que é o local onde ocorreu o fato, para estabelecer as providências a serem adotadas.


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