Pivô das investigações da trama golpista para impedir a posse de Lula, o tenente-coronel Mauro Cid completa no fim de maio dois anos cumprindo pena privativa de liberdade, conforme prevê o acordo de colaboração premiada fechado com a Polícia Federal. E já tem um plano para o que fará depois.
O ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro vai pedir ao ministro Alexandre de Moraes que o libere de usar tornozeleira, ter que ficar em casa à noite, se apresentar semanalmente à Justiça e pedir autorização para sair de Brasília – as medidas cautelares que ele atualmente cumpre em decorrência do acordo.
Depois disso, vai tentar voltar ao Exército, seguindo como militar da ativa e até conseguir ser promovido a coronel.
A delação premiada de Cid é peça central da denúncia que levou o ex-presidente da República, o general Walter Braga Netto, o próprio Cid e outras cinco pessoas ao banco dos réus por golpe de Estado, no mês passado.
Em março do ano passado, O GLOBO informou que o comandante do Exército, Tomás Paiva, decidiu vetar a promoção do tenente-coronel à patente de coronel. Ele integra a turma da Academia Militar das Agulhas Negras de 2000, que na época era a próxima a entrar no rol de promoções a coronel
A pena de dois anos foi uma condição negociada por Cid com a ajuda de integrantes da cúpula do Exército porque, segundo o estatuto militar, oficiais condenados por penas superior a dois anos podem ser declarados indignos, perder todas as patentes e o soldo e serem expulsos das Forças Armadas
Como previsto no estatuto e na lei de promoção dos oficiais, assim que foi colocado no banco dos réus, no mês passado, Cid passou a ter o status “sub judice” em sua ficha funcional – e ficou impedido de ser promovido, transferido, obter licenças ou até de fazer cursos
Na semana passada, mesmo ainda cumprindo as medidas cautelares determinadas por Moraes, Cid teve autorização do ministro para ir à cerimônia de premiação da filha adolescente, que é atleta de hipismo, no Jockey Club de São Paulo.
A expectativa no Supremo é a de que a Primeira Turma do STF julgue até outubro se absolve ou condena os réus do “núcleo crucial” da trama golpista, formado por Bolsonaro, Braga Netto e o exministro Anderson Torres, entre outros.
Cid quer virar a página da trama golpista, mas terá que aguardar, além da conclusão do julgamento do STF, um parecer do Exército sobre se pode voltar à Força. A expectativa no entorno do exajudante de ordens é de que ele consiga voltar e seja promovido. “Ele não vai mais ter impedimento nenhum”, diz um interlocutor
Cláusulas
As cláusulas do acordo de Cid foram tornadas públicas em fevereiro deste ano, por decisão de Moraes, que tirou o sigilo da delação.
O acordo prevê a restituição de bens e valores pertencentes ao colaborador apreendidos; extensão dos benefícios para pai, esposa e filha maior do colaborador, “no que for compatível”; e ação da Polícia Federal “visando garantir a segurança do colaborador e seus familiares, bem como medidas visando garantir o sigilo dos atos de colaboração”
Em contrapartida, Cid se comprometeu a "esclarecer espontaneamente todos os crimes que praticou, participou ou tenha conhecimento", "falar a verdade incondicionalmente" e entregar todos os documentos, papéis, escritos, fotografias, vídeos, banco de dados, arquivos eletrônicos, senhas de acesso, "de que disponha, quer estejam em seu poder, quer sob a guarda de terceiros", e que podem ajudar no esclarecimento dos fatos investigados