Na última década, ao menos 664 projetos de lei relacionados à população transgênero foram protocolados. Do total, 416 (62,6%) buscam ampliar direitos e 248 (37,3%) visam restringi-los .
Nos últimos 10 anos, ao menos 664 projetos de lei relacionados à população transgênero foram protocolados nas Assembleias Legislativas dos 26 estados e na Câmara Legislativa do Distrito Federal. Do total, 416 (62,6%) buscam ampliar direitos e 248 (37,3%) visam restringi-los. Os dados são de levantamento inédito realizado pela Nexus Pesquisa e Inteligência de Dados, que revela um cenário legislativo em disputa, com destaque para o aumento de iniciativas pró-garantias, especialmente em temas como segurança, uso do nome social e acesso ao mercado de trabalho.
Entre os projetos favoráveis, 21 se tornaram leis estaduais desde 2015 mais do que o dobro das nove propostas restritivas aprovadas no mesmo período. Pernambuco lidera o número de leis favoráveis (quartro), seguido por Acre e Maranhão (três cada).
As propostas foram majoritariamente apresentadas por parlamentares de partidos de esquerda, como PSol, PT, PDT e PSB, mas há também iniciativas de centro e até mesmo da direita, como os três PLs da deputada Socorro Pimentel (União Brasil-PE). Já as leis restritivas concentram-se no Amazonas, Maranhão e Alagoas, com medidas que vetam banheiros unissex, proíbem hormonioterapia e exigem o sexo biológico em competições esportivas.
O ano de 2023 marcou o pico da produção legislativa sobre o tema, com 218 propostas apresentadas, uma em cada três de todo o período. O levantamento também mostra uma correlação entre espectro político e tipo de proposta: 99% dos PLs de esquerda buscam ampliar direitos, enquanto 84% dos PLs da direita pretendem restringi-los. Apesar disso, há interações entre os campos: 9% dos PLs favoráveis vêm da direita e 15% dos textos restritivos foram propostos por parlamentares de centro.
O conteúdo dos PLs favoráveis é concentrado em temas de segurança (54), nome social (53) e emprego e concursos (38), além de iniciativas para coibir a discriminação, garantir atendimento em saúde e estabelecer punições à transfobia. Já os projetos restritivos se concentram na educação (69), em especial na linha do “Escola Sem Partido”, nos esportes (38), com foco no sexo biológico como critério de participação, e na saúde (35), proibindo hormonioterapia. O uso de banheiros por identidade de gênero é tema de 32 propostas contrárias.
Apesar do avanço, há resistência institucional. Apenas três PLs foram vetados nesse período: um em Minas Gerais, que punia empresas por atos de LGBTfobia, vetado por Romeu Zema (Novo); e dois no Maranhão, contrários à linguagem neutra e banheiros multigênero barrados por Carlos Brandão (PSB). No grupo pró-direitos, 121 projetos foram arquivados e 265 seguem em tramitação; no grupo contrário, 74 foram arquivados e 162 ainda tramitam.
São Paulo e Rio de Janeiro concentram 42% de todas as propostas apresentadas. A Alesp lidera com 153 projetos (77% favoráveis), seguida pela Alerj com 126 (70% favoráveis). Na outra ponta, Tocantins e Rondônia registraram apenas um projeto cada sobre o tema.
“É notável a concentração do debate no eixo Rio-São Paulo, que tem forte influência nacional. O levantamento também mostra que, apesar do volume expressivo de PLs restritivos, houve avanços significativos na ampliação de direitos LGBTQIA+ no período”, afirma Marcelo Tokarski, CEO da Nexus.