Presidente do Ibama rebate fala de Lula cobrando petróleo na Foz do Amazonas: 'Não faria o que faço se não gostasse de pressão'

Rodrigo Agostinho disse nunca ter sido pressionado diretamente pelo presidente e reiterou que servidores são ‘concursados e têm proteção do cargo’

14/02/2025 07h27 - Atualizado há 3 semanas
Presidente do Ibama rebate fala de Lula cobrando petróleo na Foz do Amazonas: Não faria o que faço se não gostasse de pressão
O presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho — Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

O presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Rodrigo Agostinho, afirmou que está habituado à “pressão” após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cobrar o órgão a autorizar pesquisas para a exploração de petróleo na chamada Foz do Amazonas.

A pressão pela liberação vem crescendo no meio político e é uma demanda, por exemplo, do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP).

— Isso é normal. Se eu não gostasse de pressão, não estava fazendo o que eu faço. Eu preciso também ser justo. O presidente nunca me pressionou para isso, mas de tempos em tempos tem empreendimentos que são emblemáticos e a sociedade toda cobra uma resposta. Vejo isso com muita naturalidade — afirmou Agostinho ao GLOBO.

Mais cedo, Lula criticou o Ibama pela falta da autorização para explorar petróleo e defendeu a pesquisa na região e afirmou que o órgão ambiental "parece" atuar contra o governo.

— Não é que vou mandar explorar, eu quero que seja explorado (...) O que não dá é ficar nesse lenga-lenga, o Ibama é um órgão do governo e está parecendo que é um órgão contra o governo — disse Lula em entrevista à Rádio Diário FM, de Macapá.

Procurada para comentar as falas de Agostinho, a assessoria da Presidência da República não se manifestou.

O presidente afirmou que, provavelmente ainda nesta semana, a Casa Civil vai se reunir com o Ibama para tratar sobre a autorização à Petrobras para pesquisas de exploração de petróleo na região.

Agostinho disse não ter sido avisado ainda sobre uma nova reunião, mas que o Ibama tem se reunido constantemente com a Casa Civil para tratar sobre esses e outros assuntos.

—A Casa Civil está acompanhando isso pari passu. Teve reuniões recentes, não só por conta desse empreendimento. Tem a sala de situação do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), então, toda semana a gente está lá em reuniões — disse Agostinho.

Segundo o presidente do Ibama, dificilmente qualquer resposta sobre o assunto sairá antes de março. Ele acrescentou que as tratativas estão caminhando.

— Agora em dezembro, a Petrobras apresentou um novo plano de emergências. Esse plano está sendo analisado e, ao mesmo tempo, a Petrobras começou a construir uma base em Oiapoque (AP), mais ou menos 170 quilômetros de distância da área de exploração. Diminui muito tempo de resposta para um eventual acidente. A base fica pronta só no final de março, então, por isso que algumas pessoas estão fazendo a leitura de que a licença será em março. Dificilmente sai alguma coisa antes de março —disse.

A Margem Equatorial abrange áreas de exploração e produção de petróleo e gás em várias bacias marítimas próximas à Linha do Equador: Foz do Amazonas, Pará-Maranhão, Barreirinhas, Ceará e Potiguar. Ela se estende de Oiapoque (AP), no extremo norte do país, ao litoral do Rio Grande do Norte.

O Ibama não concedeu licença para que a Petrobras inicie a perfuração do primeiro poço, localizado a uma distância de 175 quilômetros da costa do Amapá e a mais de 500 quilômetros de distância da foz do Rio Amazonas. O objetivo dessa perfuração era comprovar a viabilidade econômica da produção de petróleo na região. O plano, no entanto, sofre oposição de ambientalistas pelo risco ao meio ambiente.

Na semana passada, a presidente da Petrobras, Magda Chambriard, afirmou que todas as demandas apresentadas pelo Ibama foram entregues em novembro.

Interlocutores de Lula afirmam que o objetivo do governo é que a autorização para a pesquisa saia ainda no primeiro trimestre. Auxiliares lembram que o presidente passou a tratar do tema com mais frequência nas últimas semanas e que ele tem reiterado que o aval, neste momento, seria apenas para a pesquisa. Caso a viabilidade da exploração seja constatada, será necessária uma nova licença ambiental.

Agostinho disse ainda que, apesar da cobrança, o Ibama deve se manter a uma resposta técnica.

— Os servidores do Ibama são concursados, então mesmo que eu fizesse qualquer tipo de pressão sobre eles, eles têm a proteção do próprio cargo deles. Tanto que mesmo no governo passado, situações como essa não aconteceram — disse.

Associação diz que pressão política é 'inadmissível'

De tarde, a Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema Nacional), que reúne funcionários de órgãos como Ibama, ICMBio e Ministério do Meio Ambiente, divulgou nota classificando como " inadmissível qualquer tipo de pressão política que busque interferir no trabalho técnico do órgão, especialmente quando se trata de uma decisão que pode resultar em impactos ambientais irreversíveis".

"As declarações que desqualificam o Ibama e seus servidores desrespeitam o papel fundamental da instituição na defesa do interesse público, que é seu objetivo final, independente do governo da vez", completa a nota.

A associação explicou no comunicado que, desde 2012, o governo tem a possibilidade de realizar uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) na Bacia da Foz do Amazonas, o que permitiria identificar áreas aptas e não aptas à exploração de petróleo na região.

Isso auxiliaria no planejamento estratégico e econômico e reduziria as incertezas do licenciamento ambiental de empreendimentos, diz a entidade. Porém, "não se tem notícias de pressão do Palácio do Planalto para que a AAAS saia do papel", dia a Ascema.

A associação reforçou que as decisões do Ibama são baseadas em "critérios técnicos, científicos e legais".

Disse ainda que o processo de licenciamento ambiental é conduzido de maneira "rigorosa, transparente e responsável", considerando a proteção da biodiversidade e o bem-estar das populações, bem como o desenvolvimento econômico do país.

"É contraditório que um país que sediará a COP30, um evento de relevância global para o enfrentamento das mudanças climáticas, adote posturas que fragilizam a governança ambiental e colocam em risco compromissos assumidos internacionalmente", finaliza a nota.


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